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Publicado: Quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Barros Junior: um republicano histórico

Barros Junior: um republicano histórico

Francisco Fernando de Barros Junior, um republicano histórico

 

Dra. Anicleide Zequini

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            A trajetória política de Barros Junior, até o ano de 1889, esteve atrelada a  vida política da cidade de Itu, SP. Localidade que se destacou no cenário político no ano de 1873 por ter sediado a Convenção Republicana, reunião de clubes republicanos já constituídos na Província de São Paulo, para formalizar a organização do Partido Republicano Paulista.

            O enriquecimento da família de Barros Junior, está intimamente ligado a cultura da cana de açúcar e a produção do açúcar, nas propriedades agrícolas que possuía na região de Capivari, onde nasceu  em 17 de março de 1856. Nesta localidade, Francisco Fernando de Barros, pai de Barros Júnior, se destaca, no ano de 1850, em sociedade com Bento Paes de Barros, como produtor de 3.000 arrobas de açúcar. Em 1902, data de seu falecimento, possuía 820 alqueires de terras da Fazenda Morro Vermelho, Casa de engenho, tendal a vapor e 17 quartos em quadra, estes provavelmente, remanescentes de uma antiga senzala[1].

            A concentração de terras e riqueza de sua família proporcionou a Barros Júnior freqüentar os mais conceituados estabelecimentos de ensino do Império, como o Colégio Jesuíta São Luiz na cidade de Itu, onde realizou seus primeiros estudos e, posteriormente, o internato do Colégio Kopke, em Petrópolis, RJ, considerado, no Império, por seu ensino modelar e destinado aos filhos da elite da época.

            Após sua formatura, ingressou juntamente com seu irmão Fernando Paes de Barros, no curso de Engenharia Civil, na então recém fundada Syracuse University (1870) do estado de Nova York, nos Estados Unidos da América, ali permanecendo entre os anos de 1877-9. É nesta Universidade e, neste mesmo ano, que forma-se o também industrial e republicano de Itu, Octaviano Abson Pereira Mendes, no curso de Arquiteto Construtor.          

            Segundo Luiz Castellari, estudioso e primeiro a escrever sobre a História da Cidade de Salto, SP, os  longos anos de permanência na América, contribuiu com a sua formação política, especialmente, a sua formação republicana, de onde “assimilou seus ideais”. [2]

Em 9 de setembro de 1879, mesmo ano de regresso a Itu, casou-se com sua prima irmã D. Maria Alexandrina de Barros. Dos vários filhos, apenas Alexandre Luiz de Almeida Barros aparece em seu inventário datado de 1918, fato que sugere ter aqueles falecidos ainda crianças.

            Além de assimilado as idéias republicanas, Barros Junior, também se qualificou para a montagem de seu empreendimento industrial, aliando assim a sua formação e, também a fortuna paterna. Em 1880, iniciou a construção de uma segunda fábrica de tecidos na então Vila do Salto de Itu, localidade que já se destacava no cenário nacional como um núcleo fabril e, que até  o ano de 1889, dependia administra e politicamente, da cidade de Itu.

            A fábrica de tecidos de Barros Junior, foi a 9º. fábrica fundada na Província de São Paulo. Em 1882, contava apenas com os trabalhos de tecelagem, utilizando fios importados e contendo 47 teares. A fiação, com 2.900 fusos  ainda estava em fase de instalação.  Trabalhava 120 operários, utilizando como energia a força de uma turbina americana de 82 cavalos tocada pelas águas do rio Tietê [3].

            Com a instalação desta fábrica de tecidos se inicia também, a sua trajetória política e se estrutura o seu posicionamento político frente aos moradores de Salto e, também da cidade de Itu. Um de seus grandes adversários foi o também industrial José Galvão de França Pacheco Junior, declaradamente um monarquista, Entre os inúmeros episódios envolvendo estes dois industriais, como as disputas pelas águas do rio Tietê, do qual ambas as fábricas se utilizavam como energia para movimentação das turbinas hidráulicas, destaca-se a questão envolvendo a demarcação dos terrenos públicos em Salto.

Deste projeto, deu especial atenção à abertura da então Rua do Porto, atualmente, Rua José Weisshon, na época, uma das mais importantes da localidade, fazendo a ligação entre as fábricas e a estação ferroviária da Companhia Ytuana de Estradas de Ferro, aliando-se assim interesses tanto políticos como econômico.

