Música da alma
Um dia me disseram que a felicidade não é uma condição permanente, ao contrário, é feita de pequenos momentos de plenitude, de conquistas e vitórias que redimem o desejo perseguido com determinação.
Me disseram que a felicidade é construída dia a dia e, ao fim, a gente vai saboreando-a devagar, como se assim ela pudesse durar mais. A gente fica respirando leve, falando aos sussurros com medo perder algum detalhe, deixar escapar o fugidio instante em que a magia se processa.
Isso, que estou chamando de felicidade, é o brilho da alma iluminada que contamina o quanto está a sua volta com beleza de sonho realizado.
A capacidade de criar tais e tantas preciosidades é dádiva de poucos, que visceralmente ligados a suas verdades mais profundas, expõem de peito aberto os desenhos da alma em cores encarnadas e em sons cristalinos.
Saborear esses momentos é um presente que se tem que receber com a mesma generosidade com que foi ofertado. Perceber que ali pulsa, incessante, o desejo de tornar melhor e mais bela a vida.
É afirmação de grandeza, presente nos gestos largos, de quem ousa querer mais. De quem ousa compartilhar a paixão pela beleza, a paixão pela arte e luta por isso, a despeito da mesquinhez reinante.
A grandeza de propósitos que arrebata almas ganha força durante a trajetória e vislumbra, para além do humano, o eterno.
Um dia me disseram também que as casas têm alma, essas casas antigas, de grossas paredes, amplas salas, portas e janelas já marcadas pelas mãos de muitas vidas, sobrepostas nas camadas da memória que encobre histórias sem fim.
A alma dessa casa ressurgiu em toda sua glória, reacendeu em cada um naquela sala de imensas proporções, a mais profunda emoção, não apenas pela música, pelos trajes ou pelos belos poemas. Tudo junto e costurado em delicada teia, tornou-se durante algumas horas, a confirmação do quanto pode a vontade e o talento.
A alma ituana dessa casa emoldurou, com seus duzentos e cinqüenta anos, o encontro entre o passado e o futuro.
O passado, esmaecido por entre as camadas de tinta, testemunha do caminho aberto com tenacidade por intrépidos ancestrais, que imóveis em seus retratos escuros, continuam a lembrar que há, sim, um destino que exige ser cumprido.
E o futuro que já está sendo construído por gente de alma generosa e com raízes grudadas ao que há de mais bonito e significativo na história que nos coube como herança e que é mister passar adiante.
Dar novo alento às almas das casas mais que centenárias, à nossa cultura forjada com tanta maestria nesses quatrocentos anos, é uma tarefa que requer mais que vontade, requer clareza de idéias e vontade inabalável. O Sarau Ytuano foi uma fagulha que, estou certa, vai incendiar cada vez mais almas.
Um dia me disseram que felicidade não é um copo de vinho ao pôr do sol em Veneza.
Realmente não é. Felicidade é chá de erva cidreira na varanda da Chácara do Rosário.
Bravo Maestro!