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Publicado: Segunda-feira, 12 de dezembro de 2005

Paz na Terra aos homens de boa vontade

Vem aí o Natal, novamente correndo gaiteiro, com papai Noel barbudo e tão vistoso de branco e vermelho, bonachão e gordinho, como grande empreiteiro e sagaz conselheiro dessas festas e comemorações de tradição e cunho estrangeiro mas já universal, assim tornado ou globalizado e tão endeusado que virou brasileiro. E o povo todo se arregimenta, alvoroça, alegra, brinca, e em uníssono esboça planos e projeta sonhos e aspirações, nessa contagiante euforia ofertada ou promovida “generosamente” por anúncios ufanos das lojas, das vitrines, das luzes, das músicas, do burburinho das ruas, avenidas e shoppings. Todos preparam inconsciente e alegremente a ementa das tantas comprinhas, das felicitações, dos e-mails festivos, coisas tão próprias, carinhosas, mesmo que pequeninas, dessas datas festivas. Presentinhos, convidados, encontros chegados, iguarias que a mesa comporte e o bolso suporte com o magro incentivo de décimo terceiro, que embora magrinho vem tão ansiado e por derradeiro. Esquecem-se as dívidas, sobretudo as próprias, e fazem-se outras se o Serpro ou o crédito deixar, mas não a alegria desse festejar.

Também quase sempre entre tanta euforia, esquecem-se logo fácilmente ilúcidos e distantes motivos, conspícuos ativos dos sãos simbolismos do profundo pensar, do legítimo sentir, da perfeita entrega, da verdade ao amar, do correto atuar que lá longe no tempo o martírio de um homem, nascido no Natal rodeado de amor, que nos quis ensinar a sublime idéia de nos libertar a nos dignificar. Na realidade, essa sabedoria do absoluto, a perfeita e completa necessidade da plena integridade do imenso todo, tenta-se sempre com sorriso irônico e incrédulo indagar, divagar, simplesmente quer-se ignorar e no possível sempre postergar . Para quê dramatizar? . . . Orgulhosa e perigosamente firma-se e afirma-se o que ao ego apela e à mente faz ignorar prioridades, obnubilação consciente ou inconsciente ao bem social, ao bem público ou comum : imediatismo de uma imensa cadeia ainda em lento processo a tentar superar-se ou evoluir. Matéria consciente e inteligente, mas preguiçosa intelectivamente , titubeante para as coisas do espírito e da transcendência, mas que canta solta em uníssono a glorificação da perfeição de um processo criador que tem por centro seu ego e por isso exalta-se em euforia e gáudio epidérmico afirmador. Quem precisa de conselho que traga coerência a um processo destrutor visível, mas que raramente ninguém em consciência quer supor? Quem quer ver na destruição da natureza a extinção do seu próprio valor potencial, do seu mesmo existir, a corrupção da essência do tal mundo de promessas e de amor? Quem corrompe se corrompe mais e mais e perde-se nessa indomável selva de execrável cultura ou se anula na corrente inconsciente da dimensão da mentira e do horror! É o homem à cabeça da imensa cadeia evolutiva o seu perfeito senhor? Qual o animal dessa cadeia que destrói ao seu redor a casa em que habita de favor?

Não temos PAZ na terra, Senhor, nem já na crença num futuro fora dela, nem nesta parte ou naquela, nem na rua, no ônibus, ( dantesco espetáculo) no modesto abrigo ou na favela, nem à beira mar, nem no lar, nem à hora da prece ou ao jantar, nem sã promessa se faz vislumbrar, nem a boa vontade entre os homens aparece visível sem ser risível. Mas cantamos de bom grado essa esperança de PAZ , talvez o sonho ou o que reste dele até agora. Ainda bem! Às vezes vemos o favor da caridade, sem qualquer autoridade de autenticidade, como migalhas que caem da mesa da abastança, mas raramente a ação cálida e espontânea, contínua, amorosa, sem cálculos, sem dúbia política, sem ver autênticos samaritanos a pontuar caminhos e a indicar rosa dos ventos orientadora, que é afinal a mensagem do Natal. Soam quase apenas por toda a parte, slogans enganadores e sininhos alegres a repetir-se giroscópica e misticamente, sobretudo em pretensos lugares de culto, que nem sempre são a Igreja, o povo reunido em sanidade e comunhão ao redor do sagrado, cada vez mais distante da mensagem natalina de humildade, amor e dádiva e tão longe das pungentes e catastróficas realidades.

Que a Graça de Deus nos permita a todos serenidade, sensibilidade, identificação, introspeção, meditação, autenticidade, consciência sincera e verdadeira, que resulte em ação inspiradora de verdade, coerência individual e coletiva a justificar tanta esperança e comoção eterna, secularmente repetida com escassa conspicuidade contrastante nestas épocas natalinas, mas que a mesma caritativa benção se projete em consciência na ação exemplar de cada um de nós, nas atitudes sensatas, coerentemente pensadas, dignificantes, diligentes, hora a hora, minuto a minuto, durante cada momento em todos os dias do ano:

“Paz na terra aos homens de boa vontade”
São os pensamentos que nos sugere esta época em crise, na qual vivemos.
Com fraterno amor, sonho e esperança imperecíveis ! . . .
Erasmo

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