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Publicado: Sexta-feira, 19 de maio de 2006

A virada

Para mim, foi uma noite diferente; diferente mesmo. Não me lembro de uma noite igual a essa nas últimas cinqüenta e três vezes que mudei de um ano para outro. Sem bebidas, sem festas, muita chuva, cansaço e preguiça. Pela primeira vez, só ouvi ao longe os ruídos das festas de fim de ano. Sem vinho, uísque, peru, leitoa, lentilha, roupa branca etc, resolvi passar de um ano para outro lendo um livro. Não só naquela noite, mas nos dois dias seguintes. Acabei lendo dois e meio e não só um; agora, estou para terminar a leitura do terceiro romance.
A questão é que nessa mudança de ano não fiz a famosa contagem regressiva, não bebi champanhe, não cumprimentei familiares, não fiz uma ótima refeição. Apenas li e dormi bastante. E, depois de dois dias, bem-vindo de volta ao cotidiano! E estou com uma boa sensação e bons prognósticos para esse novo ano.
Ah... eu ia me esquecendo dos livros! O primeiro deles, que li de um só fôlego, é o último romance do colombiano Gabriel García Márquez: "Memória de minhas putas tristes". Vale a pena ler a divertida história de um velho que, ao completar 90 anos, acaba se apaixonando por uma garota virgem que se inicia na prostituição. A cena do velho andando de bicicleta e cantando "com ares do grande Caruso" nos mostra a que os sentimentos nos expõe quando estamos amando.
Depois desse, comecei e também terminei bem rápido, um outro livro, agora de características bem diferentes das do primeiro, mas igualmente interessante. "O enigma de Sally" é o título desse romance, escrito por Phyllis Dorothy James White, escritora inglesa que depois de ter trabalhado na Cruz Vermelha durante a Segunda Guerra Mundial, no Serviço de Segurança Britânico e também para o Departamento de Polícia, estreou na literatura aos 42 anos, tornando-se uma grande escritora de romances policias. A história em questão trata da morte de uma jovem, empregada da casa e mãe de um menino, assassinada horas depois de anunciar seu casamento com o filho da família de aristocratas ingleses. Rapidamente ingressamos na trama e passamos a viver o dia-a-dia da família Maxie e dos seus amigos durante as investigações encabeçadas pelo detetive Dalgliesh.
Agora, para encerrar esse período de boas leituras, estou da metade para o final de um terceiro: "O júri". Não me lembro agora do nome do autor americano. Não sei se são as minhas vontades, mas também o estou achando muito bom. Valeu a pena ter passado de um ano para outro com esses temas em mente.
Mas, não se preocupem, não deixei de fazer as minhas reflexões. Para não dizer que a virada passou em branco, quando o relógio indicou meia noite, dei uma parada e coloquei-me a pensar um pouco na vida, como sempre faço nesses períodos. Apenas abandonei temporariamente aquela comemoração tradicional. Continuo apostando na importância das reflexões de fim de ano. Tanto, que até busquei, também para ler, esse pequeno texto: "Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar, que daqui para diante vai ser diferente". Li o texto e, por alguns instantes, fiquei pensando como Drummond, aproveitando a magia do momento para refletir sobre os últimos doze meses; repensar sobre os objetivos e metas traçadas; e recomeçar, a luta e a caminhada.
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