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Publicado: Quinta-feira, 21 de maio de 2009

Sonho estranho com gente esquisita

Outro dia, bem mais cedo do que de costume, fui fotografar um cliente lá no Itaim. Por motivos maiores [leia-se “hoje é dia de rodízio”], tive de ir de ônibus. Eu ia pensando na morte da bezerra e de todos os animais possíveis e ainda imagináveis e talvez por isso acabei apertando o botão “stop” um ponto antes do correto. O busão, que já estava parado [porque em São Paulo o trânsito é intransitivo], abriu as portas e só daí que eu percebi minha cagada máster. Não era ali que eu tinha de descer.

Em pouquíssimo tempo, me passou uma série de questionamentos pela cabeça. Pois, teoricamente, eu tinha que descer ali, mas não podia, ia ter que andar não-sei-quantos quarteirões a mais. Não conheço a região. Sou recente em São Paulo e nos dilemas da existência. Por outro lado, eu não precisaria descer porque, embora tivesse solicitado a abertura das portas sagradas do ônibus, outras pessoas certamente se beneficiariam com aquilo. Na capital, em todo ponto de ônibus desce e sobe muita gente, é sempre assim. Menos naquele ponto. Era meu dia de azar.

Os passageiros ficaram olhando em busca de quem ia ser desovado. Eu, que não ia descer, também olhei para os lados com aquela cara de ué-quem-vai-descer-aqui?, e quase soltei um “esses jovens, hein?, sempre apertando botões, campanhias e bundas alheias!”. O ônibus continuou e, esta noite, sonhei com o desdobramento da situação.

A mulher – uma senhora – me pega pelo braço e pergunta:
“Hei, você não vai descer, menino?”
“Não, obrigado.”
“Então por que cargas d’água você apertou o botão?”
“Apertei?! Jura? Nossa, foi sem querer, então.”
“Foi nada, você estava com uma cara de intencionalidade muito óbvia.”
“Mentira!”
“Estava, sim. Eu vi a sua cara.”
“E a senhora tem essa cara de merda e nem por isso é um grande cocozão falante!”
“Agora você vai descer. Anda. Desce! Gente, foi este rapaz gordinho aqui quem apertou o botão!”
“Pare, nem ouçam. Essa senhora tá muito doida. Velha maluca!”
“Apertador de botão desnecessariamente!”
“Louca, desvairada, pessoa de baixa índole!”
A briga fictícia segue até que o próximo ponto. Eu desço e pego a Via Funchal em uma direção e ela, na direção outra. E continuamos a nos ofender, mesmo estando metros e metros longes um do outro.
“Moleque sem noção! Rapaz gordinho de barba grande! Parece até um urso, daí.”
“Velha safada, bisbilhoteira, caloteira e mentirosa. Sua cara parece uma uva passa cheia de... de... me deixa pensar...”
Daí um ônibus, destes que tentam compensar o atraso dos passageiros, atropela a coitada da velha maluca enquanto eu pensava. Chego perto. Mais perto. E me agacho. Depois, pra terminar o sonho doido, sussurro pro cadáver dela:
“Velha maluca!”
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