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Publicado: Segunda-feira, 9 de outubro de 2006

Missionária ao interior do Pará

Dos dias 18 a 25 de setembro, estive visitando nossa missão na Diocese de Marabá, interior do Pará. Lá, em acordo com o bispo local, dom José Foralosso, assumimos duas paróquias: São Francisco, em Nova Ipixuna e Santa Maria, em Goianésia do Pará. As cidades têm aspectos de sub-desenvolvimento, carentes de saneamento básico, de boas escolas e muitas outras coisas. As casas, quase todas, são feitas de madeira, com aspecto simples, com exceção de algumas de alvenaria entre as quais se destacam mansões de pessoas abastadas, geralmente proprietárias de grandes fazendas ou comerciantes.

A zona rural é ainda mais preocupante. No meio de imensas extensões de terras, encontram-se algumas poucas famílias que vão resistindo à expulsão do homem do campo pela ganância dos ricos que querem sempre mais aumentar seus domínios. Estas famílias pobres habitam casebres de pau-a-pique ou madeira e vivem da pequena agricultura, do extrativismo e, infelizmente, do serviço de desmatamento. Um determinado senhor me disse: aqui o povo vive do barulho da moto-serra.

Eis os dois grandes e cruéis problemas da Amazônia: as escandalosas extensões de terras nas mãos de poucos e o assustador desflorestamento. Encontrei centenas de caminhões transportando imensas toras de madeira. Perguntei a um senhor após a missa, em uma das capelas rurais, qual era, em média, o número de caminhões madeireiros que por ali passavam por dia. Ele me respondeu ser de 20 a 30, o que equivale a cerca de um por hora. Estamos falando de uma única e relativamente pequena estrada de 100 km. Imaginemos o que se dá em todo o Estado do Pará e na inteira Amazônia há anos! A madeira é, relativamente barata ali e vira "ouro" à medida que chega às regiões mais desenvolvidas do país.

O homem que trabalha na derrubada de árvores tem pouca expectativa de vida, pois o serviço pesado em geral lhe acarreta problemas sérios de coluna que o impedem de prosseguir no trabalho, ganha pouco, alimenta-se mal e contrai outras doenças.

No aspecto religioso, vi um povo à mercê de numerosas seitas que vão se multiplicando a cada dia, que vivem, em geral, mais da pregação contra a fé católica do que propriamente da mensagem de Jesus Cristo. Nós católicos - seja pela carência de padres na região, seja por tentativas de métodos pastorais alternativos que se revelaram inadequados - temos perdido grande número de fiéis para estes grupos religiosos e somos desafiados a evangelizar adequadamente aqueles que ainda não perdemos. A Igreja católica deverá, se quiser ser fiel à sua vocação missionária, ir atrás dos desanimados e dos que a abandonaram por falta de quem os motivasse a permanecer fiéis. É doloroso, mas é preciso constatar: para cada templo católico, há naquelas cidades hoje, ao menos sete templos de outras religiões.

No âmbito paroquial, boa parte dos casais não recebeu ainda o sacramento do matrimônio, muitos jovens ainda não são batizados e a maioria não foi crismada. Há carência de catequistas e as poucas que há anseiam por uma formação mais adequada para o seu ministério. Há falta de consciência eclesial, embora se note um forte desejo de Deus na maioria das pessoas e um consolador engajamento de um bom grupo de fiéis nas sedes paroquiais.

Nestas duas paróquias, estão nossos padres José Luiz Nascibem, em Nova Ipixuna e Venilton Calheiros, em Goianésia do Pará. Cientes desta realidade desafiadora, movidos pela caridade de Cristo, se dedicam corajosamente ao serviço evangelizador. Observei que suas atividades são divididas em duas partes bem distintas, semanalmente. De segunda a sexta-feira, permanecem somente na cidade, atendem o povo, visitam famílias, vão aos doentes, fazem reuniões, preparam leigos, organizam o necessário para a liturgia, trabalham em material catequético em seus computadores, atendem aos aspectos administrativos e financeiros das comunidades. Dedicam tempo para a oração e reservam a segunda-feira para o justo descanso.

Sábados e domingos são uma verdadeira, mas gratificante, maratona para atender às várias comunidades. Geralmente, fazem viagens para duas comunidades rurais no sábado e duas no domingo e ainda uma ou duas comunidades urbanas no domingo. O centro de tudo é a celebração eucarística, cume e fonte de toda a vida pastoral. Atendem confissões, fazem batismos, casamentos, preparam ministros e acompanham a catequese.

Em Goianésia, uma esperançosa iniciativa foi assumida com os jovens. Realizou-se o primeiro curso de evangelização juvenil, com o método "Segue-me", oriundo de Brasília. Já um grupo de mais de 60 rapazes e moças formam força evangelizadora e vão se integrando no serviço pastoral. Prepara-se para se realizar o primeiro Encontro de Casais com Cristo (ECC). Padre Venilton está compondo um método de catequese para o meio rural que promete ser de grande utilidade para a região.

Notei que um momento importante para a missão são os funerais. Todos passam pela Igreja e muitos velórios são realizados no interior dos nossos templos. Foi me revelado que até mesmo muitas pessoas que foram para outros credos, ouvem a pregação de nossos padres nestas ocasiões, apreciam e repensam a fé.

Entre as observações que pude fazer a cada um dos nossos missionários, sugeri-lhes várias coisas, entre as quais a realização de celebrações diárias nas casas com a participação dos vizinhos, à semelhança dos primeiros cristãos, o que resultará também na aproximação das famílias para motivá-las à vida eclesial e ver suas reais necessidades e carências.

Alguns testemunhos do povo me encheram o coração. Talvez o mais expressivo foi o que ouvi de um senhor à praça da matriz: nossa paróquia parecia uma terra seca, com a chegada deste padre, foi como que uma chuva boa que veio umedecer nosso chão; agora tudo está reverdecendo. Quer razão melhor para dizer que acertamos em cheio de assumir este projeto missionário?

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