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Publicado: Terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Banda de Itu: 105 anos servindo a Arte

Crédito: Livro: Banda de Itu Banda de Itu: 105 anos servindo a Arte
Músicos da primeira formação. 1912

  

 

Banda de Itu: 105 anos servindo à Arte por Amor a Arte[1]

 

 

Anicleide Zequini

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Este artigo pretende discorrer sobre a fundação da Corporação Musical União dos Artistas de Itu, que em junho de 2017 estará completando 105 anos, seus primeiros músicos, apresentações e primeiros aniversários. Esta  centenária Banda, patrimônio cultural da cidade, foi organizada em 1912 foi organizada por um grupo de músicos amadores e, ao que tudo indica, alguns deles provenientes das extintas Banda Italiana ligada a La Societá Unione di Operaia in Beneficienza in Ytu; da Banda 13 de março do maestro João Narciso do Amaral e membros da colônia italiana local, todas organizadas em finais do século 19.

 

A cidade naquele momento se destacava pela tradição musical quer pela presença de músicos, compositores e maestros, quer pelas Bandas de Música que haviam se organizado na segunda metade do século 19 como a “Filoméla” organizada pelo maestro Elias Lobo; a Banda dos Artistas, do maestro Macuco; a Lyra Ituana, do professor Francisco da Costa Leite; Banda de Música da Roça, organizada pelo Capitão Manuel Joaquim Rodrigues de Arruda, Banda Victorio Emanuelle, Banda Santa Cecília e a Banda São Benedito, formada em 1908, que tinha como maestro o Tenente Francisco Vicente de Campos[2].

   

Encontrava-se urbanizada, com comercio estruturado, especialmente, com as lojas de tecidos e serviços concentrados na Rua do Comércio, atual Rua Floriano Peixoto e o jardim da Matriz com seu coreto inaugurado em 1898, local das apresentações públicas das Bandas de Música. É também em finais do século 19,  que a população urbana se transforma, sendo em sua maioria formada por imigrantes, muito deles italianos que haviam fundado em 1894 a La Societá Unione di Operaia in Beneficienza in Ytu, atualmente o Circulo Ítalo-brasileiro Dante Alighieri. Nota-se que os imigrantes se concentraram na região formada pelas ruas Santa Cruz e Santa Rita, sendo nesta última sendo a escolhida para a localização da primeira sede da Banda União dos Artistas de Itu.

 

Na primeira década do século 20, Itu encontrava-se num processo de reestruturação social e política após inúmeros confrontos, principalmente com o ocorrido em 20 de janeiro de 1900 envolvendo dois grupos políticos divergentes que ficaram conhecidos como Jagunços e Maragatos. Estes dois grupos eram compostos não apenas por moradores da localidade, mas também, se faziam representar por jornais distintos e respectivas Bandas de Musica: a Banda 30 de Outubro dos Jagunços, regida pelo Maestro José Victorio de Quadros e a Banda 13 de Março dos Maragatos, regida  por João Narciso do Amaral, ambas já organizadas em 1898[3].

 

Assim, primeira notícia sobre a formação da Banda de Itu publicada no dia 08 de junho de 1912 nos jornais Republica, A Cidade de Itu e A Federação e, no dia 09 de junho no jornal Republica, refletiu o momento da cidade. A novidade foi levada à redação por José Maria dos Passos, professor e compositor e Maestro da Banda entre os anos 1912-1914. Em nota publicada, o redator inicia a notícia afirmando que a Banda de Itu nascia “independente sem cor política”, ou seja, afirmava que a mesma estava desvinculada de questões políticas que, até então, haviam trazido muitos dissabores para a localidade. Daí, provavelmente a sugestiva denominação da nova Banda como “União dos Artistas”: união de todos os artistas de Itu independentes de grupos “emancipada de qualquer ligação política”.

 

A primeira formação da União dos Artistas era composta por 21 músicos amadores destes, pelo menos 10 eram italianos ou descendentes, todos trabalhadores em ocupações diversas durante o dia como comerciantes, operários, sapateiros, alfaiates, pedreiros, entre outras. Os ensaios ocorriam durante os dias de semana, sempre à noite e as apresentações, aos domingos, no coreto da praça.

 

A primeira apresentação publica em 16 de junho de 1912, iniciou com um pequeno desfile dos músicos pela cidade. Assim, às onze horas da manhã, percorreram as ruas, parando em frente de algumas casas de autoridades locais, para executarem uma musica do repertório. Esta era uma prática já existente na localidade, uma forma de homenagem.

 

Em 9 de junho de 1912, o jornal A Federação manifestou sua apreciação sobre a  apresentação afirmando que a Banda era constituída por “bons elementos e com um repertório caprichosamente organizado”. Mas outros, como o Jornal A Cidade de Itu (veiculo da facção dos Jagunços), em publicação de 19 de junho de 1912, informaram que o conjunto era “bem regular; mais alguns ensaios.....e será boa de ouvir”, mas desejaram a nova Banda,“Paz, harmonia, felicidade e duração, tudo sem cor ou cores políticas à União dos Artistas músicos”.

