Colunistas

Publicado: Quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Turbulências infantis a bordo

Tem viajante de negócios que morre de medo de voar não pelos céus zangados que eventualmente sacolejam a aeronave ou o estresse na hora do pouso, mas sim pelo risco de enfrentar criança embarcada que grita, chora e chuta a poltrona. Principalmente, se não for o próprio filho.

Com a popularização da aviação que gerou aeroportos sobrecarregados, não é nada agradável enfrentar filas no check-in e demandas crescentes de segurança e a seguir encontrar um avião lotado com poltronas espremidas. Mas falta de sorte mesmo é encarar uma longa viagem a trabalho tendo ao lado um bebê que berra a noite inteira. Nessas condições, uma vez que não é possível parar o avião e descer, o melhor é esquecer a leitura pendente ou o computador e tentar dormir com tampões nos ouvidos, caso fornecidos pela companhia aérea.

A reação a esse quadro adverso pode demorar, principalmente no Brasil, mas um dia chega. Enquanto isso, passageiros do mundo inteiro, cansados de tanto berreiro de bebê e manha infantil, começam a se unir e botar a boca no trombone.

De simples desabafo, o assunto está se tornando um problemão para as companhias aéreas. Exemplos não faltam. Recentemente, a Qantas enfrentou um processo de uma passageira que alegou perda de audição após sentar ao lado de um garoto de três anos chorão durante um longo voo em 2009 entre Nova York e Austrália. Outras duas situações ocorreram nos Estados Unidos. Em janeiro, a AirTran teve que retirar um casal e dois filhos do avião antes de decolar para a Flórida porque um deles não só batia nos pais, como fazia barulho e recusava-se a sentar. Dois meses depois, em um voo da Southwest para Las Vegas, uma senhora de 42 anos perdeu a cabeça com um menino que não parava de chutar a sua poltrona e o agarrou.

Não são fatos isolados. Uma recente pesquisa feita pela Skyscanner.com revelou que 59% dos passageiros apoiam a criação de uma seção separada nos aviões para as famílias que viajam com bebês e crianças pequenas. E mais: 20% são a favor de que se estabeleçam voos livres de crianças. Parece que a bola da vez são aviões "baby-free".

Cada dia mais passageiros indignados e impacientes reclamam em blogs, na imprensa e com as companhias aéreas em busca de providências. "Eu pagaria feliz da vida uma taxa adicional para entrar em um avião sem crianças," diz Ian Burford, um viajante frequente que iniciou um grupo no Facebook com esse objetivo depois que sofreu com uma gritaria mirim incessante em um voo entre Los Angeles e Inglaterra. Ele diz que até aceita uma solução intermediária. Que na hora da reserva, o passageiro tenha a opção de não sentar ao lado de uma criança pequena.

Já surgem os primeiros projetos de lei para obrigar companhias aéreas norte-americanas a estabelecerem seções separadas para crianças e adultos, sob o pretexto meio gaiato que assim será possível assistir a bordo filmes impróprios para menores.

Quem não está gostando nada deste movimento separatista dos adultos voadores são as empresas. Elas sequer conseguem imaginar o pesadelo logístico que esse tipo de operação poderia acarretar. O temor se justifica também por outras razões. Quem garante que separar crianças não abra precedente para novas frentes como seções no avião só para gordos ou para velhos, por exemplo?

*Esse texto foi publicado também no site www.dcomercio.com.br, na coluna "Viagens de negócio", do mesmo autor, no dia 9 de dezembro, caderno de economia.

Comentários