Sustentabilidade

Publicado: Sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Estudo enfoca os peixes da Serra do Japi

A reserva sofre constantes agressões com desmatamento.

A única floresta tropical do mundo sobre um solo de quartzito, a Serra do Japi está situada entre os municípios de Jundiaí, Cabreúva, Pirapora do Bom Jesus e Cajamar, em um dos eixos econômicos de maior destaque do país (Campinas - São Paulo), sendo um obstáculo natural à conurbação (*).

A Serra do Japi pertence à Reserva de Biosfera da Mata Atlântica, integrando o cinturão verde do estado de São Paulo, podendo ser considerada um hotspot, ou "ponto quente" (**), cuja biodiversidade está ameaçada de diminuição. A Reserva da Biosfera é uma figura instituída pela UNESCO para abrigar, no globo, uma rede de áreas de relevante valor ambiental para a humanidade.

Representa um forte compromisso do Governo local perante seus cidadãos e a comunidade internacional, que concentrará os esforços e atos de gestão necessários à preservação dessas áreas, estimulando o Desenvolvimento Sustentável dentro do espírito da solidariedade universal.

A Serra do Japi, uma das últimas grandes áreas de floresta contínua do estado, é o testemunho de uma flora e fauna ricas e exuberantes que existiam em grande parte da região Sudeste do Brasil, antes da colonização européia (Morellato, 1992). Foi tombada pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo), em 1983, e incluída como zona de proteção máxima das APAs (Áreas de Proteção Ambiental) Estaduais de Jundiaí e Cabreúva, em 1984.

Apesar de tal importância, a Serra do Japi sofre constantes agressões com desmatamentos, caça, usos e ocupação desordenados do solo. Isto ocorre, basicamente, porque mais de 90% das terras dessa Serra encontram-se nas mãos de particulares desinteressados em promover algum tipo de uso auto-sustentado.

A fauna da Serra do Japi é ainda pouco conhecida e muito diversificada. Por ser região de transição entre a Serra do Mar e o Planalto Paulista, a Serra acolhe representantes desses dois grandes ecossistemas. Unindo-se ao leste com a Serra dos Cristais e ao sul com o rio Tietê, a vegetação nativa do Japi forma ainda um importante corredor para a fauna migratória.

Até o momento, vários grupos animais já foram estudados na Serra do Japi, registrando-se 29 espécies de anfîbios, 19 de répteis, 31 de mamíferos, pouco mais de 216 espécies de aves e 652 de borboletas, o que caracteriza a região como uma importante reserva da biodiversidade. Apesar da existência de inúmeros cursos d’água que compreendem nascentes, trechos encachoeirados, rápidos e regiões de baixa correnteza, os peixes existentes na Serra do Japi consistiam em um dos poucos grupos animais ainda não estudados.

Foi a partir dessa lacuna, bem como da existência de diversas influências antrópicas que ocorrem na região, que surgiu a idéia de conhecer melhor a ictiofauna de riachos de diversas microbacias da Serra do Japi. A pós-graduanda Ana Paula Pozzo Rios Rolla, que apresentou a sua dissertação de Mestrado “A ictiofauna da Serra do Japi: bases para conservação”, através do Programa de Pós-graduação em Aqüicultura e Pesca do Instituto de Pesca (***), realizou um amplo levantamento da ictiofauna da região, incluindo as microbacias do ribeirão Caguaçu, ribeirão Piraí, rio Guapeva e ribeirão Caxambu. Ana Paula foi orientada pela pesquisadora Katharina Eichbaum Esteves.

Importância do manejo e conservação

O objetivo do trabalho foi estudar a ecologia das espécies de peixes desses riachos, incluindo sua distribuição, alimentação e relações com o ambiente, buscando medidas de manejo e conservação dessas espécies. O estudo procurou amostrar a ictiofauna de riachos com diferentes condições ambientais, como presença ou ausência de vegetação ripária, diferentes tipos de substratos, locais mais preservados e locais sob influências antrópicas. Como resultado, o trabalho detectou 30 espécies de peixes, sendo que uma delas, Pareiorhina sp, é uma espécie nova que ainda se encontra em processo de descrição.

Embora a maioria das espécies capturadas seja nativa de rios e riachos de Mata Atlântica, três das espécies identificadas são exóticas: Tilapia rendalli (tilápia), Oreochromis niloticus (tilápia) e Poecilia reticulata (lebiste).

A ocorrência de tilápias em alguns riachos da Serra do Japi deve-se principalmente ao escape dos peixes de pesqueiros e pequenos represamentos localizados próximos dos riachos. O alerta aqui é importante, pois a introdução de espécies exóticas no sistema pode causar graves problemas à fauna aquática local, como a predação, a ocupação de nichos ecológicos e a transmissão de doenças e de parasitas para espécies nativas.

O estudo também detectou que, em alguns trechos localizados em áreas antropizadas, com grande concentração de chácaras, houve aumento de alguns nutrientes, como fósforo e nitrogênio, o que provavelmente se relaciona ao lançamento de efluentes domésticos e à erosão causada pela remoção da vegetação ripária. Tal condição favoreceu a dominância de espécies tolerantes, como Geophagus brasiliensis (cará), Gymnotus carapo (tuvira), Astyanax altiparanae (lambari-do-rabo-amarelo) e Phalloceros spp (guaru) e a exclusão de espécies pouco tolerantes e indicativas de boa qualidade do hábitat, como lambaris, cascudos e bagres.

Concluiu-se que, embora alguns locais estudados estejam em estágio inicial de degradação, outros ainda se mantêm preservados, com boas proporções de mata ciliar e boa qualidade de água. A presença da vegetação ripária tem grande importância para a manutenção das comunidades de peixes em riachos, pois fornecem alimento, abrigo e proteção para as espécies que ali vivem.

Os resultados obtidos no trabalho reforçam a necessidade de se promover a conservação da vegetação ripária e o controle do lançamento de esgotos, a fim de se manter a integridade dos hábitats e da ictiofauna de riachos da Serra do Japi.


(*) Conurbação: conjunto formado por uma cidade e seus subúrbios, ou por cidades reunidas, que constituem uma seqüência, sem, contudo, se confundirem.
(**) hotspot, ou "ponto quente" - Um hotspot de biodiversidade é uma região biogeográfica que é simultaneamente uma reserva de biodiv
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