Publicado: Quinta-feira, 26 de julho de 2007
O Uivo do Morro Ventantes
Este parece ser mais um relato sem importância no seu dia. E na verdade o é. Só tem importância mesmo para aqueles que sofreram com a ida semi-pra-sempre da Desligada de Querengué, uma jornalista amnésica que há tempos não vivia por aquela região.
Havia ido “para nunca mais” com o objetivo de morar no Rio de Janeiro, onde teria uma missão quixotesca: escrever a biografia de um famoso fotojornalista brasileiro, do qual não recordo o nome agora, mas quem eu sei que é da Bahia.
Terminada a biografia, ela tinha de escolher as duas coisas mais difíceis para um
escritor de primeira viagem, o título e um pseudônimo e foi por este motivo que ela me ligou, numa dessas tardes de inverno, disse sem cumprimentar “estou a procura de um título”. E respondi que não sabia que ela ainda estava viva, que era uma surpresa e que deveria aparecer por Querengué qualquer dia desses, “preciso de um título, não enrola”. Ela tinha adquirido a prepotência urbana, filha da
velocidade das grandes cidades (no caso de São Paulo) ou das praias internacionalizadas (no caso carioca), mas eu ainda era educado e perguntei para que serveria o título. “Para uma biografia”. Lembrei que algumas biografias tendem a resgatar nomes de outras coisas e que era essa uma das características da pós-modernidade: a paródia. “Você ainda acredita nisso”, ela perguntou irritada. Se telefone tivesse cheiro, daria para sentir o bafo de cigarro que ela certamente estava a soltar do lado carioca da ligação. Expliquei que tinha de acreditar em alguma coisa, que a pós-modernidade substituíra qualquer teologia. “E meu título?”.
Ela queria mesmo um título. Em nome dos bons tempos de nossa amizade, do tempo em que ela apenas era a Desligada de Querengué e não a Ligadona Carioca, resolvi ajudar e perguntei que livro ela lia no momento.
“Omorrodosventosuivantes”, respondeu num fôlego só, como se dissesse “não é da sua conta”. Sugeri O Uivo do Morro Ventantes e ela, claro, achou horrível. Dei uma risada fonseqüense do lado de cá e, de lá, ela jogou o telefone na parede.
A ligação caiu. Ela derrubou. Não soube mais nada dela ou do livro sobre o fotógrafo. Até esta manhã em que recebi um convite aqui em casa para o lançamento do livro com o nome que eu sugeri, escrito pela jornalista Querengué’s Turned Off. Belo nome, belo pseudônimo. Quero minha participação em dólares.
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