Colunistas

Publicado: Sexta-feira, 4 de março de 2011

A culpa diluída

Num dos últimos encontros com a misericórdia divina, através do sacramento da penitência, o atencioso sacerdote teve uma expressão marcante ao final, por dizer que, naquele ato, ocorrera a morte do pecado e a ressurreição da graça.

Uma palavra oportuna e de inspirado conforto e paz, porque efetivamente toda culpa é apagada de vez.

Perdeu-se no tempo o costume da confissão frequente. Como um único exemplo, haveria tantos, quem não se recorda de quando se formava uma fila imensa no corredor da Igreja do Carmo, no sábado, véspera da comunhão mensal dos marianos.

Bem por isso, sempre que surge a oportunidade, nos escritos deste modesto cronista, tem-se aproveitado para realçar as excelências do perdão. Aliás, daqui a pouco, entra-se já no clima de Quaresma, tempo propício ao recolhimento e à meditação.

O desaparecimento do pecado é de efeito cabal e completo. Expressa-se plenamente, porque Jesus não se serve da moda humana de passar um risco ou de inscrever um xis em cima do erro. Não. Ele é apagado por completo, some, tão definitivamente, que é como se nunca tivesse acontecido.

A culpa se dilui.

Já os homens entre si, o ser humano, por mais que reatem vínculos, guardam, quase sempre, no fundo do coração, ainda que disfarçadamente ou quase sem o perceber, um certo ressentimento contra o próximo, mesmo quando lhe perdoa o mal feito a si.

A confissão auricular, que outra fórmula não hà, contempla o penitente, se naquele momento estiver deveras arrependido, mesmo porque à falta de uma contrição dele, os efeitos do sacramento não se operam. Repercute inútil, outrossim, o dizerem-se alguns, arrogantemente, que se confessam diretamente com Deus.

Em termos de contrição, há duas modalidades, tanto uma como outra suficientes para a validade do ato. Contrição imperfeita, quando se o faz por receio das penas do pecado e possível condenação; perfeita, quando a pessoa se confessa principalmente porque ofendeu  a Deus, o supremo bem.

Feitas estas breves considerações, transporte-se o conteúdo para o ambiente meramente comum do dia a dia, nas múltiplas espécies de relacionamento.

Isto porque, às pessoas, se se confessaram com vontade definida de retorno ao regaço divino, de amorosa misericórdia, nunca mais se lhes há de ocorrer cuidado, preocupação ou temor de que as faltas passadas sejam por outrem comentadas ou verberadas. Nenhum direito assiste à pessoa alguma de execrar erros e senões cometidos por alguém, ainda mais quando ela fora já inteiramente revigorada pelo efeito salutar da graça. Pura maldade comprazerem-se por evocar abertamente ou aos cochichos, os tropeços de quem quer que seja. Perante tais situações, avulta o veredito do Mestre, instado a se definir diante de uma pecadora pública. Perpassou um olhar entre os circunstantes, cujos pecados escrevera no chão, e os conclamou: “Atire a primeira pedra...”

Não obstante a correção da terminologia teológica, que se refere a este sacramento também pela sinonímia de Tribunal da Penitência, pode-se com com essa denominação impressionar pessoas menos informadas, por compará-la, tal expressão, com a rudeza dos tribunais judiciários, ainda mais em tempos destes, tão desacreditados. No Tribunal da Penitência, ambas as partes se empenham num sentido igual, o da busca e efetivação, da libertação enfim do coração contrito. Em havendo arrependimento e propósito sincero de não pecar, consciente embora o homem de sua fragilidade, a bondade infinita de Deus vai também diretamente na sua direção, no mais perfeito e feliz dos encontros.

De pleno acerto, - em suma – o conceituar-se que, enquanto o arrependimento anda, o perdão voa. 

Comentários