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Publicado: Sexta-feira, 19 de maio de 2006

Reféns

No último final de semana e início deste período em curso, fomos surpreendidos por fatos absolutamente inusitados para nós, cidadãos brasileiros, ou melhor, mais especificamente cidadãos do estado de São Paulo. Por algumas dezenas de horas, ficamos reféns do crime organizado. De uma hora para outra, fomos tomados por uma avassaladora onda de atentados, ameaças, medos, insegurança e impotência. O crime organizado, mais especificamente um grupo que se denomina Primeiro Comando da Capital, confrontou as autoridades constituídas, assassinou policiais civis e militares, atacou postos policiais, residências, veículos do estado, espaços comunitários, agências bancárias, queimou ônibus, ameaçou impor toque de recolher, ou seja, fez com que toda a população ficasse prisioneira em sua comunidade, em suas próprias residências.
Na segunda-feira, final da tarde e início da noite, ocorreu o ápice do clima de tensão. Informações que vinham de todos os cantos davam conta de que o PCC havia determinado o toque de recolher para aquela noite, ou seja, as pessoas não deveriam sair às ruas, qualquer que fosse o pretexto, sob pena de serem alvejadas, etc. O telefone da nossa escola, como deve ter acontecido em todos os locais, não parava de tocar. Eram pais, mães ou familiares dos estudantes, todos perguntando se a escola iria suspender as aulas naquela noite e também no dia seguinte. Os boatos eram os mais variados. Dizia-se que nessa e naquela cidade da região, atentados haviam sido cometidos em escolas, clubes, supermercados e outros locais de grande movimentação de pessoas.
Nos noticiários da TV as informações eram as piores possíveis. Na capital, fecharam-se todos os shoppings, várias escolas encerraram as atividades mais cedo, o comércio baixou as portas, ou seja, ficamos efetivamente encurralados pelos agentes do crime. No dia seguinte, terça-feira, a situação já voltava à normalidade, os noticiários nos informavam que o PCC havia determinado a suspensão dos ataques e as cidades voltavam às suas rotinas.
A informação que vem sendo veiculada pelos jornais e pelo noticiário televisivo é que o alto comando da polícia e da segurança do estado fizeram um acordo com os líderes do tráfico para que cessassem as agressões. Especulou-se muito sobre tal tema, até que algumas autoridades comparecem à TV para dizer que realmente houve uma reunião com alguns dos líderes do PCC. O jornal Folha de São Paulo, de ontem, noticiou que uma comitiva constituída pelo corregedor dos presídios da Secretaria da Administração Penitenciária, um delegado representando a Secretaria da Segurança Pública, um coronel da Polícia Militar e uma advogada dos presos participaram de uma conversa de cerca de 40 minutos com o líder do PCC, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, juntamente com outros sete integrantes da cúpula da facção. Registre-se também o fato de que o grupo utilizou um avião da Polícia Militar para ir ao encontro dos criminosos.
Fiquei boquiaberto. Pensava já ter visto de tudo aqui no Brasil, mas essa última atitude das autoridades representa a admissão da falência do estado. Estamos realmente na mãos dos bandidos. Uma atitude dessa dá uma força enorme aos criminosos. Creio que chegamos no fundo do poço no que diz respeito à cidadania. O futuro não nos reserva boas coisas.
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