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Publicado: Sexta-feira, 12 de agosto de 2005

Afonso de Taunay: história e ação

Taunay e funcionários (1929)

Aos 27 de dezembro de 1944 Afonso de Taunay era proposto e eleito membro honorário da American Historical Association, juntamente com os historiadores Rafael Altamira y Crevea, Pierre Caron, Johann Huizinga, Albert Pollard, George Macaulay Trevelyan e Domingo Amanátegui y Solar.

Não se tratava de uma distinção comum. A American Historical Association era extremamente prudente na escolha de seus membros e a eleição feita por nomes da mais alta reputação na historiografia universal.

Era a consagração estrangeira ao maior trabalhador da historiografia brasileira, cuja obra vasta e monumental tinha trazido uma contribuição fatual tão grande quando a de Varnhagen, afirmou o historiador José Honório Rodrigues.

Nessa altura, Taunay tinha encerrado o longo processo de transformação do Museu Paulista, iniciado em 1917, que marcou profundamente a sua carreira. Em 1946, ano em que foi aposentado compulsoriamente por ter chegado aos setenta anos de idade, a singela Seção de História, "prima pobre" da imponente Seção de Zoologia criada por Hermann von Ihering, terminava por dominar a instituição popularmente chamada de Museu do Ipiranga. A ligação umbilical entre Taunay e "seu" museu - o qual funcionava como extensão quase natural de sua atividade intelectual ao viabilizar a reunião de seus diletos documentos e a publicação dos resultados de suas pesquisas - tornava a separação entre eles simplesmente impossível. O historiador nada seria sem sua criatura, escreveu a museóloga Maria José Elias em tese acadêmica sobre a trajetória da instituição da colina do Ipiranga. Criatura que tinha entre seus membros o Museu Republicano "Convenção de Itu".

Afonso de Taunay e a revisão da historiografia brasileira

Entre 1924 e 1930, num período de apenas seis anos e sem descuidar das exigências da direção do Museu Paulista, Taunay publicaria os seis primeiros tomos de sua História Geral das Bandeiras Paulistas. Em 1936 saía o sétimo volume e entre 1946 e 1950 os quatro últimos. Foram ao todo onze volumes, em vinte e seis anos de trabalho. Taunay escreveu-os com uma constância, fidelidade e capacidade dignas da maior admiração, promovendo um alargamento tão grande e extraordinário das perspectivas e do conhecimento da nossa história como poucos capítulos podem apresentar. Neles se encontra uma das maiores revisões fatuais na historiografia brasileira. A crise radical da nossa continuidade histórica, criada pelo esquecimento do bandeirismo, foi em grande parte vencida pela contribuição dessa obra. Desde já se pode dizer que, com a História Geral das Bandeiras Paulistas, Taunay fez crescer o mundo espiritual de nossa herança histórica, reconheceu José Honório Rodrigues.

No discurso de recepção pronunciado na Academia Brasileira de Letras, Taunay explicava que o desafio daquela empreitada fora proposto por Capistrano de Abreu, nos Capítulos de História Colonial - Ao generoso ultimato obedeci. Assim me dispus a uma empresa que apenas vale pela exigência árdua do labor, a fidelidade da consulta às fontes e o desejo de servir à verdade. Pois a narrativa da dilatação do Brasil pelos paulistas, avassaladores de milhares de quilômetros quadrados, que por direito de bulas e tratados, deviam ser castelhanos, é tentame cujas dimensões cada vez mais se alarga e exige, para a sua explanação, o concurso de muitos trabalhadores animosos e encarniçados ao trabalho, disse na ocasião o grande historiador.

Afonso de Taunay e o Museu Republicano

A imensa obra de Taunay tem sido exaustivamente estudada, descrita, criticada e valorizada por diversos autores. O rol de sua produção foi esmiuçado, por exemplo, em oitocentos e trinta e três verbetes da bio-bibliografia escrita pelo historiador Odilon Nogueira de Matos.

Aos ituanos, contudo, é também oportuno lembrar que foi justamente naquele período de produção de parte significativa da História Geral das Bandeiras Paulistas e de satisfação das pesadas exigências do projeto de redirecionamento do Museu do Ipiranga à sua vocação de museu de história, que Afonso de Taunay levou adiante o projeto de implantação do Museu Republicano "Convenção de Itu".

É bastante simbólica a decisão de o poder público paulista entregar a Taunay, e não a outro estudioso qualquer, a tarefa de organizar o museu criado em 1923. Longe de ter sido pensado como um museu da história republicana ou do movimento republicano, a instituição ituana fora idealizada como o Memorial da Convenção de 1873. Mas, mesmo nesse caso, era preciso de uma direção e da definição de uma política cultural. A escolha de Taunay desvela as ligações do historiador não apenas com o presidente de São Paulo, Washington Luís, mas também com a máquina política do Estado e com o PRP - Partido Republicano Paulista. Em todo o caso, o desafio de materializar um projeto museográfico na "boca do sertão" vinha ao encontro de sua opção pelo sertão enquanto objeto historiográfico. Tanto que datou de Itu o prefácio do oitavo volume da História Geral das Bandeiras Paulistas, cujos três últimos capítulos tratam do povoamento do solo paulista. O que a elite dirigente paulista que o nomeou para o posto não tinha previsto era o tamanho da paixão que Taunay investiria no cumprimento da missão. A ponto de, no leito de morte, em 1958, referir-se à instituição ituana como "a menina de meus olhos".

A organização e o funcionamento do Museu Republicano exigia de Taunay a constituição de uma equipe de servidores e a definição de critérios para a sua composição. Aos poucos, fez amizades em Itu e descobriu as pessoas que o ajudariam no projeto: Evaristo Galvão de Almeida, Isa

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