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Publicado: Quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Música para a alma

Música para a alma
Uma das primeiras lembranças da minha infância é da Avó cantarolando enquanto lidava na cozinha. Tinha uma voz bonita, afinadíssima, cantava de tudo, de Carlos Gomes a músicas da igreja e as músicas de seu tempo, brasileiras, brasileiríssimas.
 
Com ela, com Vó Véia e com tia Minda aprendi cantar as melodiosas cantigas de roda, as músicas das procissões e as ladainhas das rezas.
 
Lembro também da vitrola, um grande móvel de madeira que abria a tampa para revelar o mecanismo sonoro, com um braço que era capaz de segurar vários discos, que iam caindo no prato, um depois do outro. Na parte de baixo se guardava a coleção, em prateleiras meticulosamente organizadas.
 
Eram discos pesados e delicados, um descuido e o tal ficava em frangalhos, impossível recuperar. Um, especialmente, me marcou muito, me dava uma tristeza enorme quando Vicente Celestino proclamava numa voz lacrimosa que “tornei-me um ébrio e na bebida busco esquecer aquela ingrata que eu amava e que me abandonou”. Era de cortar o coração.
 
Em compensação as tardes de domingo (acho que era aos domingos) tornavam-se encantadas quando tinha banda no coreto da Matriz. A gente punha roupa arrumadinha e atravessava os poucos quarteirões até a praça numa pressa danada, para não perder um número que fosse, uma festa onde se encontrava toda a cidade.
 
Os mais velhos se aboletavam pelos bancos e a criançada podia correr a vontade, se entupir de pipoca e cocada, os moços no footing, em voltas intermináveis, moças para um lado, rapazes para o outro.
 
Quando fui considerada menina moça, ganhei minha própria vitrola, um modelo portátil, que carregava para todos os cantos, com a coleção de disquinhos coloridos, Macaco Simão, Pedro e o lobo, Dona Baratinha, que com o passar do tempo, foram trocados por valsas de Strauss e mais tarde pelas músicas da moda, trocando discos com as amigas, aumentando o repertório das festas nas garagens.
 
Todas essas memórias foram despertadas pela empolgação com um acontecimento muito especial, que começa a surgir nesta noite: O Museu da Música – Itu.
 
Uma iniciativa que ainda dá seus primeiros passos, mas de grande significado para preservar algo muito maior que as lembranças de cada um de nós: a história da música e em particular a feita por nossa gente, em nossa terra.
 
Todas as manifestações musicais estarão presentes, o batuque negro, os dobrados das inúmeras bandas que já existiram, as canções das serestas, a verdadeira música caipira, as belíssimas músicas sacras dos compositores ituanos e que estão espalhadas e esquecidas pelos armários empoeirados.
 
Tudo isso agora vai ter um espaço para ser apreciado, visto e ouvido. Porém, o objetivo maior é que o Museu da Música possa vivenciado, que toque os sentidos das pessoas, despertando não só memórias, mas também sirva como um lugar onde todos, principalmente as crianças, possam se descobrir através da música e (re) construir uma parte importante da cultura da nossa gente.
 
De minha parte, como sei que as contribuições são bem-vindas, já consegui, de um amigo querido, a doação de discos antigos, aqueles de vidro, com registros raros de música brasileira.
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