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Publicado: Segunda-feira, 2 de março de 2009

Os Mestres não são de Açúcar

Uma coisa dura de se descobrir sozinho, como o fiz, é que os Mestres de Yôga indianos não são suaves nem bondosos como os pinta a nossa imaginação cristianizada. No cristianismo, é preciso ser bom para se obter progresso espiritual e aprovação da comunidade. No Yôga hindu, a ênfase é dada à autenticidade, ao poder interior e ao esforço prático pelo progresso. A bondade pela bondade é uma virtude menor. Mais vale um Mestre severo e agressivo, mas que tenha um conhecimento verdadeiro, saiba ensinar e realize uma obra forte, do que um outro piedoso, contudo menos competente, que pouco saiba e nada realize de útil.
 
Destarte, logo descobri que o Mestre da montanha, que rugia, era uma dama de politesse, em comparação com outros que vim a conhecer.
 
Certa vez fui prestar homenagem a um mestre, levando-lhe um puja de frutas. Ele olhou de cara feia, não aceitou e fez um comentário em hindi com péssimo tom de voz. Uma pessoa presente, que entendia hindi e falava inglês, me explicou:
 
‑ Ele disse que você não tirou os sapatos para falar com ele.
 
Diante disso, tirei os sapatos e voltei a oferecer-lhe o puja. Recusou novamente.
 
‑ Ele disse que você está com as mãos sujas porque ao se descalçar, tocou os sapatos.
 
Lavei as mãos, retornei, descalcei-me sem tocar os sapatos e ofereci outra vez. A cena se repetiu.
 
‑ Agora ele disse que você está lhe oferecendo os frutos com as duas mãos e é sabido que para os hindus a mão esquerda é impura.
 
Eu deveria ter continuado a receber minha lição de humildade e de etiqueta, até que ele aceitasse o puja, mas acho que eu era muito orgulhoso e tinha chegado ao meu limite, afinal, se ele era Mestre eu também era, conquanto mais jovem. Assim sendo, pedi que lhe traduzissem o meu recado:
 
‑ Por três vezes tentei fazer uma oferenda à divindade encarnada em seu corpo e por três vezes ela recusou. Devo entender que esse corpo já está muito bem nutrido e que a divindade que habita em todos nós ficará mais satisfeita se a oferenda lhe for feita através desta criança faminta.
 
E, dizendo estas palavras, dei as frutas a uma criança mal nutrida que assistira a tudo com um olhinho comprido para as frutas. Esta, aceitou-as imediatamente com um sorriso muito gratificante. A mãe dela, agradecida, deixou o mestre para lá e tentou me beijar os pés em sinal de grande reverência segundo a tradição, o que não permiti porque a minha tradição discorda e eu já estava meio saturado de tradições. O fato correu de boca em boca e logo virou polêmica. Em alguns lugares eu era censurado e noutros louvado pela mesma atitude! Que coisa! Acho que a minha sina é ser polemizado. Até na Índia!
 
Outro fato que me chocou de início foi a cena inesperada de um swami atirando pedras nos macacos que andam soltos pelos mosteiros. Mas logo entendi. Os macacos disputam palmo a palmo aquele território com os homens, há séculos.
 
Quando encontram uma janela aberta, eles entram para roubar coisas. Se alguém invade seus domínios com frutas nas mãos, os macacos atacam para tomá-las e podem ferir a pessoa se ela reage. Então aprendi que as frutas devem ser carregadas dentro da bolsa, as janelas devem ficar fechadas e nada de achar os símios bonitinhos. Pode-se acabar levando uma mordida feia.
 
Este artigo é um extrato do livro Yôga: Mitos e Verdades, do Mestre DeRose.
Correspondência para o autor: Mestre DeRose
Al. Jaú, 2000
01420-002 São Paulo SP
Dia 18 de fevereiro, dia do Yôga!
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