Publicado: Quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007
A tamareira da imperatriz
Sou obrigada a continuar pela seara da última crônica, pois eis que um desses “Quixote” incansáveis na defesa do legado histórico ituano trouxe mais uma notícia desalentadora para aumentar a lista de perdas irreparáveis, provocadas pelo desrespeito e pela mais absoluta ignorância que prospera por estas bandas.
Na semana passada, a tamareira já centenária da Praça D. Pedro I foi abatida com golpes de moto serra, deixando apenas um toco, testemunha da sandice perpetrada.
Seria apenas mais uma burrice lamentável se não fosse um detalhe, que torna mais grave o ocorrido, pois há um fato ou “causo” histórico que deveria ser considerado e valorizado.
Conta-se que a muda da extinta tamareira foi presente da Princesa Isabel a proeminente dama ituana que empreendeu viagem a capital do Império, para retribuir a visita que a imperatriz havia feito a sua casa (hoje conhecida como Casa Imperial). Das cinco mudas ofertadas, esta era a única que restava. Merecia melhor sorte, quem sabe até uma pequena placa registrando sua história.
Em tempos que a discussão ambiental toma ares de catástrofe antecipada, a tamareira é o exemplo acabado da nossa rala sensibilidade para com a matéria prima que nos alimenta e que poderia nos salvar do obscurantismo cultural no qual estamos atolados.
Perdeu-se, junto com o verde da tamareira, a oportunidade de recuperar a memória do causo e acrescentar mais um ponto de visitação e exaltação da história ituana, coisa que qualquer cidade que leve a sério o turismo já teria feito há muito.
Parece que é dessa forma que marchamos rumo ao quarto centenário, de relógio e moto serra em punho, vamos garbosamente, destruindo o passado e o futuro, de uma tacada só.
E o tal relógio também é assunto ingrato, impossível ignorar sua triste figura em frente ao maior exemplar do período barroco paulista, a Igreja Matriz de Nossa Senhora Candelária. Que contraste infeliz!
Bem que tentei fazer vista grossa, desviar o olhar, fazer de conta que não me importo, mas não dá, o “relógio dos quatrocentos anos” caçoa abertamente, na praça central, da orgulhosa cultura ituana. Dá uma banana (desculpem a imagem tosca) para o que tudo aquilo que tem a pretensão de comemorar.
Sem querer ferir suscetibilidades, esperava passar o desgosto com o medonho ícone, quando soube do “arvorecídio” da tamareira da imperatriz.
Aí foi demais, mesmo sabendo que haverá narizes torcidos e beiços caídos pela crítica, é preciso refletir acerca do que estamos fazendo pela preservação dos bens que representam nossa identidade e que expressam de maneira concreta o significado da nossa história.
Do jeito que vai, pouca coisa restará para a tal grande festa dos quatrocentos anos.
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