Essa disputa foi iniciada a partir de um projeto apresentado na Câmara de Vereadores de Itu, em 1883, pelo recém empossado vereador Barros Junior, que exerceu este cargo entre os anos de 1882-1886. Esta demanda se arrastou entre os anos de 1883-1886, sendo encaminhado ao Supremo Tribunal de Justiça na Corte do Rio de Janeiro [4].  

Como vereador, apresentou a Câmara de Itu, projeto para elevar Salto, a condição de Vila, conquistando assim, em 27 de março de 1889, não somente a autonomia local, mas também, sua liderança  política e a de seu grupo republicano, num momento em que o grupo monarquista saltense perdia seu mais representativo representante: José Galvão de França Pacheco Júnior, falecido em 1889. Em 1890, já estava como presidente da intendência local e entre 1892-1896 foi Deputado Estadual pelo Partido Republicano Paulista.

Nesta gestão se destacou como autor do projeto de Lei para ampliar as divisas do município de Salto, fato que foi combatido pela Câmara ituana, por meio de oficio assinado pelo vereador Cesário Motta Júnior, em 1893. Promulgada a Lei no. 127 em 2 de maio de 1893, a Vila de Salto passou receber mais recursos, devido ao recolhimento de impostos provenientes da incorporação de duas outras fábricas: a de Papel Melchert, fundada em 1889; e a de tecidos pertencente a Octaviano Pereira Mendes, fundada em 1887, anteriormente, pertencentes a cidade de Itu.

A sua construção, como político também se deu através da reorganização, em 1880, da Grêmio Musical Saltense fundado, composto por operários de sua fábrica de tecidos, Contratou como regente, o musico e compositor João Narciso do Amaral, ligado ao grupo republicano que ficou conhecido como ““Fonsequistas” de Itu, que tinha como chefe político o republicano  e Convencional Dr. Francisco Emydio da Fonseca, também um grande aliado de Barros Junior. Vale ressaltar que o Dr. Fonseca, se destacou em Itu, como chefe político de um importante grupo republicano, que ficou conhecido como Maragatos, surgido provavelmente, em 1898, quando também, foi criada a Banda 13 de março regida por Narciso do Amaral [5].

A Banda Musical Saltense esteve presente em inúmeras ocasiões festivas e políticas, tanto da cidade de Itu, como em Salto. Uma delas, para receber a terceira visita do Imperador D. Pedro II e D. Thereza Cristina, em 1886. Na ocasião Barros Junior ofereceu para o transporte da família imperial, a única carruagem existente na localidade, mas também, a sua Banda de Música. “garbosamente vestidos com calças brancas, paletó preto com uma rosa branca na lapela. Os instrumentos estavam enfeitados com laços auriverdes”[6].

Em 1885, foi à vez de organizar, a sociedade Gabinete de Leitura e Cultura Democrática, tendo como bibliotecário Mauricio Cardozo. O interessante deste Gabinete/biblioteca, além de proporcionar leituras de livros, revistas e jornais, provavelmente, passou a sediar após 1887, o Club 14 de julho, núcleo do partido republicano local. Segundo o Jornal o Estado de São Paulo, em matéria intitulada As Visitas do Imperador de 4 de março de 1952, afirmava que aquele Gabinete fora fundado por Barros Júnior, aos moldes dos que havia conhecido na Universidade de Syracuse.

Em 1888 fundou o jornal Correio de Salto, tendo como lema “Autonomia no Estado e Constitucionalista na União”, importante órgão de divulgação das idéias republicanas[7]. Para tanto, teve como redator, o também republicano, professor Tancredo Leite do Amaral Coutinho. Este jornal foi publicado apenas entre os anos de 1888 e 1889, ressurgindo em 1891, em meio aos conflitos políticos ocorridos na capital e interior do Estado de São Paulo, frente ao governo de  Deodoro da Fonseca e as divergências ocorridas entre o Partido Republicano Paulista e o Partido de Américo Brasiliense, então no cargo de Presidente do estado de São Paulo [8].

