21 de Abril - O sufocado grito da Inconfidência
Falta de fé ? Fidelidade? Ou arrojada vontade a criar civilidade?
Eram os ares do novo mundo
a que já nenhum poder podia mais corromper ! . . .
Foram ilusões, certezas, insanas lutas,
longos e maquinados sonhos de grandeza
e liberdade, aspirações sinceras, emulação ou puras ilações, visões proféticas a sugerir novas nações ? . . .
Foram valores, valores, valores sim, caldeados enfim em bolores e fulgores de angustiada , infinita e ansiada espera ,
germinados sigilosa e sub-repticiamente em cadinho
de horrores indescritíveis, deglutidos no burburinho de vozes, de cheiros fortes e odores brotando espontâneos de poros e suores de gente colorida,
sofrida, brutalmente hostilizada e ferida no mais íntimo , ínfimo e magno valor ou virtude, insultada no seu ego natural e na massa musculosa e forte submetida ao tronco e grilhões, da senzala. Dores morais, imorais, sutis, dores físicas, frias, finais, febrís, reais, intermináveis. Dores incríveis, mitigadas apenas na bondade da fé, no olhar carinhoso e conformado da mãe preta, voz lacrimosa, entoação dolente, olhos na cruz sacrificiante, suplicantes à
gratidão de poucos justos e de alguns inconfidentes, na ilusão de lealdade a ideais ou esperanças ao perdão da própria culpa, culpa de não saber de que culpa se culpavam. E a derrama? A frustração ao saber que a derrama já não se derramaria e o sofrido povo não se levantaria . . .
Foram chicotadas e chicotadas de chicotes, crueldade trespassando carnes e respingando sangues sobre olhares e faces hirtas, de olhos esbugalhados, incrédulos, corações exaltados a desgarrar-se sem atinar ao certo se era dantesco castigo aberto à alma sofredora, - tão perto de outras almas gêmeas compungidas a repelir no íntimo essa barbárie e a testemunhar silenciosa ou em névoa de lágrimas, gritantemente ao vivo, ou ainda em contrito segredo, o indizível, - ou postigo a trancar para sempre consigo aspirações da mente e corações libertos? Se a única aceite e indiscutível verdade era a do dono, senhor dos corpos, dos metais e consciências, a fazer das aparências o gáudio de suas Excelentíssimas Excelências , não restava mais o mínimo de nada , que o grito cristalino, belo e glorioso da Inconfidência , arrancado tão bravamente à carne e alma dos oprimidos que sofrem e clamam desde sempre ao infinito:
“LIBERTAS QUAE SERA TAMEN”