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Publicado: Segunda-feira, 9 de maio de 2005

Diário de um peregrino em Roma - II

Homilias de um pastor

Sinto o dever e o impulso de referir-me às várias homilias feitas pelo então Cardeal Joseph Ratzinger, agora Papa Bento XVI. Decano do Sacro Colégio Cardinalício coube a ele não apenas a presidência da Missa de sepultamento do falecido e saudoso Papa João Paulo II mas, também, as das Celebrações Eucarísticas “Pro eligendo Pontífice”, na Basílica de São Pedro e, já eleito no Conclave como o Sucessor de Pedro, pelos 115 cardeais de 52 nações, as alocuções das Missas de sua eleição na Capela Sistina e posse na Praça de São Pedro, perante cerca de 500 mil fiéis, dia 24 de abril último.

Todas as vezes que o conhecido teólogo e cardeal da Igreja falou à multidão dos peregrinos – cerca de 6 milhões entre os dias 2 e 24 de abril! – deixou profundas impressões em todos. Deu provas não somente de sua cultura mas, também, de sua grande espiritualidade e sensibilidade pastoral. Falou sempre, todos sentiram, mais com o coração que com a sua invulgar inteligência.

Na impossibilidade de sintetizar as várias homilias ouvidas por mim na Praça e na Basílica de São Pedro, transcrevo alguns tópicos mais destacados de suas mensagens que logo provaram estar ele muito bem qualificado para suceder o Papa João Paulo II. Atenho-me apenas ao que vem destacado na primeira página do diário da Santa Sé, o “L’Osservatore Romano”, em edição especial do dia 25 de abril. Abaixo de uma bela fotografia colorida do novo Papa e sob a manchete “Um serviço à alegria”, são destacadas algumas das reflexões da histórica homilia interrompida e aplaudida 37 vezes, pelos que superlotaram em manhã primaveril e ensolarada a Praça de São Pedro. Disse ele:

Tarefa inaudita – “Agora, neste momento, eu fraco servidor de Deus, devo assumir este desafio que realmente supera toda capacidade humana”.

Não estou só – “Não devo levar sozinho o peso que, na realidade, não poderei levar sozinho. A corte dos Santos de Deus me protege, sustenta e leva adiante. A vossa oração e indulgência, o vosso amor, a vossa fé e esperança me acompanham”.

A Igreja está viva – “A Igreja leva em seus ombros o futuro do mundo e por isso mesmo a cada um de nós, no caminho do futuro. O meu programa é o de não fazer a minha vontade, mas o de colocar-me na escuta da Palavra e da vontade do Senhor, de tal modo que Ele mesmo seja o guia de sua Igreja!”.

O sinal do pálio – “O Filho de Deus não pode abandonar a humanidade em situação de miséria. Coloca-se em pé, abandona a glória do céu para reencontrar a ovelha desgarrada e segui-la até a cruz. Ele a carrega em seus ombros, leva a nossa humanidade e a nós mesmos. Para Ele, o Bom Pastor, não é indiferente que tantas pessoas vivam no deserto. E há tantas formas de deserto! Os desertos exteriores se multiplicam pelo mundo, porque os desertos interiores se tornaram tão amplos. O Deus que se tornou Cordeiro nos diz que o mundo foi salvo pelo Crucificado e não pelos algozes que o crucificaram. O mundo foi salvo pela paciência divina e é destruído pela impaciência dos homens. Que eu aprenda sempre mais a amar o Senhor, a amar sempre mais o seu rebanho. Orai por mim para que não fuja, por causa do medo, diante dos lobos!”.

O anel do pescador – “Ainda hoje vem sendo dito à Igreja e aos sucessores dos Apóstolos que avancem ao largo do mar da história. Cada um de nós foi querido de Deus. Cada um de nós é amado e necessário. Não há nada de mais belo que ser encontrado, surpreendido pelo Evangelho e por Cristo”.

Cristo nada tira – “Ainda e continuamente, ecoam em nossos ouvidos as palavras de João Paulo II: ‘Não tenham medo! Antes, abri de par em par as portas a Cristo!’. Quem o faz não perde nada, absolutamente nada, daquilo que torna a vida livre, bela e grandiosa. Somente na amizade de Cristo se abrem as portas da vida! Hoje eu desejaria com grande força e convicção, a partir da esperança de uma longa vida pessoal, dizer a todos vós, caros jovens: ‘Não tenham medo de Cristo! Sim, abri, de par em par, as portas a Cristo!’”.

Em um cenário esplêndido, inimaginável e único para os que não se encontravam na superlotada Praça da Basílica de São Pedro – cardeais, bispos e presbíteros, as mais altas autoridades de 141 nações, fiéis de nossa Igreja com absoluta prevalência dos jovens, lideranças ortodoxas, protestantes, judias e do mundo não-cristão – a articulada voz e pensamento do novo Papa, superada uma certa timidez inicial, penetrou fundo no coração de todos. Joseph Ratzinger era o novo Pastor que Deus e o Espírito Santo acabavam de colocar à frente do rebanho de Cristo espalhado por todo o mundo. Benedictus qui venit in nomine Domini!

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