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Publicado: Sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Pastoral da Mulher: 25 anos

Pastoral da Mulher: 25 anos
É mesmo uma vitória. São 25 anos de lutas e de esforços que poucos conhecem na sociedade jundiaiense de quase 400 mil habitantes. É grande a proporção dos que nem ao menos imaginam o que seja o trabalho pastoral realizado no sub mundo da prostituição. Aí vivem seres humanos, vítimas de um mundo cão, onde, na maioria dos casos, a fome e a miséria obrigam a vender o corpo e a mulher é simplesmente instrumentalizada. Poucos, quando ouvem a palavra prostituição, sabem as causas das que são prostituídas e muitos são os que generalizam e simplesmente julgam as mulheres. Estou falando do meretrício de pessoas pobres, jogadas à sarjeta, vindas do interior do país, pressionados pela total falência de políticas agrárias, ou outras que fixem as famílias nos locais de origem, situação que vem se agravando desde os anos 70.
 
Sem dúvida, o caso de Delmira (nome fictício) ilustra. Aos 10 anos de idade foi violentada pelo pai. Este, alcoólatra, ao passar dos anos, abandonou a mãe e os filhos. A criança de 10 anos foi empurrada pela situação para a prostituição e depois teve filhos cujos pais nunca assumiram. Delmira, mais tarde, encontrou a Pastoral da Mulher e reencontrou a sua dignidade. Largou o comércio de seu corpo e, na Casa Maria de Magdala, obteve formação para exercer um trabalho digno e poder criar sua família, sem humilhações. Delmira encontrou, sobretudo o Evangelho, a oração, a confiança em Deus Misericordioso que lhe ajudaram a tirar do coração toda erva daninha de ódio e de revolta. Hoje, com cerca de 35 anos, vive feliz, porque se sente gente e não objeto de descarte. Não há muito tempo, viu seu pai quase morrendo, abandonado por todos. Teve ímpetos de nada fazer, mas lembrou-se de Deus que não quer a morte do pecador, mas que se converta e viva. Sem fazer perguntas ao pai, antigo agressor, cuidou dele até seu passamento e fez seu sepultamento, sem pompa, no ponto de pobre, mas com dignidade e paz no coração. Delmira não abandou o grupo. Continuou associada à Maria Cristina Castilho de Andrade, a coordenadora da Pastoral desde a sua fundação, que tem atitudes de apóstolo e coração semelhante ao de Maria, que de tanto amar a Deus, recebeu a graça de gerar o Salvador para a humanidade inteira.
 
A alma de Cristina Castilho é inteiramente de Deus e seu tempo é totalmente dos outros. Professora, culta e inteligente, não faz questão de elogios e nem reconhecimentos, só de cumprir a missão de salvar os excluídos, com a força do céu. Cristã autêntica, muito antes de o sol nascer, prepara seu dia se colocando por prolongado tempo em oração, no lar de sua bondosa mãe, a guardiã fiel das obras perigosas da filha a quem soube educar, ao lado de seu saudoso esposo, para servir ao próximo, com os olhos voltados para Deus, sabendo que este é o único meio de fazer uma pessoa ser realmente humana.
 
A Pastoral da Mulher nasceu do altar da Catedral, no dia de Nossa Senhora Aparecida de 1982, quando dom Roberto Pinarello Almeida, tendo terminado a celebração eucarística das 18h15, encontra Cristina Castilho à porta da igreja de onde vêem quatro mulheres prostituídas, em situação degradante, correndo entre os canteiros da praça, na penumbra da noite. Uma decisão é tomada de imediato. O envio do bispo foi inevitável e foi bem acolhido pela jovem fiel que acabara de receber a Comunhão na missa em louvar da Virgem Mãe Aparecida.
 
O começo foi feito só de coragem e determinação. Ir todas as semanas à praça da Catedral e conversar com cada uma foi tarefa exigente e dignificante ao mesmo tempo. Depois, vencer o acanhamento e entrar nos bares para falar com elas; depois ainda derrotar de vez o preconceito e visitar as casas delas, cuidar de seus doentes, arranjar-lhes um jeito de vencer a miséria, e a exclusão, foram passos que somente na fé e no amor se explicam.
 
Até 1988, foi somente Cristina que tudo fez, com o apoio de dom Roberto, de monsenhor Hamilton Bianchi e de monsenhor Joaquim Justino Carreira. Naquele ano, salas da Catedral foram abertas para as reuniões das quartas-feiras e as mulheres perderam o receio de freqüentá-las, ao se sentirem acolhidas como filhas de Deus.
 
A partir de então, outras pessoas da Igreja se uniram ao trabalho, sendo capazes de meditar sobre o que significa a palavra de Cristo: “as meretrizes vos precederão no Reino dos Céus” (Mt 21,31). Descobriram que os que precisam de conversão não são somente os que estão no mundo do meretrício, mas todos mais que se prostituem na hipocrisia, na maledicência, no orgulho, além de nada fazerem pelo próximo que cai nas mãos dos exploradores ou na falta de escrúpulo dos traficantes de mulheres que ganham dinheiro à custa delas.
 
Em 1995, foi fundada a Casa Maria de Magdala. Os objetivos dela são: “Reconstrução e fortalecimento da mulher, a quem foi imposta uma trajetória de vida, a partir da miséria ligada à promiscuidade, da violência sexual infanto-juvenil, da troca do corpo pelas drogas. Ali, a partir do fortalecimento da mulher, ela recupera o seu direito ao livre arbítrio. Esse fortalecimento é decorrente da constatação de que Deus a ama e da construção de uma auto-estima positiva, a partir dos cursos de que participa e dos trabalhos por ela desenvolvidos. Também se proporciona o acompanhamento dos filhos das mulheres envolvidas, crianças e adolescentes, na escola, no reforço escolar e em outras atividades e cursos oferecidos, com o propósito de que não necessitem repetir a trajetória da mãe e nem experimentar o círculo de morte que, tantas vezes, é fatal”.
 
A Pastoral da Mulher é o único trabalho humanitário com prostituídas que existe em Jundiaí.
 
Celebrar os 25 anos da Pastoral da Mulher em Jundiaí é simplesmente elevar mil ações de graças ao Deus da Vida, Senhor das misericórdias, que nunca desiste da pessoa humana. É erguer um monumento invisível à dignidade e à força de Deus no coração dos que crêem que toda pessoa tem jeito de recuperar a sua condição de ser imagem e semelhança do Criador.
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