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Publicado: Quinta-feira, 27 de maio de 2004

Casamento ou Virgindade?

Os que conhecem a Sagrada Escritura, conjunto de livros inspirados por Deus, sabem perfeitamente que o casamento e a família foram instituídos pelo Criador na origem da humanidade. Não são invenções humanas e apenas instituições naturais, em consonância com a dignidade humana, resposta para as mais profundas aspirações do coração do homem e da mulher. São instituições divinas e sagradas.

A Antropologia Cultural ensina que mesmo entre os povos mais primitivos jamais houve, no espaço e no tempo, uma situação total de promiscuidade sexual. Todos os povos conhecem o casamento e a família, tendo-os como normais, cercando-os de ritos que antecedem a vida matrimonial e a geração dos filhos. A família é a comunidade em que o homem e a mulher se relacionam intimamente, ao mesmo tempo satisfazendo o instinto e gerando filhos. Esse é o plano de Deus.

Em artigo anterior citei alguns textos bíblicos do Antigo Testamento, a partir do Gênesis, recordando não existir entre os judeus a opção virginal e celibatária. Todos se casavam, sendo a paternidade e a maternidade inestimáveis dons de Deus. Assim, a afetividade e sexualidade humanas têm um lugar de grande relevância no plano de Deus. Nesse plano o casamento será sempre uma união monogâmica de um homem e u’a mulher, dela resultando a família e os filhos.

Esse belo e sem dúvida amoroso plano divino, foi e solenemente proclamado e restaurado por Cristo em um importante momento de seu magistério. É o que se lê no Evangelho de São Mateus, no capítulo 19, versículos de 3 a 9. Na mesma passagem, contudo, o divino Mestre antecipa que alguns “não se casarão por amor ao Reino dos céus” (versículos de 10 a 12).

A partir desse momento, a opção por uma vida virginal, sem o casamento ou celibatária, iria tornar-se o caminho de milhares e milhares de homens e mulheres em toda a história da Igreja, que deixariam de casar-se pelos nobres motivos de um seguimento radical do próprio Cristo, como expressão de um empenho total na constante proclamação dos valores e na construção do Reino de Deus entre os homens.

No mesmo artigo acenei ao capítulo 7o da 1a Carta do Apóstolo Paulo à Comunidade cristã de Corinto. É onde em seus escritos ele trata da virgindade e do casamento em termos claros e fortes. Afirma que o casamento é uma opção legítima, um direito do homem e da mulher. Aos casados recomenda que tenham, regularmente, uma vida íntima, com expressões corporais do seu amor, abertos ao dom da vida. Aconselha a que raramente, de quando em quando, se abstenham da intimidade sexual. “Cada qual tenha a sua mulher e cada mulher tenha o próprio marido. O marido cumpra o seu dever para com sua esposa e, da mesma forma, a esposa também o cumpra para com o seu marido” (versículos 2 e 3). Pouco adiante o Apóstolo acrescenta: “Aos solteiros e viúvas digo que lhes é bom permanecerem assim como eu mesmo. Mas é melhor casar-se que abrasar-se” (versículos 8 e 9).

Avançando em seus conselhos sobre o casamento e o matrimônio, o Apóstolo Paulo fala na santificação do marido pelas virtudes da mulher cristã, exortando a que “cada um viva na condição em que Deus o colocou e para a qual o chamou” (versículo 17). Do versículo 25 em diante, da mesma Carta, o Apóstolo deixa claro que casando-se “terão as tribulações da carne” e os problemas da vida matrimonial. Para ele que entendia de psicologia, experiente na vida, a mulher casada sempre dividirá, como é natural, o próprio coração entre Deus, o marido e os filhos. Os virgens, porém, procuram “cuidar das coisas do Senhor e como agradar a Deus”, tudo fazendo para serem “santos no corpo e no espírito” (versículo 34). O inspirado e longo texto termina dizendo: “O que casa a própria filha faz bem, mas o que não a casa faz melhor!” (versículo 38).

Do ensino de Cristo nos Evangelhos e dos pensamentos de Paulo em sua Carta aos coríntios resulta, teologicamente e numa visão de fé, que o estado de virgindade “por amor ao Reino dos céus”, vivido digna e castamente, situa-se em um nível superior ao do casamento e do matrimônio. Assim como prevalece, também, a vida contemplativa sobre a ativa, a prece sobre o ativismo, mesmo pastoral, que empenham o homem e a mulher na evangelização. Deus, Cristo, o Espírito Santo, atuam diretamente no interior e no coração dos que ouvem a Palavra de Deus. Os talentos e qualidades humanas pouco ou nada conseguem sem a ação divina da graça.

Não é fácil compreender e aceitar o primado da virgindade sobre o casamento em um mundo erotizado como o nosso, em que se multiplicam os motéis, as revistas, os filmes e programas de TV saturados de supervalorização do sexo, antepondo a genitalidade sobre o verdadeiro amor. Somente acabarão aceitando o primado da virgindade do homem ou da mulher consagrados a Deus, aqueles que forem trabalhados pela graça divina, pessoas de fé. A eles é que Cristo se referiu na célebre passagem do evangelista São Mateus, quando disse: “Quem puder compreender que compreenda!” (Mt 19, 12).

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