Colunistas

Publicado: Quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Capacitação em baixa

O viajante de negócios desembarca no aeroporto da cidade desconhecida. No táxi que o leva ao hotel, apesar da manutenção razoável do veículo, percebe a falta de cortesia do motorista. Ele mal se dirige ao passageiro para dar explicações espontâneas sobre a cidade ou o percurso, e responde de forma lacônica, com visível mau humor, às perguntas do viajante. "Dei azar", pensa, até chegar ao hotel.

Apesar das instalações de padrão internacional, encontra no balcão uma recepcionista que não demonstra qualquer emoção diante do recém-chegado. Ao telefone, estende a ele burocraticamente um formulário para ser preenchido. Ao final, informa como um robô que o estabelecimento não permite fumantes, acesso de crianças sem documentos, acompanhantes não registrados, nem animais de estimação. Avisa ainda que o quarto só poderá ser ocupado após as 16 horas. Quando perguntado sobre o que fazer até lá, a recepcionista sacode os ombros e atende uma ligação. Qual a primeira impressão do passageiro sobre a cidade?

Moral da história: de nada adianta investir em infraestrutura de turismo, bons hotéis, restaurantes e instalações de primeira, se não for acompanhado da capacitação dos profissionais da área de serviços, principalmente os que têm contatos iniciais com o viajante. Enfrentar esse problema se tornou a grande missão de Toni Sando, diretor do São Paulo Convention & Visitors Bureau. Para ele, é preciso tirar proveito do turismo ser a única indústria que oferece uma química peculiar: o prazer de servir e ser servido se equivalem. Por meio da boa gestão, esse diferencial precisa ser usado a favor do turismo de São Paulo.

No entanto, o setor precisa se conscientizar da necessidade de treinamento constante, não apenas para o pessoal imediatamente ligado ao negócio, mas para aqueles que, pelas suas funções, acabam fazendo o papel de anfitriões da cidade.

Toni diz que o incentivo à excelência de serviços e o interesse pela diversidade cultural precisam ser estimulados. Ao receber um turista, não basta ser gentil, mas é preciso um mínimo de conhecimento sobre a cultura e história dos que chegam. Por exemplo, é preciso entender que o público GLS não é uma preferência sexual, mas também a quebra de tabus e preconceitos. Se isso exige qualificação, em contrapartida requer valorização dos profissionais. Essa mudança, explica Toni, não se faz pela simples vontade, mas pelo que classifica de três "Pês" da cadeia produtiva do turismo: planejamento, processos e pessoas. Ele próprio está à frente do processo de capacitação pelo Programa Receber Bem, que ensina a encantar os visitantes de São Paulo, dos policiais de trânsito aos frentistas de postos de gasolina, dos profissionais de atendimento nos hotéis aos agentes de viagens, das locadoras de automóveis aos taxistas. Toni reconhece que o maior desafio ainda está nos aeroportos. Esse é um problema que não se restringe a São Paulo, mas a todo o mundo, pois é ali que os gatos costumam ser vendidos como lebres.

*Este texto de Fábio Steinberg foi publicado também na coluna "Viagens de Negócio", no dia 16 de agosto, no Diário do Comércio da Associação Comercial de São Paulo.

Comentários