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Publicado: Sexta-feira, 4 de julho de 2014

O Saber Itinerante: formação do Operário Fabril

                                                                  O Saber Itinerante: as primeiras experiências fabris e o conhecimento técnico na Província de São Paulo.

                                                                                                                                                                                                                                                                 Dra.  Anicleide  Zequini - [email protected]  

 

Este artigo foi publicado em:    ZEQUINI, Anicleide. . O saber itinerante e a formação do proletariado na região de Itu (1869-1920). Revista Eletrônica de História do Brasil, v. 3, p. n.1, 1999.

                                                                                 

Resumo:

                  O artigo procura demonstrar a constituição de uma rede de sustenção que vai viabilizar tecnicamente a presença de empreendimentos fabris (fábricas de tecidos e Engenhos Centrais) bem como, de técnicos e engenheiros no processo de formação do proletariado nesta região.

Palavras-chaves: trabalho e trabalhadores/ industrialização, historia da/ técnica, história da

 

Abstract:   

                     The article tries to demonstrate the constitution of a support net that will make possible the presence of industrial technically (factories of fabrics an Central Mills) in the area of Itu during the second half of the century XIX as well as, the presence of the technician and engineers in the process of formation of the proletariat in this area.

 

Keywords: work and workers/ industrialization, history of the/ technique, history of the   

 

            Os primeiros projetos fabris, da segunda metade do século XIX,  que tiveram êxito na Província de São Paulo,  estão localizados no interior da Província, ao longo dos rios e próximo a matéria-prima. Majoritariamente, compunham-se de fábricas de tecidos, acompanhando uma tradição inciada na Europa, com destaque para a Inglaterra, onde um dos primeiros setores a se industrializar foi o têxtil.

            Ao contrário dos primeiros fabricantes têxteis de Lowell, que projetaram e produziam os seus próprios equipamentos, os brasileiros dependiam das indústrias de máquinas da Grã-Bretanha, França e Estados Unidos, não só para o equipamento como também para os técnicos que vinham supervisionar a sua instalação e manutenção (Stein,1979: p.50).

            Vale ressaltar que as primeiras experiências fabris no Brasil, e também na Província de São Paulo, intensificadas à partir do alvará de  1808,  tiveram Portugal como mediador da introdução de inovações técnicas, maquinarias e tecelões portugueses que vieram para cá ensinar o ofício de fiar e tecer. Nas primeiras décadas do século XIX, os interessados em ativar o desenvolvimento tecnológico da indústria têxtil no Brasil, importavam idéias e máquinas de Portugal (Mello, 1975:p.78).

            O saber técnico, neste primeiro  momento, estava representado pelo menos para a Província e cidade de São Paulo, pelo português Thomaz Roiz Toxa, natural do Porto. Tinha 40 anos quando chegou à cidade de São Paulo em 1813, para exercer a função de mestre fabricante de tecidos de algodão e seda. Durante pelo menos dez anos monopolizou o ofício de mestre tecelão na cidade de São Paulo, na compra de máquinas, direção dos teares e ensino aos aprendizes (Mello, 1975:p.68-104)

            A presença de portugueses no ensino da arte de fiar, para a primeira metade do século XIX, ainda é um assunto pouco estudado (tema que escolhi para uma nova pesquisa que estou iniciando). Contudo, creio que neste momento os portugueses constituíram o agente do saber itinerante, que na segunda metade do século XIX foram constituídos, em sua  maioria, por ingleses.

            Alguns elementos vão favorecer consideravelmente a instalação de fábricas de tecidos na Província de São Paulo, na segunda metade do século XIX, em especial na região de Itu, antes mesmo delas terem-se instalado na cidade de São Paulo.A presença no Brasil  de ingleses provenientes da construção de ferrovias, influenciaram consideravelmente a atividade da cultura do algodão, num momento em que a Inglaterra via-se privada do abastecimento deste produto devido a guerra civil americana.

