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Publicado: Quinta-feira, 27 de julho de 2006

Grandeza, miséria e conscientização

Inevitávelmente chocado pela repetida tragédia, a fratricida devastação de vidas e bens travada entre irmãos da mesma estirpe, ambos descendentes do profeta Abraão, origem, ação e resultado da motivação, grandeza ou condescendência do amor, logo exacerbado em desmedido amor próprio. Agar e Sara por amor geraram. Uma e outra por obediência a postulados vigentes então, embora diferentes. O amor de Sara não foi menor que o amor da Agar escrava. Estavam as duas convencidas da necessidade de uma descendência, obediência e da respectiva transcendência. Amor generoso guindado afinal pela limitação da dimensão humana, à sua negação, à resistência da bondade expressiva desse precioso postulado, transformando-o no tempo em ódio e intransigência, no ensoberbecer de uma natureza sempre enrustida de afirmações, exageros e crenças, a tentar afirmar-se no ego de um único prisma e interpretação divina, sem superar entretanto frustrações ou expectativas de primazia, de egos enaltecidos, exaltados e feridos, privilégios e poder, cada um afirmando-se mais, mais e mais, ser o mais fiel, o mais legítimo portador dos desígnios da fé e do seu Deus, do Deus de desígnios insondáveis que interferem entretanto sub-repticiamente nos acontecimentos hodiernos, mas que se fundamentam subjetiva e atavicamente em fatos humanos concretos, passados há milhares de anos. Abraão, Ismael, Jacó cognominado Israel, Agar e Sara, disputando legitimidade, autoridade e primazia na vontade de Deus e seus desígnios em pleno século 21, através de raptos, terrorismo, bombas, projéteis, foguetes e tanques de guerra. Como o amor e a bondade divina original, pode justificar intelectivamente tal instrumentalidade para a sua própria concretização? Será a natureza humana sempre tão propensa à inação positiva quanto construtiva, reagindo contrariamente ao perdão e à compreensão inteligente ante fatos aparentemente lamentáveis ou inexplicáveis, que não têm reversibilidade?

Esta nova tragédia da invasão do Líbano, país soberano sem soberania real atual alguma sobre o que acontece com as facções ideológicas ou políticas que se arregimentam, abrigam e instalam em seu próprio território, a seu belo prazer, à decisão do seu simples querer ou da oportunidade de impor e treinar radical terrrorismo, processo realmente difícil de entender, justificar e aceitar como plano divino construtivo de amor e justiça, grupos impregnados e cultuadores de preconceitos, prevenções e temores de séculos e séculos, em que a luz do esclarecimento de uma sociologia moderna baseada em conceitos atualizados de laicismo e modernidade, permitam viver e deixar viver o germem de ideais democráticos e de humanidade, na convivência previsível, sã e ordeira entre cidadãos cônscios de sua cidadania e obrigações, traz-me simultaneamente à memória , guardadas as devidas proporções, sobre esta temática e correlação do exagero e extrapolação das convicções preconceituosas, intransigentes, intolerantes, construídas em milênios e séculos de supostos “direitos hereditários”, patriotismos e gestas territoriais, épicos, sociológicos, étnicos ou espirituais, incorporados por ideologias, tantas vezes epidérmicas, mal deglutidas e embaralhadas interpretativamente no amor divino ou fatalismo histórico, fazendo-me lembrar interessante e inspirado artigo crítico do professor Marcelo Coelho publicado na Folha Ilustrada do diário de São Paulo de 27 de Abril do p.p., sob o título “Grandeza e miséria das piadas de argentino”, que sob um cariz ligeiro e humorístico relata a seriedade e realidade do problema do preconceito e da intolerância. Assim talvez comecem antipatias que se alastram incontrolavelmente até a dantescos episódios nefastos de foguetes ricocheteando sobre cabeças humanas e à incrível convicção dos “homens bombas”, que se matam e matam inocentes por amor divino. O referido artigo despertou-me comentário que abaixo reproduzo, o qual enviei ao professor Marcelo, a que o mesmo correspondeu em simpática mensagem eletrônica apreciativa de agradecimento com consideração e apreço.

Por achar interessante o ponto de vista em que se ressaltam aspectos preconceituosos atribuídos a outros e que afinal são provável e certamente também nossos, que levam fatalmente a generalizações e conseqüências irracionais e injustas e até à exacerbação de confrontos bélicos desproporcionais, e aproveitando para trazer a temática dantesca e absurda daquele pedacinho do Oriente médio, antes pacífico, para aspectos não tão dantescos no presente do nosso território e adjacências, mas que por laborarem potencial erro grave de discriminação e intolerância, poderão, quem sabe, ser motivo potencial no futuro de assoberbante e incontrolável magnificação ou radicalização de conseqüências imprevisíveis, reproduzo abaixo o meu comentário e ao final o respectivo artigo motivador do professor Marcelo Coelho para vosso conhecimento:

Prezado senhor professor Marcelo Coelho:

Em torno ao infeliz episódio e agressão dos jogadores de futebol, Leandro Desábato e o popular Grafite, de conotação preconceituosa, gostei de ler, na Folha Ilustrada de 27 de Abril p.p., sob o título “Grandeza e miséria das piadas de argentino”, a sua pragmática análise de fundamentada, lúcida e perspicaz acuidade, sobre os exagêros e consequências às magnificadas, espontâneas e sem dúvida indesculpáveis, ofensas proferidas. Sobretudo interessante é sua explicação sociológica sobre argentinos, brasileiros, negros, etc, em que busca razões para o sub-reptício ódio não confessado ou preconceitos discriminatórios que se criam, entre massas de povos e nações, as mais diversas. São ódios, antipatias e ojerizas, oriundos de um sub-consciente culturalmente ainda imaturo quanto a civilidade e civilização é cada vez mais global, mas na realidade em alguns lugares e circunstâncias ainda arraigada e atada a práticas do passado, insipiente e caseira, conseqüência evidente de conceitos preconceituosos e estereotipados que se formaram e formam ainda, e como se formam, nos alimentados egos, geralmente incultos ou superficiais, embora disfarçados de inegável humor da populaça de qualquer país de 1º, 2º , e 3º mundo, (ou de quantas classificações de mundos queiramos), por razões que o amigo perfeitamente bem analiza ou sugere: as que têm origem provável e principalmente no ódio ou repulsa cumulativa ao que sente o cidadão frustrado por alguma escondida ou inconsciente razão, insuficiência ou insatisfaç&at

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