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Publicado: Quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Montanha-russa

Sempre tive pavor de montanha-russa. Pavor! Nas vezes em que ousei andar em uma, já na primeira subida estava arrependida. Quando chegava ao primeiro cume, e de forma abobalhada dava uma rápida espiada no parque, lá embaixo, pequenininho, inevitavelmente me perguntava "o que é que eu estou fazendo aqui?". Mas não tinha tempo para respostas: o carrinho destrambelhava pelos trilhos, eu cerrava os dentes, travava os músculos e só voltava a respirar ao final do percurso.

Passava dias com o corpo doendo - como se tivesse feito academia, depois de meses parada. Ou como se tivesse levado uma surra, sei lá. E isso tudo porque a primeira descida já me faz contrair pernas, braços, tudo. No percurso só me movo, involuntariamente, com os espasmos que a adrenalina causa.

A verdade é que aquele sobe-e-desce me deixa em pânico. Quando tudo parece que vai se manter estável, lá vem mais uma descida, mais uma subida, uma curva fechada, um looping. Todos se divertem, riem, levantam os braços. Eu fico quieta, segurando firme as traves de proteção, com os nós dos dedos brancos, tamanha a força que faço. Não fico quieta por opção; apenas não consigo me mexer ou esboçar outra reação além do medo.

Traiçoeiras são aquelas câmeras que alguns parques instalam, quase sempre no trecho de maior tensão. No fim tentam empurrar aos usuários fotos que refletem a reação de cada um. Para mim, essas fotos só não são piores que as terríveis 3x4. 

O bizarro nisso tudo é que mesmo sabendo que lá no alto vou me arrepender, e que ao fim vou jurar nunca mais andar em uma... há sempre o risco de em uma visita a um parque de diversões eu me enfiar na fila que tem como destino um tenebroso frio na barriga. E o que me faz andar nesse tipo de brinquedo, mesmo não apreciando, é mais ou menos o mesmo que me motiva a matar uma barata, por exemplo. Tenho medo, mas de vez em quando é bom mostrar para ele quem é que doma quem.

Isso não significa, claro, que enfrento esse tipo de experiência sempre. Faz quase 15 anos anos que eu não ando em uma montanha-russa e neste ano matei uma única barata - e só o fiz porque minha salvadora e matadora oficial estava no banho.

Não é fácil encarar os medos. Não é fácil matar baratas! Não é fácil andar em montanha-russa. Como também não é fácil lidar com o sobe-e-desce constante que a vida nos impoe. E nessas horas é inevitável não lembrar de uma frase que ouvi, inúmeras vezes: "não é fácil, mas também não é difícil". Oxalá, graças a Deus!

A tranquilidade de uma reta na "estrada da vida" nos traz estabilidade. E só! Quando as coisas estão encaixadinhas, nós nunca nos esforçamos para mexer em algo. Mudar para que, se está tudo tão bom?

Aí, de repente, acontece uma coisa ou outra e muda tudo. Geralmente acontecem situações que reprovamos, as chamadas "mazelas da vida". São situações chatas, incômodas, tristes, até. Muita gente reclama, esbraveja, reprova. E quase sempre não se dá conta de que só após o acontecido é que determinados pingos são postos nos is.

Uma vez, quando tive a maravilhosa oportunidade de conhecer a região de Porto Seguro, visitei uma praia que tem um diferencial com relação às outras que conheci: chega um momento no dia em que a maré baixa tanto que enormes bancos de areia se formam, dividindo o mar em dois. Tive o prazer de caminhar por um desses bancões, dando graças pela oportunidade. Não fosse a maré baixa, aquela experiência nunca teria acontecido.

Muitas são as vezes que a maré da vida baixa, e só assim a gente consegue trilhar pelo inimaginável. Como também são inúmeras as vezes em que temos a sensação de vivermos em uma montanha-russa: sobe, desce, sobe, desce... e mesmo que tenhamos medo, no fim sobrevivemos à experiêcia. E chamo atenção para isso: sobreviver é importante, mas o essencial mesmo é absorver a experiência.

Sobrevivi a alguns terremotos internos, e hoje percebo que, não fossem as pequenas quedas, muito do que peguei do chão ao cair não teria aqui comigo. O mesmo ocorreu quando, com total ausência de gravidade, levitei e colhi, lá de cima, ensinamentos preciosos. Chão e céu foram primordiais para mim, para a minha trajetória, e para o embasamento dos meus pensamentos.

As mudanças surgem (algumas a cavalo, outras a jato) e lutar contra isso é nadar contra a maré: desgasta, desperdiça energia e coloca a nossa integridade em risco, perigando da gente se afogar. O ideal é que não se agarre em nada, e permita que o rio siga seu curso. Uma pedra não necessariamente vai interromper esse trajeto, como pode perfeitamente recriar a paisagem.

Com isso, os acontecimentos tidos como ruins são o que nos motivam a mudar, a agir, a encarar. Sempre chega a hora de se ajustar os ponteiros, afinal de contas.

Dá medinho, não nego, mas depois que a poeira abaixa, que tudo se assenta, é possível ver não somente a luz no fim do túnel: a gente simplesmente sai dele. Nada que o tempo (ah, o tempo!) não cure e cicatrize.

Bem-aventurados aqueles que, com merecimento, percebem que filmes bons saem de cartaz, sem que isso signifique que outros melhores deixarão de vir. Tudo tem começo, meio e fim e diante disso, a palavra de ordem é adaptação. As situações mudam, a rotina se transforma, a vida se recicla e se renova constantemente.

Não permita que o medo empaque, que a decepção freie, que a mágoa domine. É possível tirar lições de todas as experiências que nos são apresentadas. É possível sair bonito na foto da montanha-russa! 

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