            Entre as diversas companhias organizadas para a construção de ferrovias na Província de São Paulo, a Railway foi a única  a ser organizada fora do país - em Londres. A gestão administrativa da Companhia caracterizava-se pelo fato de que havia uma permanência no Brasil de engenheiros e técnicos, prática que foi posteriormente seguida pelas administrações de outras Companhias: a Sorocabana, a Mogiana, a Paulista e, esporadicamente, pela Ituana (Veiga Filho, 1893:p.117-118)

            Num período de quarenta anos, somente três pessoas ocuparam cargos administrativos na São Paulo Railway Co. J. Aubertin , Fox e Willian Speers. Destes, Jean Jacques Aubertin, superintendente da estrada de ferro Santos-Jundiaí quando da construção, destacou-se com porta voz e defensor dos interesses da industria têxtil inglesa, que se encontrava com problemas de abastecimento devido à guerra civil americana (Veiga Filho, 1893: p.117).

            Com o objetivo de regularizar o abastecimento de algodão para as fábricas inglesas Aubertin, como representante da Associação para o Suprimento de Algodão de Manchester (fundada em 1857 com o objetivo de desenvolver a cultura de algodão na Índia e que  depois da guerra passou a empenhar-se pela universalização da cultura algodoeira) despertou o interesse de alguns fazendeiros de Sorocaba e depois de Itu para aquela cultura. Estas duas localidades tornaram-se os primeiros centros de expansão da cultura do algodão herbáceo na Província de São Paulo. (Canabrava,1981: p.8),

            Em Itu, Carlos Ilidio da Silva, proprietário da fazenda São Carlos, foi um importante intermediário entre os interesses apresentados pela Associação de Manchester e pelos fazendeiros ituanos. A sua propriedade funcionou como centro oficial de distribuição de sementes de algodão, enviadas pela Associação por intermédio de Aubertin a Itu e cidades vizinhas, e também de divulgação de tecnologia representada pelas máquinas de beneficiamento e enfardamento do algodão.

            Desta forma, a cultura do algodão em Itu e Sorocaba, além de ter oferecido a matéria-prima necessária para a fabricação de panos, possibilitou a presença de uma série de inovações tecnológicas para a sua transformação em fibras e fios. Este mesmo processo de mecanização agrícola ocorria nas fazendas de café pela difusão das máquinas de beneficiamento (Silva, 1976:  p.54-56).

            Alguns dos proprietários de fábricas de tecidos, como José Galvão de França Pacheco Jr. constitui exemplo dos que iniciaram seus projetos fabris por intermédio da cultura e comércio do algodão. Em 1868, ele era comerciante deste produto em Itu. Comprava o algodão já descaroçado e enfardado diretamente dos fazendeiros daquela região e os revendia, agindo como intermediário entre os produtores e consumidores representados pelas fábricas de tecidos existentes  em outras Províncias ou da Inglaterra.

            A extensão de seus negócios parece ter dado a Galvão o conhecimento e experiência necessária para que ele apostasse na execução de um empreendimento maior: a fábrica de tecidos que inaugurou, em 1875, em Salto.  O comércio do algodão e a estrutura proporcionada por esta cultura, como a presença de importadores de máquinas e de técnicos, fez com que ele  conhecesse este negócio desde os seus alicerces.

            Outro elemento determinante para a concentração de projetos fabris no interior da Província é a presença de rios com quedas d’água. Sendo as maquinarias desse período quase sempre movimentadas por água ou pelo vapor obtido através da queima de madeira - o que aumentava consideravelmente o custo de produção - as cachoeiras existentes nos rios Tietê, Sorocaba e Piracicaba, constituíram um forte atrativo para a implantação daqueles projetos.

            O aproveitamento de quedas d’água  como fonte de energia para a movimentação da maquinaria, não inaugurou nenhuma alternativa nova de utilização de energia. Contrariamente retoma uma opção bastante difundida nos primeiros centros fabris da Inglaterra, como Oldham e Manchester. O emprego da água como força motriz para as primeiras fábricas do algodão na Inglaterra era tão fundamental que “só era possível abrir uma fábrica às margens de um curso d’água bastante forte e rápido para movimentar as máquinas. Por isso, as fiações não se instalavam, a princípio, nas cidades de planície, mas nas proximidades dos morros, nos vales profundo, onde era fácil construir quedas d’água artificiais por meio de barragens” (Mantoux, 1985:p.241).