Itu participou efetivamente deste movimento político de 1891, que tinha como objetivo destituir todas as intendências que foram nomeadas pelo então governador do Estado Américo Brasiliense como também, a deposição deste, que fora nomeado por Deodoro da Fonseca. Como em outras localidades do estado de São Paulo, o diretório republicano ituano chefiado pelo republicano histórico Francisco Emigdio da Fonseca Pacheco, o “Totô Fonseca”, reuniu em sua residência na Rua Direita, alguns membros do partido republicano, os “Fonsequistas” e moradores do bairro do Pedregulho, região onde estavam concentrados os maiores produtores rurais da cidade, bem como, a sua propriedade cafeeira, a Fazenda Floresta.

Pelo que se procede das notícias publicadas no Jornal Estado de São Paulo, em 19 de dezembro de 1891, o Diretório do partido Republicano e numeroso grupo armado apossaram-se da casa da intendência, hasteando no edifício a bandeira Nacional. A polícia local também aderiu ao movimento, e o suplente de delegado de polícia Joaquim Lino Leão de Vasconcellos, declarou que se exonerava do cargo para não apoiar o governo de Américo Brasiliense [9].

Barros júnior aí estava presente, com sua Banda de Música e vários moradores de Salto. A intendência de Itu foi então dissolvida e em seu lugar constituída uma junta governativa formada pelo Dr. Cesário de Freitas, Carlos Keihl e Dr. Paula Leite de Barros.

Contudo a intendência da Vila de Salto, não foi dissolvida, pois seus membros haviam se declarado em oposição ao governo de Américo Brasiliense, apoiando Cerqueira César[10].

Mas é após 1896 que as dificuldades políticas e financeiras fizeram com que “ sua estrela tutelar deixou de brilhar no firmamento” [11]. Em 1891, já havia vendido a sua Fábrica de Tecidospara a Companhia de Cultura Paulista,em 1895, as suas casas em Salto e, em 1899, dedicava-se a produção de aguardente em parte de terras que herdou de seu pai na fazenda Conceição, área que foi posteriormente, anexada ao território de Salto[12].

A cidade de Salto já havia mudado, tanto em população, como na constituição política e novos grupos econômicos estavam constituídos, fato que certamente foi determinante a decisão de Barros Júnior em abandonar a política saltense em 1907, declarando-se inclusive, como oposição a Câmara vigente.  Apos o seu falecimento em 1918, recebeu uma homenagem que o cognominou Pai dos Saltenses.


[1] Arquivo do Museu Republicano “Convenção de Itu”. Fundo do 1º. Ofício. Inventário  Francisco Fernando de Barros. Cx.  161. 1902.

[2] CASTELLARI, Luiz. História da Cidade de Salto. Salto,SP: Gráfica Tapera Ltda., 1971, p. 75.

[3] Fabricas de tecidos. O Estado de São Paulo. 3 nov. 1882 p. 2

[4] ZEQUINI, Anicleide. O Quintal da Fábrica: a industrialização pioneira do interior paulista. Salto,SP, séculos XIX e XX. São Paulo: Annablume, 2004, pp. 107-115.

[5] ZEQUINI, Anicleide. João Narciso do Amaral. Itu:Presença Ilustres. 1a. edição. Itu,SP:Ottoni Editora. 2013. pp. 83-90.

[6] As Visitas do Imperador. Jornal O Estado de São Paulo. 4 mar. 1952, p. 8

[7] CASTELLARI. Luiz. História da Cidade de Salto. Salto,SP: Gráfica Tapera Ltda., 1971, p. 77.

[8] Cf. CARONE, Edgard. A Republica Velha , II evolução política (1889-1930). Rio de Janeiro:Difel editorial S.A. 1977, p. 25-84.

[9] A Revolução. Jornal O Estado de São Paulo, 19 dez. 1891. p. 01.

[10] Ata da 12º. Sessão Ordinária da Intendência Municipal da Villa do Salto. 1º. Dez. 1891.

[11] CASTELLARI. Luiz. História da Cidade de Salto. Salto,SP: Gráfica Tapera Ltda., 1971, p. 78.

[12] Sobre a Fazenda Conceição ver: Bogaciovas, Marcelo Meira Amaral. A Capela de Nossa Senhora da Conceição de Itupucu. Revista da ASBRAP, n 20, p. 65-132.

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