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Publicado: Quarta-feira, 18 de junho de 2014

Quero-quero apronta, urubu leva a fama

Crédito: Foto/Divulgação Quero-quero apronta, urubu leva a fama

Há uma guerra não declarada no céu. Trava-se uma batalha desigual entre possantes aeronaves invasoras e pássaros por um espaço antes exclusivo aos últimos. A briga não é recente. Em setembro de 1905, um dos irmãos Wright, que disputam com Santos Dumont a invenção do avião, reportou ter perseguido e acertado uma ave. Com a expansão da indústria, este tipo de colisão se expandiu. Atualmente nos Estados Unidos a aviação enfrenta 18 mil choques do gênero por ano, com prejuízos estimados em US$ 650 milhões. Um exemplo foi o encontro no ar em janeiro de 2009 de um Airbus 320 com gansos, o que levou a um pouso forçado de 155 passageiros no gélido rio Hudson.

Como é possível estragos, alguns fatais, provocados pelo encontro inesperado de tão inofensivas aves com gigantescas aeronaves? A resposta vem através da física. Em função da velocidade, o impacto de um avião que voa a 650 quilômetros por hora com um pássaro de uns 2 quilos equivale a enfrentar uma batida contra 45 toneladas.

“No Brasil, todas as companhias aéreas sofrem com o problema”, comenta o diretor da ABEAR Ronaldo Jenkins. Em 2012, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA) registrou 1.604 colisões com aves, 276 delas atingindo motores dos aviões. Os incidentes ocorreram em todas as regiões, com maiores índices em Joinville, Santa Catarina, seguido de perto por Teresina, no Piauí. Uma das principais empresas brasileiras reportou em quatro anos 1.257 encontros com aves com perdas de US$ 30 milhões. Diferente do que a maioria imagina, 21% destes choques ocorrem contra o pequeno quero-quero, o triplo do provocado por urubus, segundo lugar nos enfrentamentos.

Pesam decisivamente como causas os aterros sanitários (“lixões”) a céu aberto e próximos a aeroportos. Explica-se: em um raio de 20 quilômetros, com aeronaves a 3.500 pés de altura, ocorrem mais de 90% das colisões. “As pistas da maioria dos aeroportos brasileiros foram construídas há mais de 40 anos em locais, à época, distantes dos centros urbanos”, revela estudo sobre a relação entre risco aviário e resíduos urbanos, feito pelos especialistas em segurança de aviação Rubens de Oliveira e Fernando Pontes. Para eles, a falta de planejamento e fiscalização e interesses políticos sitiaram a maioria dos terminais.

Qual a solução? Começa pela conscientização de que municípios não podem manter lixões próximos aos aeroportos. “A questão tem a ver com limitações ao uso do solo, uma medida impopular de responsabilidade legal das Prefeituras” lembra o consultor Adalberto Febeliano. “Um passo importante foi dado pela ANAC em maio de 2014 com a regulamentação da gestão de riscos de fauna pelos operadores de aeródromos”, destaca o consultor Paulo Roberto Alonso. Cabe ainda às companhias aéreas iniciativas como instalar nas aeronaves equipamentos como o Pulselite, que por apenas US$ 10 mil por aeronave produz pulsos intermitentes de luz que afugentam aves. Foi assim que a australiana Qantas reduziu o problema cerca de 35%.

* Este texto foi publicado originalmente na coluna Viagens de Negócio, de Fábio Steinberg, no dia 17 de junho de 2014, no Diário do Comércio da Associação Comercial de São Paulo.

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