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Publicado: Segunda-feira, 14 de março de 2005

Sempre em defesa da vida

Dias atrás participei de mesa-redonda promovida pelo jornal “Folha de S. Paulo” em seu auditório. Convidado pelo editor de “Tendências/Debates”, da página A-3, que já me havia aberto espaço para vários artigos, lembrei-lhe nomes de bispos e sacerdotes do clero paulistano qualificados para substituir-me. Dada a sua insistência quanto à minha presença, preparei-me com seriedade pois os debates seriam sobre a vida, o aborto e as pesquisas com células-tronco embrionárias, permitidas bem recentemente pelo Senado e Câmara Federal, ainda à espera da aprovação e promulgação pelo Presidente da República.

Honrado, compareci e tive ativa participação, ocupando mais esse espaço aberto aos valores em que sempre acreditei e venho proclamando em meus livros e artigos semanais, nestes meus 53 anos de sacerdócio e 28 de episcopado. Os debates foram serenamente conduzidos pelo conhecido jornalista Gilberto Dimenstein. À mesa estavam o atual Ministro da Saúde, Humberto Costa, que tinha ao seu lado a geneticista Lygia da Veiga Pereira, do Centro de Estudos do Genoma Humano do Instituto de Biociências da USP. Ao meu lado estavam a advogada e professora universitária Flávia Piovesan, do Comitê Latino-Americano e do Caribe para os Direitos da Mulher e o procurador do Estado Dr. Paulo Leão, presidente da União dos Juristas Católicos de São Paulo.

Em clima de respeito e franqueza todos puderam discorrer sobre as próprias convicções, trabalhos e projetos. O Ministro da Saúde abriu os debates insistindo em seu dever de responder aos graves problemas da saúde da mulher, procurando justificar as polêmicas medidas que facilitam os casos de aborto previstos na legislação brasileira, de gestação resultante de estupro e alto risco de vida para a mulher. Afirmou ser favorável à descriminalização e ampliação de casos de aborto que, no Brasil, são acima de tudo um “problema de saúde pública”. É favorável, também, às pesquisas em embriões congelados visando à obtenção de células-tronco, esperança para tantos enfermos, portadores de doenças hoje irreversíveis.

Na colocação inicial que fiz manifestei as minhas preocupações, como cidadão e por razões não só religiosas, com a política anti-natalista e contraceptiva do governo Fernando Henrique Cardoso, do PSDB e, agora, também, do governo Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, através dos seus Ministros da Saúde José Serra e Humberto Costa. Referi-me às três Normas Técnicas desse Ministério, dispensando já no ano 2000 do necessário Boletim de Ocorrência em caso de abortamento decorrente de violência sexual contra a mulher, vetando qualquer comunicação da realização do aborto às competentes autoridades do judiciário e outras. Lamentei que essas Normas tenham estendido o aborto até o sétimo mês de gestação quando o feto é perfeitamente viável.

Avançando em minhas reflexões reafirmei, com ênfase, que o direito à vida é o primeiro e o principal dos direitos humanos, tutelado por nossa Lei Maior, a Constituição Federal, no novo Código Civil e outros importantes documentos internacionais de que o Brasil é signatário. Deixei claro que continuaria defendendo a vida tanto em sua fase inicial quanto terminal, não só por razões de fé mas, também, como cidadão, por razões filosóficas e científicas. Os nascituros ainda no ventre de suas mães são seres humanos inocentes e totalmente indefesos, sendo o aborto provocado e intencional uma agressão criminosa. Enfatizei: “A Igreja prosseguirá defendendo o direito à vida como o primeiro dos direitos humanos, rejeitando todas as expressões da ‘cultura da morte’ predominante em nosso tempo de violência e erotismo, relativismo e permissivismo, em que o corpo e o prazer são cultuados por si mesmos, sem levar em conta outros valores”.

Encerrei o meu primeiro depoimento cumprimentando toda mulher, especialmente as mães pela comemoração do seu “Dia”, em 08 de março. Como bispo, Pastor da Igreja, acenei ao “Não Matar!”, do Decálogo. Disse não compreender como sendo no Brasil e no mundo, a absoluta maioria dos juristas contrários à pena de morte dos maiores criminosos, se continue aplicando uma verdadeira pena de morte contra os nascituros, com requintes de crueldade como a craniotomia (esmagamento do cérebro do feto).

O numeroso, qualificado e atento auditório, lotado de jovens universitários, de médicos e professores, advogados e comunicadores sociais, reagiu geralmente com aplausos ao meu depoimento e ao do Dr. Paulo Leão. Os que desejaram puderam levantar novos problemas e até contestar ou aprovar depoimentos dos integrantes da mesa. Foram debates serenos e esclarecedores em favor e, infelizmente, contra a vida, sempre sagrada e intocável da sua concepção à fase terminal. Permito-me lembrar que tanto o Dr. Paulo Leão quanto eu argumentamos insistindo na inviolabilidade da vida humana, da qual somente Deus é o Senhor e que a lei deve tutelar. As reflexões feitas pelo promotor público, católico e com ótima comunicação, completaram os meus posicionamentos, insistindo nos instrumentos legais que ainda entre nós tutelam a vida. Ele lamentou a recente aprovação pelo Senado e Câmara Federal, da Lei da Biossegurança, que permite experiências em embriões humanos congelados em laboratórios, para a possível problemática obtenção de células-tronco, em que muitos parecem depositar demasiadas esperanças.Lembrei, durante o debate, a possibilidade de uma condenável comercialização com embriões, como vem acontecendo na Inglaterra com fetos humanos abortados, conforme narram os jornalistas Michael Litchfield e Susan Kentish em seu impressionante livro “Bebês Para Queimar”. Milhares de fetos humanos continuam disputados entre indústrias londrinas que os transformam em cosméticos! Ousei sugerir e pedir ao Ministro da Saúde que o seu Ministério destinasse pelo menos 50% dos altos investimentos em preservativos à sadia e reta educação dos jovens para a continência sexual antes do casamento. Finalmente, atendendo à pergunta de um dos espectadores dos debates, lembrei que o cânon 1398 prevê para os que provocam o aborto, colaborando com o mesmo, a censura canônica da “excomunhão”, afastando-os tanto da comunhão eucarística quanto da comunidade de fé e seus benefícios. Sou grato ao jornalista Fábio Chiossi, da “Folha de S. Paulo”, por suas atenções, pela confiança em mim depositada e pela mais que oportuna mesa-redonda dedicada a debates sobre a vida.

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