            Um fator de ordem geológica - fall-line- (linha de quedas) determina a presença de  rios com cachoeiras, concentradas no interior da Província, onde a própria natureza  oferecia a energia necessária para a movimentação das máquinas.

             Podemos destacar ao longo do rio Tietê,   a instalação no século XIX de grandes empreendimentos fabris. Em Salto, em 1875, a fábrica de tecidos Galvão; em 1882, a de Barros Júnior e em 1889, a fábrica de Papel Melchert; e na localidade de Porto Feliz, em 1878, a do Engenho Central de Porto Feliz, instalado com a finalidade de desenvolver e modernizar a indústria açucareira no Brasil, concorrer com o acúcar de beterraba e ao mesmo tempo, estimular o desenvolvimento da cultura da cana.

            Junto ao salto do rio Piracicaba, em 1875, a fábrica de tecidos Santa Francisca e, em 1884 a instalação do Engenho Central de Estevão Ribeiro de Souza Rezende.  No rio Jundiaí em 1887, também em Salto, a fábrica de tecidos de Octaviano Pereira Mendes.

            Vale ressaltar que a primeira fábrica de tecidos, instalada na cidade de São Paulo data de 1874 e pertencia a Diogo A. de Barros. Outras foram instaladas  após a República. Em 1890, a Cia Industrial de São Paulo e em 1897, a Fábrica Regoli, Crespi e Cia, por imigrantes italianos.

            Destes projetos fabris, muitos foram montados a partir de contratos com Casas Importadoras, instaladas a partir da década de 60 no Rio de Janeiro, Santos, São Paulo e depois em Campinas, com o objetivo de oferecer os mais recentes inventos, transformaram-se também em importantes agentes de difusão de tecnologia e recrutamento de pessoal, que vinha principalmente da Inglaterra e Estados Unidos para trabalharem nas filiais no Brasil, na montagem e manutenção das máquinas.

             Embora, as fábricas “tenham sido instaladas em vários lugares do Brasil, concentraram-se principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. Nestes dois Estados a produção e a comercialização do café criaram condições que favoreceram o seu crescimento, tais como: uma rede ferroviária bem sucedida, as casas bancárias e um pequeno comércio instalado nas áreas centrais da cidade. Aliado a tudo isso havia o lucro resultante da atividade cafeeira, que foi largamente empregado na indústria (Petta, 1995:p.8-9).

            O crescimento da cultura do algodão em Itu parece ter proporcionado e incentivado a diversificação de produtos oferecidos pelas Casas Importadoras, que passam a  atender não apenas os fazendeiros produtores de café e algodão, como também oferecendo maquinas específicas para a fabricação de tecidos.

            Destas casas importadoras, a firma americana Guilherme Von Wilck Lidgerwood de máquinas agrícolas, primeiramente instalada no Rio de Janeiro, a partir de 1866 em São Paulo  e depois em Campinas , destacou-se como uma das mais importantes importadoras de máquinas agrícolas, e um exemplo daquelas firmas que optaram pela diversificação de seus produtos. Além desta podemos destacar as firmas H.M. Lane no Rio de Janeiro, A.L. Garroux em São Paulo e em Campinas desde 1864 a firma Bierranback e irmãos (Canabrava, 1984:p. 10-15).

            Outras especialidades de comércio começaram a surgir, e entre estas, as casas especializadas em máquinas e que ofereciam também serviços de reparos e reposição de peças. Um exemplo destas estava localizada em Campinas, a Imperial Ferraria, Oficina Mecânica e Fundição de Ferro e Bronze”, pertencente a Antonio Carlos de Sampaio Peixoto. Este empreendimento além de possuir uma olaria completa montada para fabricação de tijolos para construção comportava uma fundição para toda e qualquer peça a ser feita sob encomenda e de acordo com o projeto e respectivo modelo a eles encaminhados. (Lisboa,1870:p.99-11).

            A concentração deste complexo comercial em Campinas, derivados do comércio cafeeiro, fez da localidade entre os anos de 1850-1900, centro produtor cafeeiro, de alimentos e matérias-primas para o mercado externo e interno, a que se acrescentam funções complexas de entreposto comercial e produção de artesanato, manufaturas industrializadas, bem como de serviços (Amaral Lapa, 1995:p.282).

