Colunistas

Publicado: Segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O Ter, o Ser e a Felicidade

“Para a nossa avareza, o muito é pouco; para a nossa necessidade, o pouco é muito.” (Sêneca)
 
Essa tal de felicidade! Onde anda? Como é? Como conseguir? Essas indagações acompanham a vida de grande número de pessoas, compondo o universo daqueles para quem a Felicidade, embora ardentemente desejada, não passa de sonho não realizado plenamente. Isso porque a felicidade não é fácil, nem automática na vida humana, mesmo tendo Deus concebido o homem para ser santo e feliz. Dotou seus filhos de condições para isso, ou seja, proveu o coração do homem de valores e virtudes, apenas que em forma de “sementes”: de santidade, felicidade, bondade, fé, caridade, entre tantas. E então? Como sabemos, a semente não é tudo, precisa de terra boa para germinar e de cuidados para crescer, e Deus não vai fazer isso por nós, sob pena de concordar com nossa preguiça e acomodação. Assim, sem a nossa participação, a nossa história não se completa...
 
A vida atual do homem é dispersiva o que dificulta tudo; vive dividido, não conseguindo concentrar-se naquilo que realmente conta para o seu bem-estar. São tantas as coisas e bens “necessários” hoje em dia que acaba consumindo a maior parte da vida tentando adquiri-los. A sociedade estimula o consumo pregando como prêmio a “Felicidade do Ter” - quanto mais consome, mais feliz. Será?
 
Doce ilusão tentar ser feliz através das coisas. Sejam elas quais forem e na quantidade e intensidade que se apresentem. Por acaso são felizes aqueles que passam a vida correndo atrás do dinheiro? Ou aqueles que convivem agarrados ao prazer, à fama e ao poder? Invariavelmente, acabam tendo experiências amargas e duras e terminam vazios.
 
A experiência mostra que o Ter pode até realizar a pessoa material e socialmente, dar a sensação de poder, facilitar amizades e convivências, ajudar na conquista de posições. Tudo isso, no entanto, não atinge o Ser integral. Não passam de coisas compráveis.
 
Ora, sabemos que a felicidade não é algo externo, tornar-se-á parte da vida, na medida em que os verdadeiros valores sejam cultivados, que os relacionamentos se tornem mais humanos e cristãos, na medida em que se busque não ter felicidade, mas ser feliz. Felicidade não custa dinheiro porque não tem preço.
 
Lembramos aqui o programa “tudo por dinheiro”, veiculado por uma emissora de televisão, mostrando muito bem do que as pessoas são capazes para “ter”, doa a quem doer, custe o que custar.
 
A voz de Deus é clara e incisiva: importa o ser humano, rico ou pobre, feio ou bonito, famoso ou não, poderoso ou fraco, mas o problema é que a verdade divina está sendo cada vez mais abafada pela voz do nosso mundo material e consumista.
 
Ainda que os bens materiais que nos são colocados à disposição sejam importantes para nossa vida na terra, não são tudo e nossa vida não pode ser alicerçada exclusivamente neles. A riqueza material é enganosa, perversa na maioria das vezes, escravizante, especialmente quando começa a alimentar o desnecessário, o supérfluo. Ao seu lado quase sempre caminha a pobreza humana; ao mesmo tempo em que é causa da pobreza material de outros...
 
Reconheçamos, a tentação é muito forte e, se não nos policiarmos, acabamos vítimas do sistema, que sobrevive à custa de nossas vaidades e do alto desejo de consumo; a “gostosa” sensação que o dinheiro nos empresta de poder comprar tudo que vemos, acaba tomando conta de nosso viver; perdemos a força do discernimento, da moderação e do bom senso; extrapolamos nossa própria capacidade de endividamento tornando-nos vítimas de um sistema capitalista e cruel. Culpa nossa ou não, vamos ter de pagar essa conta. Adeus sossego, adeus felicidade...
 
Não é fácil ser feliz na miséria tanto quanto no excesso. A conquista do meio-termo vai nos custar algumas renúncias, alguns sacrifícios, algum esforço, mas vai valer a pena. Ainda que possamos defender que os bens terrenos não são, em princípio, maus, temos que concordar que são perigosos. Importa saber como eles agem em nossa vida: estão a nosso serviço ou já estamos nós a serviço deles?
Comentários