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Publicado: Quarta-feira, 19 de julho de 2006

Lições ao contrário

Recentemente eu ouvi da minha prima, que tem 25 anos, uma história de arrepiar. Ela me contou que tem uma lembrança que a acompanha desde menina, de uma situação que viveu na escola, quanto estava na quinta série. Uma história que nunca esqueceu.

Na aula de laboratório, eles tinham por hábito fazer experiências e depois as provas, com perguntas sobre as experiências. Uma das questões era a seguinte: “Como a gente prova que o fogo precisa de oxigênio para ser alimentado?”.

Minha prima era escoteira e estava acostumada a fazer fogueiras. Buscou a chave da questão em seu repertório vivencial e lembrou que eles sempre abanavam o fogo para aumentar sua chama. Não teve dúvidas e foi esta a sua resposta. Certo? Errado!!!! A professora marcou um grande X na resposta. Afinal, no laboratório, qual era a experiência? Se colocasse um copo em cima da chama, ela apagava. Era essa a resposta correta. A única resposta correta.

O curioso é que a minha prima nunca entendeu porque estava errado. E infelizmente não foi em frente descobrir os porquês. Mas essa história ficou gravada por tanto tempo que ela me contou 15 anos depois.

Fiquei pensando em muitas coisas.

Pensei no poder do adulto de qualificar de certo ou errado as experiências das crianças. E no quanto eu mesma posso estar fazendo isso com meus próprios filhos. Quanto poder!

Pensei no quanto as crianças de hoje ainda estão aprendendo — por incrível que pareça — enclausuradas em sistemas fechados que não admitem alternativas criativas e inovadoras. E quantos pais ainda acreditam que é essa a educação que prepara o ser humano para se dar bem na vida!

Pensei no gigante mundo interior desses estudantes, seres em formação, com tanto desejo de conhecer e aprender, mas tanta dificuldade de ser compreendido e reconhecido.

Pensei em mim, nos meus hábitos, dificuldades e crenças. Penso que chegou a hora de começar a escrever em nosso caderno de trás para frente, de baixo para cima, de dentro pra fora. Não dá mais para nós, os adultos entendidos, mantermos a crença de sabedores do universo. É só observar: as crianças estão trazendo o novo, estão nascendo em outro patamar de sabedoria e nós estamos fazendo de conta que nada está acontecendo. Continuamos dizendo que “abanar o fogo para aumentar a chama não prova que o fogo precisa de oxigênio para ser alimentado”.

Percorremos os corredores estreitos do nosso sistema de crenças e valores e achamos que somos detentores das verdades absolutas.

Essa história acordou minha atenção como mãe e como educadora de meus filhos. Olharei diferente para as respostas que não se enquadram no que eu sei ou acredito. Ficarei mais atenta às experiências vividas por meus filhos na escola. Afinal, o tamanho de nossa alma é muito grande para se conformar com espaços tão reduzidos! Se a vida fosse só isso, nem sonhos a gente teria...

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