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Publicado: Terça-feira, 28 de dezembro de 2004

Focas sim, crianças não

Os que estão à frente das Sociedades Protetoras dos Animais podem ficar tranqüilos. Ganharam a batalha. Hoje, em todo o Ocidente “cristão”, as focas, os leões-marinhos, as tartarugas e os micos-dourados estão super protegidos e interessam mais a muitos homens e mulheres que as crianças. Quem não se lembra do esforço para salvar uma baleia encalhada dias atrás em nossas praias? Quem ignora que a grande bandeira da bela Brigitte Bardott é a defesa dos animais, depois do filme “E Deus Criou a Mulher”, anos após visitar e descansar nas praias de Búzios?

O que se faz para salvar um urso panda na China e mundo afora, impressiona a qualquer um. Peixes, aves e quadrúpedes em geral estão merecendo, nos dias de hoje, o empenho de muitos biólogos e gente inteligente na Europa e entre nós. Meses atrás lia uma reportagem de página inteira em conceituado jornal de minha Campinas, o “Correio Popular”, dedicada ao “amor humano e ao amor canino”. Ao fim do texto, aliás muito bem escrito e ilustrado, a conclusão era uma só: felizes são os cães, gatos e outros bichos. Infelizes são as crianças, em especial as que estão para nascer, porém não irão nascer. Certa senhora da alta classe, cuja foto foi destacada naquela edição, tinha dois filhos e onze cães (sim, senhor!). Os cuidados de cada um deles custava por mês pouco menos que a criação de cada filho!

Essas reflexões me vieram à mente nestes dias em que em primeira página e no caderno C-1, a difundida “Folha de S.Paulo” destacava manchetes como esta: “Governo Lula põe lei do aborto em discussão”. Na mesma página, ao lado, literalmente: “Não me arrependo nem um pouco disso”, isto é, do aborto feito, declaração da “produtora” Maria, nome fictício, de 28 anos. Alegando “não ter estrutura financeira e psicológica para colocar um filho no mundo”, declarou para a repórter Fernanda Mena que, se estivesse grávida, o que, aliás, foi acusado no teste de praxe, “faria um aborto de qualquer maneira”, mesmo sabendo que o abortamento, em qualquer caso, ainda é tido como crime entre nós, segundo o texto da Constituição e do Código Penal. Despenalizado, mas crime, nos casos de gravidez resultante de um estupro e quando a gestante, concubina, companheira ou esposa, vierem a correr risco de vida.

As estatísticas espantam e os grandes jornais e revistas estão aí, nos informando que são praticados no Brasil, a cada ano que passa, pelo menos um milhão e meio de abortos voluntários, intencionais e provocados. Deixa estarrecido ler, também, que “a fome mata uma criança a cada cinco segundos” no mundo, conforme se lê em recentíssimo relatório da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, a FAO, com sede em Roma. Ousaria dizer, pelas informações que tenho, que os investimentos feitos em países abortistas como a Inglaterra e a França, a Alemanha, o Canadá e os Estados Unidos, o Brasil entre eles e outros, é maior que o aplicado no Fome Zero! Dá vontade de chorar e emociona, ver certas fotografias de recém-nascidos e crianças magérrimas, em pele e osso, nos braços de suas desnutridas mães do centro da África negra. E também saber que há mães desnaturadas jogando seus filhos, apenas nascidos, em latões de lixo ou em aterros sanitários.

Como se tudo isso não bastasse, agora, a última do Governo Lula. Com certeza devidamente autorizado, com o respaldo do Ministro da Saúde, acaba de ser constituído um “Grupo de Trabalho” (sic!), em nível federal, com o fim de rever a questão do aborto, com a previsível finalidade de ampliar os casos em que a lei os permitiria. A ocasião próxima para o início dos trabalhos da ilustre Comissão foi o caso dos anencéfalos, ainda na ordem do dia.

Para inglês ver, a Secretária Especial de Políticas para a Mulher, Ministra Nilcéia Freire, afirmou caber ao governo “propiciar uma discussão na sociedade sobre o tema”. Até que o debate sempre é oportuno. Ao que me consta, quando em 1940, em pleno Estado Novo ditatorial, sendo Presidente do Brasil Getúlio Vargas, o “pai dos pobres”, foram despenalizados os abortos nos dois casos lembrados acima. A sociedade, parece, foi colhida de surpresa. Não teria havido nenhum debate e a pena de morte contra os inocentes e indefesos nascituros veio de cima, sem consulta às bases, sem qualquer plebiscito ou referendum que seja.

A petista Ministra Nilcéia Freire, “liberal” como a Coordenadora da área técnica da Saúde da Mulher, também do esperançoso Governo Lula, ambas “feministas”, já adiantaram que, pessoalmente, são favoráveis à ampliação dos casos em que o aborto deveria ser permitido entre nós. Referem-se, concretamente, aos casos de anencefalia, de fetos parcial ou totalmente sem cérebro, mas vivos. Mais adiante, porém, algum Ministro do Supremo Tribunal Federal ou da Saúde, ou seja lá do que for, estará defendendo, também, o direito absoluto da mulher ao próprio corpo (e dos bebês em seu ventre) nos casos da síndrome de down e outras anomalias fetais, lamentavelmente, bem mais freqüentes do que se pensa.

Nesse quadro, vem bem a propósito deixar claro que a Igreja católica, seus Pastores e Fiéis conscientes somos decididamente contrários ao aborto em qualquer caso. E não venha alguém dizer, caluniosamente, que defendemos a vida dos nascituros somente por razões religiosas, lembrados do “Não matarás!”, um dos mandamentos do Decálogo. É o direito natural que fundamenta o respeito à vida de toda e qualquer pessoa inocente, como o primeiro e mais fundamental dos direitos humanos. Que outro direito poderá ser afirmado e respeitado por quem quer que seja, sem o direito de nascer? É uma questão de valores e de direito natural que se sobrepõe ao direito positivo. A vida é um valor sagrado! A morte – a esterilização do homem ou da mulher, o aborto em qualquer caso, o suicídio, o assassinato e outros costumes de nosso Ocidente “ex-cristão”, são “extermínios”, como há pouco reafirmou a Presidência da nossa CNBB, são assassinatos cruéis e covardes, penso eu.Para que abrir a discussão nas organizações da sociedade se, de antemão e publicamente, a ilustre Ministra do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher já se declarou favorável a novos casos de despenalizações do aborto voluntário? Somos um povo sábio e esclarecido ou de “neobobos” e imbecis?

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