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Publicado: Sábado, 20 de outubro de 2012

Respondendo à sua pergunta

Respondendo à sua pergunta

 

- Com todas essas denúncias comprovadas, o senhor ainda tem esperança de escapar livre?

- Pois é, a palavra é essa: livre. Se eu não tivesse lutado o que lutei contra a ditadura, não haveria imprensa livre. Nem você estaria me perguntando isso agora, seu moço. Me diz uma coisa, quantos anos você tem?

- Trinta e quatro.

- Então, olha só, você nem tinha nascido e eu já enfrentava a polícia e quem mais aparecesse pela frente pra que no futuro você pudesse crescer numa democracia, exercendo seus direitos de cidadão. Viu, seu ingrato?...

- O senhor não respondeu o que eu lhe perguntei.

- Não estou fugindo da pergunta, não. Você é que é muito insolente em levantar o que quer que seja contra a minha trajetória honrada. O que eu quero dizer é que o povo brasileiro tem essa dívida comigo. Eu mereço ficar livre porque nos anos de chumbo eu arrisquei minha própria vida pela liberdade. Meus torturadores foram anistiados, então é justo que se passe uma borracha sobre possíveis erros meus. Mas esse não é o caso, porque eu nada fiz de errado.

- Como o senhor explica as movimentações de dinheiro, o banco envolvido no esquema, as provas contundentes de corrupção ativa, os depoimentos todos...

- Eu caí numa trama sórdida, criada por gente inescrupulosa que não se conforma em não ter entrado para a história deste país como eu bravamente entrei. Gente com o apoio dos poderosos de sempre, que colocam seu arsenal midiático a serviço da calúnia e da infâmia.

- E as malas de dinheiro? E as contas no exterior? E os aumentos patrimoniais sem justificativa?


- Isso é tudo baboseira, intriga, joguinho rasteiro que não vai manchar meu nome de jeito nenhum, seu aprendiz de assistente de foca! Por que você não me pergunta sobre a melhor distribuição de renda, o aumento do poder aquisitivo da classe D, os investimentos nas casas populares e nas creches? Heim, heim? Por que não pergunta o que interessa de verdade pro povão?

- Consta que o senhor é um dos 1800 homens mais ricos do mundo. De duas uma: ou pegar em armas para combater os militares lhe rendeu muito dinheiro no passado ou o senhor recebeu uma fabulosa herança de família.

- A minha família é a nação brasileira. A ela devo tudo e por ela pautei todos esses anos a serviço da coisa pública.

- Mas...

- E chega de mas, mas, mas, meu amigo. Não tem nada nem ninguém que vai me meter medo não, seu frangote. Nem tanque de guerra conseguiu passar por cima de mim, fique sabendo.
 

- Nossa equipe de reportagem investigou e descobriu uma conta na Suíça cuja titularidade é o seu nome escrito ao contrário. O senhor confirma mais essa evidência de bandidagem?

 

- Ah, olha só, é você mesmo quem está me inocentando! Essa é a maior prova de que o meu nome é contrário a tudo isso. Você, que me acusa, agora está me dando um atestado de idoneidade. O povo brasileiro não é bobo, está vendo o quanto sou inocente e o quanto fui injustiçado!

 

- O cinismo do senhor é repulsivo... temos imagens de câmeras de segurança do congresso flagrando o senhor colocando maços e mais maços de dinheiro em bolsos de 25 deputados, numa única sessão, cinco dias antes de estourar o escândalo.

 

- Como vocês são maldosos...  eu posso e faço questão de explicar o ocorrido. É que o sobrinho de um amigo, que trabalha no setor que gera a folha de pagamentos da Câmara, estava de licença médica e pediu pra que eu lhe fizesse a gentileza de pagar o salário dos deputados em dinheiro, entende? Pronto, foi só isso. A gente quer ajudar e acaba se estrepando...

 

 

Esta é uma obra de ficção.

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