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Publicado: Quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Relacionamento: Realidade? Ilusão Pós Modernidade?

Crédito: APCRC Relacionamento: Realidade? Ilusão Pós Modernidade?

É possível uma vida a dois? Morar juntos? Coabitar? Estabelecer certos parâmetros para uma convivência conjugal? Perguntas complicadas em tempos de transição acelerada. Vivemos numa sociedade machista tradicional conservadora, com homens e mulheres machistas, criados por pais machistas, difundindo práticas machistas, porém com um discurso de liberação. Veja bem, existe uma grande diferença entre discurso e realidade de ações frente a vida. Provavelmente você já cruzou com alguns indivíduos dizendo-se “femininos ou defensores dos direitos das mulheres”, mas com extrema dificuldade em aceitar ou dividir os processos decisórios dentro de um relacionamento. Pessoas que batem no peito para dizer o quanto se preocupam com as mulheres e o quanto as acham mais sábias e competentes, todavia, querem comandar a cadência de suas relações e determinar o tempo, a dinâmica e a relevância que as mesmas devem ter para o evoluir do relacionamento. 

 

Vamos lá para algumas explicações básicas: a ideia aqui é estabelecer diálogos construtivos acerca da vida em sociedade; o que estou chamando de machismo é “todo e qualquer pensamento que entende que na relação entre os gêneros há um sistema hierárquico no qual os homens são superiores as mulheres”. 

 

Diante da nova realidade que se apresenta, somado a uma grande viralização do universo virtual, nota-se que o velho agrega o novo, mas não exclui totalmente suas características, o que nos coloca numa situação extremamente hostil, transitória e incerta, onde temos homens e mulheres com posturas de liberação e discursos arrojados, colidindo com velhas tendências conservadoras e hierárquicas. Um total paradoxo coletivo. O resultado disso tudo é um alto índice de insucessos tanto em aspectos relacionais quanto em aspectos familiares e de realização profissional, transbordando os consultórios de psicologia. 

 

Enquanto a sociedade estiver mais preocupada em estimular o crescimento do individualismo, segundo o mote “cada um por si”, distanciando-se da reflexão sobre o universo coletivo, das responsabilidades de cada um, da necessidade do existir juntos, do respeito as diferenças particulares, maiores serão os índices de violência entre os gêneros, bem como outros tipos de violência, e maior será ainda o abismo entre a civilidade e a animalidade pura e simples. O Homem é um ser vivo que adestrou sua animalidade com a construção da cultura e das civilizações e depende uns dos outros tanto para ter sua existência reconhecida quanto para erguer as bases materiais e emocionais e científicas de tudo que somos hoje. 

 

Vamos discutir mais a relevância de cada um nesse universo de sentidos que construímos juntos e menos as relações de poder e hierarquia que tem destruído toda e qualquer iniciativa de humanização. Enfim, a ilusão da pós modernidade se dá quando partilhamos da mesma paranoia coletiva, na qual construímos realidades virtuais paralelas para representar os discursos de perfeição de um existir plenamente realizado e feliz. A realidade nossa de cada dia perpassa pela infelicidade, tristezas e frustrações o tempo todo e muito mais do que gostaríamos de reconhecer. A felicidade absoluta não é um lugar que se alcança para eternidade e sim são momentos conquistados no dia a dia de uma vida repleta de acontecimentos fatídicos, é um estado de espírito, não duradouro, e que nos promove marcantes instantes de prazer. 

 

Desse modo, relacionamentos são reais e possíveis desde que se tenha consciência que não é um lugar de perfeição e nem de projeções de frustrações (pelo menos não o tempo todo). É um lugar de busca de compartilhamentos e trocas positivas de vida, de sentimentos e sentidos, e também de muitos momentos de dor e de desilusão, nos quais aprendizados acontecem. Se não estiver fluindo desse modo, talvez seja a hora de avaliar e reavaliar se é apropriado continuar investindo em algo que te traz muito mais experiências negativas do que positivas, onde a troca, o compartilhamento, a parceria, deveriam ser as premissas. 

 

Enfim, deixo a inspiradora ideia de Baruch Spinoza sobre o amor e sobre os encontros alegres, trabalhadas por Gilles Deleuze em seu livro "Spinoza e o problema da expressão" (p.214, disponível em: <http://conexoesclinicas.com.br/wp-content/uploads/2015/12/DELEUZE-G.-Espinosa-e-o-Problema-da-Express%C3%A3o1.pdf>), como forma de colocarmos em debate o que desejamos para nós quando o assunto são as relações humanas. 

 

"(...) na existência, devemos conquistar aquilo que pertence à nossa essência. Justamente, só podemos formar noções comuns, mesmo as mais gerais, se encontrarmos um ponto de partida nas paixões alegres que aumentam primeiramente nossa potência de agir." 

 

Até o próximo convite à reflexão! 

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