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Publicado: Quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

A nossa Santa Casa de Itu

Crédito: Google Imagens A nossa Santa Casa de Itu

Tudo começou há mais de cinco séculos, quando em Lisboa, Portugal, no final do século XV firmou-se o primeiro compromisso da Irmandade de servir aos mais necessitados da sociedade nos campos da saúde e educação. Esta instituição nascente, se expandiria para dezenas de países colonizados pelo império ultramarino português.

Aqui em solo ituano, a Irmandade começou a ser idealizada apenas em 1837 em função das precárias condições em que se encontrava o Hospital dos Lázaros que existia desde 1806, por obra do Padre Antonio Pacheco da Silva. A comissão escolhida elaborou os primeiros estatutos de um Hospital dos Morféticos. (Portadores de Lepra.)

Um ano depois, em 1838, aconteceu a primeira doação feita pelo Capitão Caetano José Portella que iniciou efetivamente a instituição da Irmandade. A ela seguiram-se numerosas doações da rica sociedade ituana da época, considerada a cidade mais rica e populosa da Capitania de São Paulo, a que mais contribuía com tributações e captações, o maior centro produtor de açúcar do Primeiro Império e de parte do Segundo, e grande centro produtor de algodão, sendo esse último o responsável pela fundação da primeira fábrica de tecidos movida à vapor no Brasil, a Fábrica de Tecidos São Luiz. Ainda nesse ano a Câmara Municipal aprovou a “creação de um Hospital de caridade para Asylo dos desgraçados”.

Em função das volumosas contribuições, o terreno foi comprado e as obras tocadas em ritmo acelerado, até que em 1840 foi eleita a primeira Mesa Administrativa da Irmandade, tendo como primeiro Provedor o Capitão-Mor Bento Paes de Barros, que seria depois o Barão de Ytu.
Apenas em 1842, a Vila de Itu foi elevada à categoria de cidade.

Dom Pedro II foi o mais ilustre visitante das obras do hospital, fazendo-o em 1846 e deixando um donativo de três contos de réis.

Sendo o “Hospital de Caridade” uma obra de caridade cristã, o primeiro passo foi construir em 1853 a Capela de São Joao de Deus, sendo a imagem trazida de Gênova, Itália.

Inaugurado em 1867 o Hospital passou a contar com os serviços de enfermagem das Irmãs de São José de Chambéry que aqui chegaram em 1869 após contato da Mesa Administrativa da Irmandade com a Irmã Maria Theodora Voiron, superiora do Colégio Nossa Senhora do Patrocínio, grande vulto da caridade e da história ituana. A história registrou que foram quatro, os primeiros doentes pobres atendidos, ainda com a obra inconclusa.

Estando o campo da saúde satisfatoriamente atendido, em 1924 a Irmandade dirigiu seus esforços para a Educação. Assim, nesse ano foi inaugurado o Instituto Borges de Artes e Ofícios, o Lyceu, graças ao legado de Joaquim Bernardo Borges, consolidando-se a elevada vocação da Irmandade de trabalhar pela saúde e educação dos mais pobres.

Fato marcante, dentre tantos, aconteceu em 1930 quando foi inaugurado junto ao hospital um pavilhão para servir de residência às irmãs de São José, como uma forma de retribuição parcial pelos heróicos serviços de enfermagem prestados para os mais carentes por quase um século.

Muito mais do que uma instituição cristã de caridade para saúde e educação dos necessitados, a Santa Casa de Itu representa um modelo de instituição medieval, que surgiu já no alvorecer do Renascimento e da Idade Moderna, quando Portugal vivia o período que marcou o auge de sua expansão marítima e a sociedade portuguesa da época reservava um lugar central para a religião. Estado e religião formavam um todo. A respeito disso, disse o historiador medievalista Jacques Le Goff que: “a Idade Média era uma sociedade em que toda a consciência é uma consciência religiosa”.

Essas Irmandades ou Confrarias surgiram na Idade Média numa iniciativa de regulamentar o trabalho dos mestres e seus aprendizes. O conceito teológico e prático de Misericórdia foi declarado por São Thomas de Aquino no século XIII em sua obra SumaTeológica.

Historiadores que se debruçaram sobre o assunto afirmam que o primeiro compromisso de instituição de Misericórdia foi firmado em 1499 no reinado de D. Leonor. Até o ano de 1525, quando morreu a rainha D. Leonor, já existiam 61 Misericórdias por toda a colonização portuguesa, na América, na África e na Ásia. Entre 1525 e 1599 foram fundadas outras 51.

Disse o historiador da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Ivo Carneiro de Souza que: “As Misericórdias tornaram-se ainda no século de Quinhentos, presença assistencial e confraternal permanente, praticamente oficial, desdobrando-se em muitas atividades de apoio a pobres, indígenas, órfãos e desprotegidos, gerindo hospitais e albergarias, recolhendo esmolas, promovendo funerais, ajudando presos e condenados, organizando saídas processionais e manifestações religiosas impressionantes na sua dimensão. Suas Mesas Administrativas e Provedorias eram disputadas pelos grupos mais influentes da sociedade.”.

Já o historiador Fernando da Silva Correa afirma que um dos principais motivos da implantação de Misericórdias foi o apoio assistencial e religioso aos presos, inclusive àqueles que ficaram cativos nas ações de conquistas do império português, uma vez que a expansão portuguesa produzia novas e diversas formas de desgraçados e mesmo morte de homens portugueses nas viagens de conquistas, deixando para trás mulheres e filhos sem proteção e ainda tratavam do resgate de portugueses feitos prisioneiros.

Resumidamente, os deveres das Misericórdias eram sete: 1. Dar de comer à quem tem fome. 2. Dar de beber à quem tem sede. 3. Vestir os nus. 4. Visitar os doentes e presos. 5. Dar abrigo à todos os viajantes. 6. Resgatar os cativos. 7. Enterrar os mortos.
A instituição Misericórdia chegou ao Brasil no século XVI , com o Império Colonial Português, inaugurando a primeira Santa Casa em Salvador, Bahia, em 1550.


Professor EDSON BONI

Fonte principal: História da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Itu, 1940-1990 – Coordenação e redaçãoJonas Soares de Souza, Roney Cytrynowicz – São Paulo – Narativa Um, 2004.

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