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Publicado: Terça-feira, 11 de maio de 2004

O Celibato dos Padres

Deixo de lado o tema previsto para este artigo: "Parábolas do Reino de Deus", a que retornarei mais adiante. Os debates da última Assembléia dos Bispos, realizada dias atrás no Mosteiro de Itaici, estão urgindo uma reflexão sobre o celibato dos padres. É assunto que já tratei em diversas oportunidades, por exemplo em meu último livro "A Serviço do Evangelho, do Reino de Deus e dos Homens". No capítulo VII, dedicado a treze problemas de "afetividade e sexualidade humana", três artigos têm os títulos: "O Problema do Celibato dos Padres", "A Culpa é do Celibato?" e "O Fardo do Celibato".
   
   Poderia dar-me por satisfeito ou simplesmente remeter o leitor ao referido livro, comemorativo dos meus 50 anos de vida jornalística, no qual trato, também, de várias questões relativas ao casamento e à família. Mas a ampla divulgação dada pela grande mídia a duas recentes pesquisas do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais, CERIS, do Rio de Janeiro, as esperanças e, ao mesmo tempo, os constrangimentos que resultaram de algumas inoportunas declarações feitas pelo seu diretor, que causaram entre os bispos e presbíteros, aconselham-me a retornar ao assunto. Aliás, o celibato dos padres continua, ano após ano, interessando e incomodando tanto a certos católicos, quanto aos anti-clericais e, até mesmo, a certos escritores e articulistas, cineastas e dramaturgos...
   
   A afetividade e sexualidade dos jovens vocacionados para o serviço do Evangelho, do Altar e do Povo, o comportamento afetivo-sexual dos presbíteros, foi e continua sendo uma das grandes preocupações dos formadores do futuro clero e, no caso dos já sacerdotes, para os bispos responsáveis por sua conduta e fidelidade aos compromissos assumidos, pela dignidade e bom nome de todo o presbitério.
   
   Antes de tudo, um sincero depoimento pessoal de quem já viveu 52 anos de vida como presbítero e bispo. Tendo trabalhado, vivido e convivido com os presbitérios das Arquidioceses de Campinas e São Paulo, das Dioceses de Sorocaba, Valença e Jundiaí, posso atestar tranqüilamente aos leitores, que a absoluta maioria dos nossos padres além de assumirem conscientemente o compromisso de vida celibatária, perseveram na fidelidade ao voto pronunciado no dia do seu diaconato, antes do sacerdócio. Certamente, não lhes é fácil essa fidelidade, vivendo em um mundo mais que erotizado, convivendo, diuturnamente, com adolescentes, moças e mulheres de todas as classes sociais, solteiras ou casadas, não raro armando ciladas aos sacerdotes mais jovens e até aos amadurecidos no ministério.
   
   Confirmando a fidelidade de tantos e reconhecendo a infidelidade de alguns, lembro os resultados da pesquisa do CERIS, feita durante o 10o Encontro Nacional de Presbíteros, ENP, realizado em Itaici em fevereiro deste ano. Participaram do mesmo cerca de 400 presbíteros eleitos pelos 17 mil sacerdotes de todo o Brasil. Entre os resultados da pesquisa consta que "72% dos padres considera a experiência do celibato como realizadora e cheia de sentido".
   
   Impressiona saber que "90% dos informantes concorda que a convivência com as mulheres se tem dado de forma madura e respeitosa", 12% avaliando que "a convivência com elas tem sido difícil pelo risco de envolvimento afetivo". Este risco, aliás, "remoto para 55% dos padres, não é remoto para 35%". A mesma pesquisa assinala que "50% dos padres nunca se envolveu afetivamente com uma mulher... 41% já viveu esse tipo de experiência em sua vida presbiteral" e "16% declarou que a convivência com mulheres foi difícil, tendo tido algum envolvimento afetivo em seu passado".
   
   A mesma pesquisa chegou à conclusão de que "quando os padres passam por alguma dificuldade no campo afetivo, 37% recorre a um sacerdote amigo, 20% a Deus, 8% ao confessor, 6% a um diretor espiritual e 1% ao próprio bispo". Com certeza avançou demais o diretor do CERIS, confundindo "envolvimento afetivo" com "relações sexuais" (Cfr. "O Perfil do Presbítero Brasileiro", CNBB, ano 2004, páginas 17 e 18).
   
   Assim, se o problema da afetividade com alguma mulher realmente existe, um possível relacionamento sexual durante o exercício do ministério pode ser real, porém, para uma minoria dos sacerdotes. Esse é o resultado das pesquisas feitas o que, aliás, bate com os conhecimentos que os bispos temos, convivendo com os nossos presbíteros.
   
   O problema certamente comporta outras considerações. Por que a Igreja continua prescrevendo aos candidatos ao presbiterato o voto do celibato? Quais as suas motivações bíblicas? Que compromissos envolve? Que vantagens traz para os padres do Ocidente a lei canônica do celibato? E, ainda, um possível casamento dos padres seria a superação definitiva de todo e qualquer problema afetivo ou sexual? Esperamos retornar ao assunto, que continua despertando grande interesse da parte de tantos.
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