 

Mas a defesa a nova Banda, veio com as observações do articulista do Jornal Republica de 23 de junho de 1912 (veículo da Facção Maragato), indicando que as críticas publicadas então pelo jornal A Cidade de Itu, eram originarias de “temores de uma séria concorrência”. E completavam: “Bem afinada e com pessoal correto, o aparecimento da nova sociedade causou ótima impressão, sendo apreciadas as lindas peças que executou”.

 

Mas, a prova final para a nova corporação musical veio, com certeza, com o primeiro concerto público realizado no coreto do jardim da Matriz em 4  de agosto de 1912, as cinco horas da tarde. Os músicos, sob a batuta do maestro José Maria dos Passos executou o seguinte programa:

 

I Parte:

Giuseppe Manente – Arcola – Marcha

Domenico  Nocentini – Picolé potpoirri

Sidney Jones – The Geisha Fantasia

José Maria dos Passos – 21 de Abril – Dobrado

 

II Parte:

Domenico Nocentini – Fantasia popular – Divertimento para bombardino e piston

Vincenzo Billi – Armonie del Bosco - Dueto para clarineto e piston.

Franz Lehar – Conde de Luxemburgo

José Maria dos Passos – Saltitando – Polca Militar

Arona Colombino – A Tripoli - Canção popular – Marcha

 

Este primeiro programa musical incluiu o dobrado de autoria do próprio regente, musicas de compositores italianos e, a marcha patriótica italiana A Trípoli, composta por Arona Colombino, em 1911, e dedicada aos feitos militares italianos na Líbia durante a Guerra que estava em andamento, a ítalo-turca (1911-1912). Sem dúvida, uma homenagem aos inúmeros italianos que aqui residiam e que, haviam deixado em sua terra natal, amigos e parentes, muitos deles como combatentes em Trípoli.

 

De sua primeira formação, alguns nomes se perderam no tempo, mas outros permanecem na história da Centenária União dos Artistas, como o de Jose Maria dos Passos, primeiro maestro; Inocêncio Emanuelli, pedreiro e músico pratista, foi também grande entusiasta e primeiro Presidente da Banda. Foi também Emanuelli, quem alugou o primeiro salão para ensaios, na Rua Santa Rita. Em 1953, teve seu retrato inaugurado numa das salas da Banda, onde ainda permanece. Contava a primeira formação com Guerino Bordini, Julio Zeppini. Ítalo Constancio, João de Deus, Jose de Quadros (Nhõ Zé Quatro Paus), Domingos Campagnolli, João Baptista Macedo (Neguinho), Juca Avelino, João Emanuelli, Deuclides dos Passos, Joaquim Tomaz, Tercilides Bellintani, Augusto Bellintani, Antonio Segamarchi, Luiz Suvié e Teto.

 

Um dos primeiros fardamentos da Corporação Musical, provavelmente, pode ter surgido em 1917, pois na primeira imagem dos músicos de 1912 observa-se que os mesmos estão trajados com roupas costumeiras da época, como terno e gravata e cada qual em com seu estilo próprio. Em 09 de dezembro de 1917 em notícia do jornal Município de Itu, encontramos a primeira referencia do uso de fardamento pelos músicos da União dos Artistas. Durante o concerto que iriam executar na Praça Padre Miguel (Praça da Matriz) de Itu, tendo como regente Gentil de Oliveira, afirmavam que a Banda iria estrear “o seu lindo fardamento, que foi todo ele confeccionado pelas conceituadas oficinas do Sr. Abrahão Borsari”.

 

As apresentações públicas eram previamente noticiadas pela imprensa local. Com o título da coluna denominada Concerto divulgava a programação das peças musicas que iriam ser executadas. As apresentações ocorriam normalmente uma ou duas vezes ao mês, sempre aos domingos a tarde e eram bastante prestigiadas pela população. Assim, em agosto de 1912, noticiava o jornal A Cidade de Itu, que apesar da chuva, havia muitas pessoas no jardim assistindo a apresentação da União, sendo algumas peças muito aplaudidas.

 

Em 1912, a Corporação Musical União dos Artistas já oferecia seus serviços musicais. Tanto foi assim que, José Maria dos Passos quando esteve na redação do jornal Republica, no início do mês de junho de 1912, deixou claro que a Banda “se prestará a tocar em todos os atos para os quais seja previamente ajustada”, ou seja, contratada.

