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Publicado: Terça-feira, 6 de março de 2012

Para o alto e avante

Crédito: Google Para o alto e avante
Construção do Cap Ferrat, conhecido como Godzilla

A vida nas grandes cidades, em certos momentos, beira à aberração. Ora pela quantidade de gente, de carros, falência do transporte coletivo, engenharias de tráfego que sabe-se lá onde andam com a cabeça, filas em restaurantes, ausência de vagas nas escolas, saúde pública e particular que mais mata do que cura, tudo muito próximo do esgarçamento final.

Imaginem que em boa parte das cidades brasileiras, lugares da moda, se não for através de reservas ou algo parecido, podem preparar as pernas para um bom par de horas na fila.

O que era para ser lazer, vira inferno. Os centros urbanos acima de 300 mil habitantes são lugares clássicos para fabricar malucos. Transformaram-se em centros de opressão onde seus contribuintes recebem um tratamento muito longe de ser V.I.P.

Tudo porque boa parte das administrações públicas no Brasil não consegue articular um freiozinho sequer em certas maluquices que já datam de 30, 40 anos atrás. Nosso país, já há algum tempo, virou uma espécie de topa tudo por dinheiro. O vale-tudo para por o dinheiro no bolso.

Se os(as) amigos(as) leitores(as) campineiros e ituanos não se lembram, parafraseando o inesquecível Adoniram Barbosa, dá licença de eu contar. Na década de 1970, meteram a casa onde nasceu o grande maestro Carlos Gomes no chão para colocar um prédio no lugar. Desconheço se a placa alusiva ao sítio histórico de relevância nacional foi preservada, anunciando que, no local do edifício, havia a tal construção em estilo clássico. Simplesmente, um crime o seu desaparecimento.

No caso de Santos, o trem também seguiu por caminhos bem estranhos, mas até o ano 2000 o máximo que os prédios alcançavam era 9 andares. Bons tempos aqueles.

Hoje em dia, vão de 25 a 35, 40 andares. Uma bela cidade litorânea que atualmente carrega monstrengos de qualidade arquitetônica duvidosa e espaços de moradia que de luxuosos só tem o preço. O acinte é tão descarado que se entrar a tela plana, sai o sofá da sala. Armário e cama, nesses novos empreendimentos, não ocupam o mesmo lugar no quarto. É quase uma cela de cadeia.

O maior problema, além das aberrações arquitetônicas e urbanísticas provocadas por esses novíssimas empreendimentos da construção civil, é o desaparecimento do patrimônio imaterial da cidade. É difícil acreditar que, com o sumiço da casa de Carlos Gomes, parte da história da cidade e, consequentemente, de seu patrimônio imaterial não tenham ido juntos parar no rés-do-chão.

Seriam essas as cidades que queremos?

Aqui em Santos, a aberração tem fortes cores de ignomínia. A destruição da cidade cavalga loucamente, jogando no lixo toda uma cultura patrimonial e humana. É de dar medo, é de levar cada santista da gema às lágrimas.

Em nome de quê mesmo? Progresso? Desenvolvimento? Acho curioso certos santistas babarem em Puerto Madero, Barcelona, Paris, gastam um dinheiro sentido para ir nesses lugares e voltam arrotando dissonância, reclamando que aqui em Santos poderia existir algo semelhante às grandes cidades do mundo.

O detalhe é que se você, após às 22 horas, espirrar um pouco mais alto no aconchego de seu quarto, o vizinho chama a polícia reclamando do barulho. Clássica crônica do saudoso Narciso de Andrade conta certa vez que uma moradora da Ponta da Praia ligou para a prefeitura reclamando que os navios, ao saírem do canal do estuário, apitavam. Seria mais ou menos se viver numa cidade famosa por seu gado de corte e proibir o boi de mugir. 

São essas mesmas cabecinhas que pretendem construir em Santos uma vida noturna ativa, igual a de grandes cidades do planeta, mas provavelmente com barulho até às 10 da noite. Não tem como os prédios deixarem de se proliferar, desaparacendo com parte relevante da história e cultura santistas. O meio de cultura para tamanha mediocridade, em circunstâncias como essas, são altamente eficientes.

Como diz o vereador Reinaldo Martins: Santos tem prédios de Manhatan e ONGs de Nossa Senhora do Cadeado. Haja!

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