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Publicado: Sábado, 26 de junho de 2010

O menino de Eduardo Galeano

O menino de Eduardo Galeano
Pai, me ajuda a olhar?

Ainda me lembro das palavras do meu professor de Psicologia dizendo do perigo dos extremos, sobretudo na formação da personalidade. Ter muito ou nada, fazer além ou aquém é igualmente arriscado no reino dos sentimentos... A felicidade e o bem-estar estão no equilíbrio e ainda que este tempo nos imponha tantos excessos, precisamos encontrar o meio termo e com ele conter os extremos. 

Trabalhamos demais. Atropelamos o tempo necessário para criar, pensar e educar. Excedemos o limite do consumismo e embriagados pelo desejo do mais, ignoramos a nossa capacidade reflexiva. E assim, nessa vida louca, de poucas horas, de correria exagerada, de pressa e pressão, cobrança e prazo, penso que nos acorrentamos.

Passamos do ponto e, em algum ponto, perdemos o controle.  Exageramos e entregamos aos jovens um mundo de incerteza, medo e insegurança. Não sabemos mais como ajudá-los, orientá-los, educá-los. Estamos todos perdidos.

A escola se perdeu... A velha didática não suporta mais a velocidade e a quantidade de informação, embora insista na ideia de dar conta de tudo. Os alunos reclamam, mas os professores não escutam: o volume de conteúdo a cumprir fala mais alto. Aulas corridas, explicações apressadas, projetos relâmpagos, livros volumosos e alunos solitários refletem a hiperatividade deste tempo, chamado pós-moderno.       

A pressa domina a vida da escola e ignora o tempo do aprender. O livro de leitura, raramente de literatura boa, é jogado nas mãos dos alunos para que devolvam sua interpretação, poucos dias depois, em respostas a uma prova escrita. Cadê a roda de conversa que ensina o aluno a reconhecer a intenção do escritor e o sentimento ao redor da palavra? Cadê o desenvolvimento da competência de leitura das linhas e entrelinhas? Cadê a recuperação da aprendizagem que ficou no meio do caminho?

Não posso concordar com uma escola também embriagada pelo desejo do muito de nada.    A escola precisa assumir-se como porto seguro, como chão firme que sustenta os passos dos meninos, sobretudo no enfrentamento do monstro assustador, que é o seu futuro. 

Penso que a escola perdeu sua essência. Pesquisas mostram que diretores estão cada vez mais distantes da gestão pedagógica. Muitos deles dizem não ter responsabilidade com o baixo desempenho da aprendizagem. Alguns, ainda, nem são vistos pelos alunos, tamanha distância e ausência da atuação profissional.

Crescer, aprender e amadurecer intelectualmente requer tempo, persistência e paciência. Requer um professor comprometido com o desempenho do aluno e não com a sua vaidade intelectual. Quem nunca ouviu comentários, como: “o professor sabe muito, mas não consegue ensinar...?”

Com um pouco de vontade, muito interesse e bom-senso, algo a fazer ainda é possível.  Basta recuperarmos o sentido da educação, em casa, na escola, que é cuidar das pessoas e “ajudar a olhar”, como pediu ao seu pai, o menino de Eduardo Galeano, com 04 anos de idade, quando viu o mar pela primeira vez.          

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