Em 1912, a Banda de Itu se apresentou  no salão do Clube Recreio Ytuano,  sociedade de entretenimento e lazer, formada por ituanos em  1891; em 1913, tocou nos intervalos de uma peça apresentada por amadores no Teatro São Domingos, acompanhada pela Orquestra de Tristão Júnior. Segundo nota do jornal A Republica, a Corporação quis “gentilmente concorrer para o brilhantismo do espetáculo”, ou seja, não cobrou para participar daquele evento promovido em benefício das festas da Semana Santa.

 

Participou também da procissão de São Benedito e nas celebrações da Semana Santa, em  março de 1913, quando esteve presente na segunda procissão de enterro que saiu da  Igreja do Carmo na sexta-feira Santa,  às 9 horas da noite, percorrendo as ruas da Palma, Direita e Carmo, no centro da Cidade. No Domingo de Páscoa, , segundo  notícias, as Bandas de Itu e a 30 de Outubro, tocaram juntas na procissão. Já a música coral, realizadas no interior da Igreja Matriz, ficou a cargo do maestro Tristão Mariano Junior.

 

No período da primeira Guerra mundial (1914-1918), as dificuldades permaneceram. Em 16 em 16 de junho de 1914, o jornal A Cidade de Itu, publicou um curioso documento com o título Padre Nosso dos Músicos, oferece a dimensão daquele trabalho nos período da guerra. Assim publicaram:  

 

“Padre Nosso que organizais festas, santificado seja o nosso trabalho; venham a nós os vossos convites e o respectivo arame, seja feita a vossa vontade tanto na igreja como no coreto; a remuneração de cada festa nos dai logo; perdoai-nos algum ataque falso, assim como nós vos perdoamos se pedirdes abatimento no preço; não nos deixeis perder a embocadura nem a firmeza da execução; livrai-nos dos ensaios e das festas gratuitas e alvoradas! Amem”.

 

Mas, os primeiros aniversários não passaram em branco. A com continuidade da Banda foram sempre comemorados pelos músicos e comunidade foram, com requintes de detalhes, publicadas pela imprensa local e, assim, tonando-se importantes registros para a história da Banda de Itu. No terceiro aniversário, segundo notícias do Jornal A Republica,  a Banda,  logo ao romper da manhã“percorreu as ruas locais numa alegre alvorada”, seguido por um banquete oferecido, aos músicos e a imprensa local, pelo Maestro Jose Maria dos Passos, depois no coreto da praça um concerto “com máxima galhardia”. Em 1916, o quarto aniversário, foi comemorado também com a tradicional Alvorada pelas ruas da localidade tocando dobrados, marchas e peças de óperas; a tarde, um jantar nas dependências da sede social oferecido aos músicos, amigos e representantes da imprensa. Lá estiveram  Manuel Maria Bueno, pela Federação; Affonso e Aurélio Borges, pela Republica; A. Magalhães, pela Cidade de Itu e Fausto Teixeira pela O Município de Itu; e Manuel de Barros Castanho, Amigo Baptisti e Carlos Ferrari. Na sala principal daquela sede, que estava “caprichosamente ornamentada”, segundo o jornal O Município de Itu, foi colocado o retrato do maestro João Narciso do Amaral, falecido em 1905 e que durante toda a sua vida foi regente da Corporação Musical 13 de março, já extinta em 1916. A bela homenagem ao Maestro João Narciso fez por merecer, afinal ele havia sido mestre-professor de muitos músicos que compunham a então Corporação Musical União dos Artistas., a agora Centenária Banda de Itu.

 

Da fotografia da primeira formação foram identificados os seguintes músicos: 

 Primeira fileira do fundo, em pé, da esquerda para a direita: Inocêncio Emanuelli, [sem identificação], Domingos Campagnoli, [sem identificação], João Baptista Macedo (Neguinho),e Juca Avelino. 

Segunda fileira do fundo, em pé, da esquerda para a direita:Julio Zeppini, João Emanuelli, Euclydes de Passos, [sem identificação], Luiz Killiam, José de Quadros (IV Paus), João de Deus.

Sentados, da esquerda para a direita: Joaquim Thomaz, Guerino Bordini, Augusto Belentoni, Tercilide Bellintoni, Joaquim Jose Maria dos Passos(maestro), Luiz Suvi, Teto e Antonio Segamarchi.


 

 

 


[1] Este texto foi redigido a partir do livro redigido por Anicleide Zequini e Maria Célia Brunello Bombana. A Banda de Itu: 100 anos de luta e glória – 1912-2012.

[2] ZEQUINI, Anicleide. Maria Célia Brunello Bombana. A “Banda de Itu” 100 anos de luta e glória 1912-2012. Itu,SP: Ottoni, 2012. pp. 11-14

[3]  ZEQUINI, Anicleide. João Narciso do Amaral: Maestro,  Musico e  Compositor.   Revista da Academia Ituana de Letras. 2013. Disponível em: http://www.itu.com.br/colunistas/artigo.asp?cod_conteudo=43827

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