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Publicado: Segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Minha Primeira Viagem à Índia

A primeira emoção foi sobrevoar o deserto de Thar. O avião voava a 900 km por hora e já havia quase meia hora de areia, às vezes clara, às vezes avermelhada, mas, por certo, sempre escaldante. Num dado momento, um oásis! Que sensação indescritível. Reagi quase como se estivesse caminhando lá embaixo, sedento. Era só um tufo de pequenas palmeiras e grama verde, mas... que imagem bonita e tão rica em vida, comparada com aquelas areias estéreis e inclementes.
 
Por vezes aparecia um povoado em torno de um oásis, outras vezes sem ele. Dava para enxergar as trilhas de camelos, marcadas na areia mais dura, como verdadeiras estradas, tão longas que perdiam-se no horizonte sem um cruzamento sequer. Todos já vimos isso em fotos ou filmes, mas estar ali em cima, era outra coisa. Nas rarefeitas aldeias, aquela gente isolada do mundo, vivia de quê? Se não havia agricultura, água, matérias primas? Viveriam só de pastorear cabras, a um calor de 50oC de dia e 10 negativos à noite, e nunca pensaram em sair dali?
 
Começaram, então, a aparecer nacos esparsos de vegetação desértica, amarelada. Ao longe, uma visão inesquecível: o fim do deserto. Eu imaginava que os desertos fossem acabando pouco a pouco, com a modificação gradativa do tipo de solo. No entanto, visto lá de cima era impressionante. Aquele deserto acabava de repente, numa linha bem demarcada, onde as areias bruscamente paravam e tinha início outro tipo de solo. Vegetação verde, estradas asfaltadas e uma incrível multiplicidade de vilarejos marcava o início da, assim chamada, civilização.
 
O oposto dessa experiência foi um outro vôo, sobre os Himalayas. O avião estava poucos metros acima das geleiras e uma senhora perguntou ao comissário de bordo, por que estávamos voando a tão pouca altitude.
 
‑ Não estamos voando baixo, madame. As montanhas é que são muito altas!
Que coisa linda! Milhares de quilômetros de montanhas cobertas de neve, enrugadas, comprimidas umas contra as outras, algumas altivas, destacando seus picos majestosos. De um lado batia o sol e do outro havia sombra, num contraste de cores enriquecido pela dinâmica da aeronave, proporcionando um espetáculo inimaginável. E saber que, tal como no deserto, não havia quase ninguém lá embaixo, a não ser o yeti e uma ou outra aldeia encravada num vale. E estes, como será que sobreviviam ali? O ser humano é mesmo obstinado!
 
Fui despertado do sonho quando o comandante avisou que íamos pousar. Mas onde? Só havia montanhas geladas. Não enxergávamos o menor indício de campos de pouso, ainda mais para um boeing.
 
Não precisou descer muito. Bastou desviar de alguns picos mais impertinentes e penetrou num vale que se descortinava à nossa frente, surgido não se sabe de onde, por entre as montanhas. Começou a descrever uma espiral descendente, afundando-se na depressão, até que pude perceber uma cidade lá embaixo. Para aterrissar foi necessário mergulhar e descer numa pista tão pequena que até um velocípede teria dificuldade de deter-se. O avião freiou e estancou diante de uma encosta gelada. Todos aplaudimos espontaneamente a habilidade do Comandante.
 
Aqueles pilotos são extremamente talentosos. Entretanto, por via das dúvidas, atualmente prefiro evitar tais aeroportos: desço em Delhi e depois estudo o melhor meio de chegar nas demais regiões.
 
Foi uma grande emoção quando os trens de aterrissagem do avião tocaram o solo da Índia. Eu estava mesmo na Índia, aquele país legendário do qual ouvira falar desde criança. A Índia dos filmes de aventura, dos contos fantásticos e dos livros de Yôga. A Índia dos faquires e dos marajás, dos elefantes e dos templos. E eu estava lá!
 
Dali para a frente foi um misto de emoções e decepções, alegrias e tristezas. Afinal era como devia ser, pois a Índia tornou-se conhecida como o país dos contrastes. Primeiro, fiquei um pouco embaralhado com a confusão à saída do aeroporto. Todos os indianos são tão solícitos que um quer levar a mala, outros querem providenciar o taxi e mais uns quantos disputam para indicar o hotel. Dei azar. Aceitei a indicação do mais simpático e acabei num hotel tão distante do centro de Nova Delhi que parecia outra cidade. No dia seguinte mudei-me para um melhor localizado e bem menos dispendioso. Se um dia você for a Delhi, e não puder ir comigo, é aconselhável ficar em algum hotel próximo a Connaught Place e Janpath Street, onde estão situadas quase todas as coisas mais importantes de Nova Delhi para o viajante: companhias aéreas, agências de turismo, o Tourist Office do Governo, restaurantes, cinemas e um variadíssimo comércio de artesanato, tecidos, roupas, estatuetas, pinturas, incenso, instrumentos musicais, henna, japamalas e tudo o que a sua imaginação nem conseguiria pressupor. Livros, não. É melhor comprá-los em Velha Delhi, na livraria Picadilly Circus.
 
Adorei a comida da Índia desde o primeiro instante e, como eu, todos quantos a conheceram. Além de saborosíssima, pode-se aceitar o que vier, pois o país é vegetariano e não há perigo de a comida vir com carnes, peixes ou aves. Por outro lado, se o paladar é superlativo, precisei me adaptar a um pormenor. Tudo vem hipercondimentado com cominho, cravo, canela, cardamomo, coentro, curry e chili. Este último é mais ardido que a própria pimenta baiana. Como ainda não estava habituado a comidas tão ricas em especiarias, no segundo dia pedi uma salada de vegetais crus, pois assim, pensava eu, viriam seguramente sem tempero. De fato, recebi uma salada sem sal, sem azeite e sem tempero algum. Comecei a comer e gostei, apesar da falta total do paladar exacerbado dos condimentos. Com apetite, localizei, lá no meio, uma vagenzinha verde. Simpatizei com a cara dessa vagenzinha tão inocente. Mastiguei e engoli. Era o próprio chili! Nunca na minha vida tinha tido uma sensação igual àquela... parecia que ia morrer. Imaginei que beber ácido sulfúrico não devia ser pior. Salvou-me uma garrafa de refrigerante, que sorvi de uma só vez.
 
Tendo passado por esse batismo de fogo, segui no meu "curso de Índia". Nos primeiros dias, era pôr o pé na rua e constatar que mais uma falsa imagem ruía. A primeir
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