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Publicado: Segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Sai Marta, entra Serra

Sou leitor compulsivo de jornais. Jornalista, desconheço melhor meio para estar bem informado tanto sobre política nacional quanto internacional, os graves problemas que pesam sobre milhões de homens e mulheres, afastando para um futuro a cada dia mais distante, o mundo “menos selvagem e mais humano” (Papa Pio XII), mundo de irmãos e irmãs, de povos em que todos tenham pelo menos o necessário correspondente à própria dignidade de filhos de Deus.

Bem mais que as TV´s e seus informativos, os jornais têm mais espaço para detalhar os fatos, oferecendo informações mais completas, apontando alternativas para a solução dos problemas que continuam nos afligindo. Os apresentadores dos noticiários televisivos não dispõem de tempo para análises mais abrangentes. Em matéria de imprensa, nada como um jornalismo objetivo, fiel aos fatos, mas crítico e sensato.

Há anos venho lendo, diariamente, o “Estadão” e a “Folha de S. Paulo”. Poucas secções ficam de lado. A maioria delas é leitura obrigatória. Confesso que entre as que raramente leio está a do José Simão. Fico apenas na manchete e sigo adiante sabendo, embora, que “rindo se castiga os costumes”. O Simão brinca com valores que são sagrados para mim e isso me desagrada. Mas que deve divertir os seus leitores, deve.

Dia 2 de novembro, ri à solta com o título de um dos seus artigos: “Sai a perereca, entra o careca”. Marta, como é fácil perceber é a perereca e José Serra o careca. Ela acaba de ser destronada da Prefeitura de São Paulo, a maior das metrópoles da América do Sul, terceira do mundo. Serra obteve uma expressiva votação no segundo turno, em 31 de outubro, da maioria do eleitorado, em campanha disputada dia a dia, palmo a palmo, em que o PT investiu uma fortuna.

Poucos anos atrás, pude ter um encontro pessoal com a Marta, acolhendo-a na Residência Episcopal. Conversamos por três horas, sobre a sua pessoa, a sua atuação como deputada federal, então candidata ao governo do Estado, competindo com o incrível Maluf. Seria cego que negasse a inteligência e a beleza física da Marta. Mas hoje, após a última eleição, estou me perguntando por que ela foi derrotada pelo Serra e por que a maioria dos paulistanos preferiu que em 1o de janeiro próximo mandá-la de volta para casa ou, se desejar, para Paris.

Pelo que tenho lido, as razões da derrota da Marta foram muitas, mesmo reconhecendo que, em quatro anos, ela provou ser uma lutadora, melhorando o transporte coletivo e superando discriminações. Os Centros de Educação Unificada, mais conhecidos como CEU´s (sic!), além de serem algo original, parece que sem concorrência no Primeiro Mundo, fora do contexto brasileiro, transformou-se no carro-chefe de sua campanha. Cerca de 20 mil crianças e adolescentes, favelados ou da periferia pobre de São Paulo, acabaram tendo teatro, cinema, piscina e, suponho, um melhor ensino. Educação religiosa e moral não, porque o projeto pedagógico dos CEU´s continua o mesmo, convivendo com as “escolas de lata”, um dos pecados de omissão da Marta.

A maioria dos eleitores não perdoou à Prefeita o abusivo aumento do IPTU, as novas taxas do lixo, da iluminação, além de outros deslizes e omissões. Mas quase todos os artigos que li, comentando o resultado das eleições, entre eles os de José Nêumane no “Estadão”, escritores como Carlos Heitor Cony e cientistas políticos como Renato Lessa, na “Folha de S. Paulo”, acabam relacionando a derrota da Marta ao “affair” de sua traição ao Senador Eduardo Suplicy, seu marido, pai de seus filhos e seu eleitor maior há quatro anos.

O “casamento” da Marta com o ex-trotskista franco-argentino Luiz Favre, foi um passo desastrado. Marta fez questão de realizar um casamento de arromba, miliardário. Vestiu-se como uma princesa, deu-se ares de atriz, escandalizando a milhões de brasileiros. Afinal, mulher pública, Marta tinha o dever de ser bem mais discreta na separação de seu ex-marido, perante a família e brasileiros em geral. Foi infantil, dando-se ares de “Madonna”. Certamente agrediu valores sagrados para a absoluta maioria dos brasileiros, católicos ou não. O casamento e a família, a fidelidade, a compostura e o comedimento, continuam sendo grandes valores, mesmo que haja contradições entre fé, vida e comportamento de muitos na atual sociedade brasileira.

Acresce que havia graves antecedentes na conduta de Marta, tanto como sexóloga quanto como deputada federal, quando ousou apresentar o projeto de “casamento” de homossexuais. Como Prefeita, nos últimos anos, o infantilismo de seu comportamento nas Paradas Gays, as esterilizações e abortos nos hospitais públicos de São Paulo e a sua deselegância no relacionamento com o ex-marido, cujo sobrenome teima em conservar, talvez sonhando com futuras eleições...

Escreveu Renato Lessa: “Como cientista político, está aí o fato do namorado Luiz Favre. A Marta não pôde separar-se do novo marido argentino-francês, sempre apresentado como um semi-clandestino. Sou obrigado a tratar disso como cientista social, como uma imagem socialmente construída por Marta. Não é loucura supor que tal comportamento possa ter tido algum efeito em parcela do eleitorado” (Folha de S. Paulo, 01/11/2004, página A-10).

O conhecido acadêmico Carlos Heitor Cony escreveu em sua coluna diária, na “Folha de S. Paulo”: “Preferiu ser ela mesma, assumindo conscientemente sua vida pessoal, quando poderia, dentro da hipocrisia social e política a que estamos habituados, bancar a vestal que nunca foi nem pretende ser” (página A-2, 03/11/2004).

José Nêumane, jornalista e escritor, acaba de enumerar entre os “sete erros de Marta”, como primeiro deles, exatamente o “caso” Luiz Favre: “A Prefeita pode mesmo ter dado prova de independência e bravura ao se separar do marido e se casar com o argentino Luiz Favre. Mas politicamente essa decisão se provaria desastrada. Não por moralismo e machismo. Solidário com o ex-marido sentiu-se o cidadão, ele mesmo abandonado por quem deu prioridade ao pessoal sobre o coletivo. A cobrança pode não ser justa com a pessoa, que tem direito de decidir com que parceiro viver, mas é natural que seja feita a quem se propõe a fazer carreira política” (O Estado de São Paulo, 03/11/2004, página A-2).

Mais uma vez, comprovou-se a sabedoria do nosso povo. “Quem semeia ventos, colhe tempestades!”. E, reconheçamos, foi muito feliz o José Simão: “Sai a perereca e entra o careca”. Com todo respeito ao José Serra, novo Prefeito de São Paulo. Perdeu a Marta. Ganharam o Serra, o Governador Geraldo Alckmin, ganhamos todos nós!

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