            Da especialidade dos serviços oferecidos, por exemplo, pela Imperial Olaria e Ferraria Peixoto destacam-se a fabricação de cilindros, parafusos, ferros de arado, enxadas, rodas hidráulicas, parafusos para prensas de enfardar algodão,conserto em peças de engenho de moer cana, máquinas a vapor, turbinas,  chafarizes, grades para casas, escadas, jardins, portões para lampiões entre outros. (Lisboa, 1871:p.99)

            A proximidade da localidade de Campinas, com Itu, Porto Feliz, Capivari, Tietê, Piracicaba, entre outras, dinamizou  todo um setor fabril, que antes dependia exclusivamente de importações de máquinas mais complexas ou mesmo de peças, cuja reposição  rápida em equipamentos danificados, possibilitou o não comprometimento da dinâmica da produção.

            As casas importadoras ao diversificarem os seus produtos para atender aos empreendimentos fabris, passaram a ser significativas intermediárias entre os fabricantes de máquinas e os interessados em adquiri-las. Os proprietários da fábrica de tecidos São Luiz de Itu, fundada em 1869, recorreram  para a compra das máquinas, à Companhia Lidgerwood de Campinas que possuía um grande depósito de variadas máquinas – entre elas a máquina a vapor, locomóveis e fixas. Esta fábrica foi a primeira da Província a adquirir estabilidade e subsistir  e também a empregar o vapor como energia na produção. Toda a maquinaria da São Luiz foi adquirida dos Estados Unidos. Contava com 62 máquinas, entre as quais 24 teares. Guilherme Putney Ralston, engenheiro chefe da Companhia Lidgerwood, foi o responsável pela aquisição da maquinaria e também pelo projeto do edifício(Nardy Filho, 1949:p.32-37).

            José Galvão também adquiriu máquinas e projetos industriais através de Casas Importadoras. Em 1873, fez um contrato com a Samuel, Irmãos & Cia, do Rio de Janeiro, para adquirir da Inglaterra  “uma máquina completa das mais perfeitas e acreditadas e respectivos utensílios e objetos a ela indispensáveis e sobre-salentes de tecidos”(Rossi, 1992:p.69).Juntamente com as máquinas encomendadas da Platt Brothers & Co. Limited, de Oldham, vieram dois técnicos ingleses para os serviços de assentamento.

            Os serviços oferecidos pelos importadores, iam além da venda de máquinas. Na verdade eles vendiam a “fábrica de tecidos”, planejamento, maquinaria e pessoal para treinamento dos trabalhadores. Destes técnicos, alguns já se encontravam no Brasil, vindos  para as construções das ferrovias ou de outras fábricas de tecidos.

 Guilherme Ralston, por exemplo, após ter participado da montagem da fábrica de tecidos São Luiz em Itu, permaneceu no país e posteriormente, associou-se a Antonio e Augusto de Souza Queirós, em 1875, para a montagem da fábrica de tecidos Carioba, na antiga fazenda São Domingos em Campinas (depois Vila de Americana).

  Arthur d’Sterry, outro exemplo, desponta no cenário ituano após 1877, quando veio a localidade de Salto para gerenciar a Fábrica de tecidos montada por José Galvão. Nesta localidade casou-se, adquiriu imóveis e instalou alguns empreendimentos industriais como uma fábrica de beneficiamento de arroz, denominada Monte Serrat (1878) e em 1880, uma fábrica de tecidos. Em 1896, elaborou a planta e participou do projeto de ampliação da fábrica de tecidos São Luiz, ocasião em que aparece no cargo de engenheiro da Companhia de Estrada de Ferro Ituana (Rossi, 1992:p.80-82)

   Casos idênticos foram registrados também para a instalação de Engenhos Centrais. Os de Porto Feliz e Piracicaba contaram com a participação de André Patureau, representante da Brissonneau Frère, de Nantes, França. Em Porto Feliz foi contratado em 1879, em 1885 encontrava-se como arrendador deste Engenho. Em 1881, Patureau destaca-se como engenheiro responsável pela vinda e assentamento de máquinas destinadas ao Engenho Central de Piracicaba. Consta que Patureau, neste mesmo ano, tenha montado também o Engenho Central de Lorena, com máquinas francesas.

