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Publicado: Quinta-feira, 23 de março de 2006

A Caminho de Itú

“AS SEMENTES DO SEMEADOR E AS ENIGMÁTICAS PEDRAS DE CABREÚVA”

Um dia o Criador, Sapientíssimo,
Grande Arquiteto, Semeador de Amor por excelência
Saiu amoroso a semear
E, no terreno naturalmente agreste, ou sobrenatural,
Semeou múltiplas sementes e entre elas microcósmicas e pequeninas pedras ao azar, como a brincar,
Fertilizando e enriquecendo o solo sáfaro, invulgar, pois para o Grande Arquiteto a terra era toda una, embora irregular mas igual ao seu desígnio e propósito secular.
Porque o campo imenso teria sido porventura um paraíso, mesclado parcialmente por
ávara terra, inópia, indigente, volúvel, árida e seca,
mas fértil de infortúnio, carente de virtudes vitais,
ou acaso expressão gritante de incógnita empedernida,
brotaram no entanto viçosamente de sua voluntariosa, soberana e santa semeadura, abrupta e assoberbadamente,
mostrengos maciços, enormes e tremendos volumes graníticos, pedregulhos a granel.
Isto, claro, acontecia no começo mais primitivo e antigo dos tempos, nos primórdios da história geológica,
Em eras não herdadas, nem aradas, nem laboradas, quando o tempo não contava e a Terra só o Semeador que a criara,
a conhecia e a Ele somente pertencia. Portanto só Ele a gerenciava e dela disponía em Seus desígnios insondáveis.

Hoje, passados tantos históricos milênios de esquecidas, ignoradas ações e convulsões, ao passar pela estrada e passear pela tarde excepcionalmente cálida quanto amena, vimos a seara, a pétrea safra, assim, a brotar pujante onde a semente caíra,
dadivosamente exposta nos patamares e encostas da natureza ondulante, às margens da estrada esguia e curvilínea,
percorrendo a campina verde-musgo, serpenteando-a velozmente pelo traçado de asfalto negro,
liso, quente e sempre sorpreendente.
Fartámo-nos de ver e admirar pedras de todos os tamanhos, mágicas formas, maciços colossais e pedregulhos às centenas, aos milhares e milhares, compondo, decorando as laterais com estética cósmica própria, numa paisagem lunar singular.

É nessa empedernida e extensa campina, por onde sobrepassam ligeiros, sempre aos pares,
escondendo esgares de admiração, inquietos e esguios olhares, nem sempre lúcidos, nem cônscios,
sem ver verdes nem pomares, muito menos Vênus ou Antares,
sobre morros, acidentes e grotões,
de onde brotam e jorram das entranhas dessa terra estranha indizível
córregos em espelhos, fios de água límpida
serpenteando gaiteiros, cascalhando cantos de pureza divina,
surgindo espontaneamente por entre arbustos e pedras,
soltando-se libertos musicalmente aos borbotões.

Ali, debaixo da bigorna de um sol tórrido implacável,
Refrescada a pele, saciada avidamente a sua sede,
Campônios rudes, embrutecidos pelo meio limitador,
Humildes e simplórios vilões, humanos seres, herdeiros legítimos da mesma semente vital
que os criou à semelhança do seu criador, tornando-os "independentes",
esforçados e teimosos lutadores, vitalizam-se, entregam-se, labutam, lavram
seus campos de pedra granítica,
lascando-a, lapidando-a a malho, a talho, cunha, unha, músculo, ritmo e rios de suor,
voluntariosamente burilando a pedra bruta
da forma mais sáfara e dura, insana mas pura,
que é, ao mesmo tempo sua única visão, seu fito e ambição,
sua razão, amor, seu pão, sua vida, gratidão, seu galardão
e diária cicuta.

Quão diversas e estranhas ilações dão os frutos das múltiplas searas e profícuas sementes,
Lançadas com inegável amor, pelos desígnios do Supremo Criador, Semeador ! . . .

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