Para caçar um Saci...
Conversando aqui e ali com amigos sobre cultura popular e folclore, o que é um, o que é outro, descobri que existem muitas diferenças entre eles, porém ambos se nutrem da mesma fonte: são manifestações das crenças do povo e precisam estar presentes no cotidiano para continuarem existindo. São a expressão dos hábitos e valores que ao longo do tempo formaram a identidade, o caráter de determinada comunidade.
As entidades mágicas que existem no nosso imaginário, as festas populares como Samba de Terreiro, Cururu estão desaparecendo lentamente. As brincadeiras de roda, passa-anel, dona da rua e tantas outras já vivem apenas na memória de quem tem mais de quarenta anos.
Quantas crianças, hoje, conhecem essas técnicas, sabem do perigo da mula sem cabeça e do boitatá, ainda esperam tardes de ventania para soltar pipa? Ou o domingo de Páscoa para ver o Estouro do Judas?
Lembro das tardes de vento, quando criança, montando armadilhas para “caçar” saci no quintal da chácara onde morava. Passava dias entretida nos preparativos e horas intermináveis, escondida com um fio de barbante na mão, pronta para fechar a arapuca assim que o saci entrasse nela.
Bem, nunca consegui ter sucesso nessa aventura, mas me renderam momentos de pura magia e farta diversão. É dessa magia que o folclore e as festas do povo se alimentam e chegam até a próxima geração, compartilham o universo cotidiano e vão sobrevivendo, amarrando os fios de nossa história pessoal e coletiva.
Acreditar em saci, na iara, no curupira, na cuca e em tantos personagens fantásticos era uma certeza, as histórias que as crianças ouviam de seus pais e avós, as ajudavam a compreender melhor os mistérios da vida, inexpugnáveis para aquelas cabecinhas que mal começavam a descobrir o mundo.
Aproveito essa prosa para divulgar o site www.sosaci.org, entidade criada em 2003, que, entre outras realizações, criou o Raloim Caipira — só se for com carne seca- com o objetivo de valorizar nosso rico repertório mitológico e enfrentar os estrangeirismos que corroem o imaginário nativo, em detrimento da nossa cultura e autonomia. Salientando seu caráter não xenófobo, a Sosaci reitera o objetivo de reivindicar reciprocidade na troca cultural entre os povos do mundo globalizado.
É tempo de pensarmos com muita seriedade e urgência na valorização dos mitos e das lendas brasileiras, de difundir nossa tradição oral e a cultura popular, antes que elas desapareçam de vez de nossa memória.
Antes que o 4 de julho se torne feriado nacional!