Neste contexto, constituiu o que podemos denominar de uma rede de sustentação que se intensificou  ao longo da segunda metade do século XIX, e que favoreceu consideravelmente o êxito dos projetos fabris, tanto na implantação de fábricas de tecidos, como também  dos Engenhos Centrais, a proporcionar o acesso a tecnologia, serviços de reposição de peças e a presença de  engenheiros e técnicos, que passavam o seu conhecimento de forma itinerante para os empreendimentos fabris que surgiam.

Esta forma itinerante do saber técnico ultrapassa o aspecto meramente mecânico da montagem e manutenção das máquinas.  Passam a influenciar de forma concreta a organização do trabalho nas primeiras  fábricas da Província de São Paulo, num momento em que o trabalho no país estava baseado no  escravo  africano.

A presença de fábricas de tecidos e de açúcar, representavam uma nova alternativa de trabalho para a população livre, antes mesmo da massissa imigração de europeus, sobretudo de italianos, após 1888. Mulheres e crianças eram os elementos constitutivos desse primeiro contingente de operários. O primeiro recenseamento para o Brasil, de 1872, registrou 9.514 mulheres exercendo atividades nas fábricas de tecidos na Província de São Paulo, que possuía então um total de 10.256 operários (Rossi, 1985:p.9).

Nas fábricas de tecidos da região de Itu, , o trabalho feminino estava representado por mulheres   nos serviços da  tecelagem e meninas para a fiação.  Os homens neste trabalho eram empregados para as cardas, fiame e em número reduzido, na  tecelagem.  Meninos  para o serviço de carretéis. Quanto ao trabalho nos Engenhos Centrais, eram basicamente executados por homens e meninos.

A organização do trabalho, neste contexto, passava também por questões de ordem cultural. Muitos desses estrangeiros não conheciam a língua, nem  a realidade local, motivo, para alguns, da não adaptação no Brasil e até mesmo de suicido.

Como exemplo, podemos citar o inglês Guilherme Wilkinson (1877:p.11-13v) que chegou ao Brasil em 1877 através da Casa Importadora do Rio de Janeiro Samuel, Irmãos & Cia. O objetivo, era o de assentar e colocar em funcionamento as maquinarias da fábrica Galvão, de Salto. Ele, não sabia falar o português e nem mesmo conhecia o algodão, como  vem da planta, e sim apenas em fardos, estado em que era enviado à Inglaterra.

Nesta mesma fábrica, em 1878, Arthur D’Sterry implantou o trabalho noturno, num momento em que essa experiência era totalmente desconhecida por Galvão e até mesmo para outros proprietários de fábricas na Província.

O trabalho noturno exigia iluminação, que certamente teria de ser feita por meio de lampiões de querosene - pois a energia elétrica somente chegaria em 1895. O espaço da produção era constituído de um imenso salão, indicado sobretudo para o trabalho diurno, equipado com vinte e oito janelas com ogiva simetricamente distribuída pelas quatro paredes, que favoreciam a entrada do ar e da luz (Rossi, 1992:p.76-77).

O mesmo Sterry, em 1879 aparece como autor de um processo de Notificação contra um operário daquela fábrica. Antonio de Moraes Navarro, que havia retirado do trabalho suas cinco filhas e supostamente espalhado boatos de que alguma parede do edifício estava prestes a desabar. Esta atitude levou Sterry a considerar  o fato, uma espécie de greve. Tendo conciliado as partes o referido processo foi arquivado em Perpétuo Silêncio”.

Este é mais um aspecto da   rede de sustentação, constituída por  estrangeiros, sobretudo ingleses, com uma  cultura diferenciada que trouxeram para o Brasil não apenas a experiência e o saber técnico, mas toda uma forma de organização e de análise do trabalho fabril já de longa dada experimentado nos seus países de origem. Fato este que levou Sterry a caracterizar a atitude de Navarro como “greve, num momento em que este conceito  era pouco ou mesmo desconhecido.

Bibliografia        

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