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Publicado: Sábado, 29 de setembro de 2007

O Buraquinho do Coração

Quando Deus inventou o coração do homem, deixou nele um buraquinho. Foi um ato proposital. Encher esse espaço que falta é necessário para que o ser humano sinta-se feliz. O que é a vida senão a busca da felicidade, consigo mesmo e com os outros? De que vale viver se não for para sermos felizes e realizados? Há algum outro objetivo que valha mais a pena?
 
Cabe aqui explicar que não é o caso de encher esse buraquinho com as coisas de Deus. Calma, leitores e leitoras. Não estou cometendo heresia. Fiéis que somos, suponho que todos entreguemos ao Senhor não apenas esse pequeno espaço que falta a ser preenchido, mas sim todo o nosso coração. Toda a nossa vida, o nosso pensamento, o nosso existir, pertencem Àquele que nos criou. Seria no mínimo ingratidão oferecer ao Pai apenas um reles buraquinho do nosso coração.
 
Mesmo assim, há os que preenchem o buraquinho do coração com as coisas de Deus. Simplesmente resolvem que é melhor assim. Feito isto, passam a dedicar-se exclusivamente ao Senhor. Trabalham incansavelmente e dedicam cada segundo de suas vidas a fazer aquilo que o Pai nos pede, amando-se uns aos outros como a si mesmos e preocupando-se mais com a felicidade alheia do que com a própria. A alegria de quem serve a Deus é a honra de poder servir.
 
Nessa árdua tarefa, muitos pretendem encher esse buraquinho do coração com porcarias. Bebedeiras, drogas, muita badalação. Porém essas coisas todas não se fixam no coração do homem. Elas se esvaem, fogem de tudo o que possa parecer sentimento e nos abandonam. O resultado é que a solidão reaparece e o buraco continua no coração. Infelizmente são necessárias inúmeras experiências para se chegar a essa conclusão, resumida em algumas linhas.
 
Como alguém que se acostuma com a visão de uma favela, há quem simplesmente se acostume com o buraquinho do coração. Sabe que ele está ali, sabe que o certo seria preenchê-lo, mas não quer nem saber. Desistiu da tarefa, por motivos vários. Ou então não quer se dar ao trabalho. Prefere a certeza da sensação do vazio (que já conhece) do que a incerteza de algo inesperado que possa acontecer no caminho.
 
Essas pessoas não sabem, mas ao se acostumarem ou mostrarem indiferença para com esse buraquinho que falta preencher, acabam desistindo da própria felicidade. Sem perceber, podem ficar frustradas ao constatar que a felicidade acontece para os outros e não para ela. E a frustração pode gerar a inveja, aquela mesma que Caim teve contra Abel. Aquela mesma que Lúcifer teve contra Jesus. E da inveja brota a maldade, que também se aninha no coração humano, podendo preencher todos os espaços e não só aquele pequeno buraquinho.
 
Como ninguém é feliz de verdade sem se contentar com a felicidade dos outros, desse coração tomado pelo mal podem surgir as mais incríveis atitudes, infelizmente para pior. Ao invés de trabalhar para encher o buraquinho do próprio coração e ser feliz, muitos passam a trabalhar para esvaziar o coração alheio a fim de tornar os outros infelizes também. Algo do tipo “se eu não posso ser feliz, ninguém poderá ser”.
 
Há casos e casos. Entre eles, os daqueles que percebem que precisam da ajuda de alguém para serem felizes. Preenchem o buraquinho do coração com a amizade sincera de inúmeras pessoas e também (por que não?) de uma pessoa especial. Encontrar essas pessoas e saber cultivar essas amizades e sentimentos é parte do trabalho de preservar a própria felicidade já conquistada, além de angariar aliados na grande batalha de ser feliz diariamente.
 
Ser feliz não é fácil, mas que outra opção temos? Ou alguém em perfeito estado de consciência pode concordar com a infelicidade? Foi-se o tempo daquela linha de pensamento determinista, que “aceitava” as coisas ruins como desígnio divino. Deus é o primeiro a desejar a felicidade de todos nós e nos criou somente para isso. O que ocorre é que muitos esquecem de dar ouvidos ao Pai em busca da felicidade, e aí...
 
Amém.
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