Cultura

Publicado: Quarta-feira, 23 de março de 2011

Molek Freak! Um grito pela cultura das ruas

Conheça a história de Erick Hermes, Bboy da Fundação Casa.

Crédito: Renan Pereira / Itu.com.br Molek Freak! Um grito pela cultura das ruas
Molek Freak bateu um papo com a equipe do Itu.com.br e contou alguns momentos interessantes da sua longa trajetória no mundos das artes

Por Renan Pereira

“Você só dança mesmo... não trabalha?”. Essa é uma pergunta que o arte-educador Erick Hermes, conhecido simplesmente pela alcunha “Molek Freak”, cansou de ouvir ao explicar a sua profissão para as pessoas que não o conhecem. Atuando como professor de break na Fundação Casa de Sorocaba (antiga Febem), o B.boy ituano tem levado a cultura da dança de rua a dezenas de jovens que se encontram em fase de reabilitação por terem cometido algum crime.

Conhecido no município e no meio artístico devido à organização de vários eventos voltados à cultura hip hop, Molek Freak começou a dançar em 83, quando ainda era criança. “Naquela época não tínhamos muitas referências, então nos inspirávamos em alguns caras dançando na TV e tirávamos alguns passos de um e outro. Aí montávamos as nossas próprias coreografias”, conta o artista que, assim como a grande maioria dos dançarinos brasileiros, sofreu influências do Rei do Pop, Michael Jackson; do Papa do Soul, James Brown; e do badalado filme Flash Dance.

Os anos foram passando e o break, assim como todas as outras danças originadas a partir da cultura urbana, foi se profissionalizado cada vez mais. O boom da Internet e a popularização do hip hop e do rap no Brasil (em meados dos anos 90) fizeram com que o movimento, até então restrito a poucos idealistas, ganhasse de vez as ruas e fizesse definitivamente a cabeça dos adolescentes. “Até 97 ninguém sabia nada no segmento de dança de rua porque não havia informação. A gente só começou a dançar de verdade quando o grupo nova-iorquino Rock Stead Crew veio ao Brasil fazer uma apresentação em um teatro de São Paulo... Hoje as coisas se tornaram mais fáceis e as coreografias bem mais complexas”.

O processo de massificação, no entanto, trouxe pontos positivos ao desenvolvimento do break e companhia: a descriminalização social do movimento. “Antigamente era pior. Éramos vistos como marginais pela sociedade. É verdade, porém, que a rixa entre determinados grupos contribuiu com essa visão distorcida. Até o início dos anos 90 a gente andava armado e arrumava brigas com outras gangues do break [como eram chamadas na época] para obter espaço.”

Freak realizou parte de seu sonho ao conhecer São Paulo em um período de sua vida e se envolver com algumas personalidades renomadas da cultura hip hop, como Alambeat (Sampa Crew) e Nelson Triunfo – um dos precursores da dança de rua no país. Em 2006, com o objetivo de movimentar a cultura no interior do estado, o B.boy organizou o primeiro festival de dança de rua em Itu, realizado na Associação Atlética Ituana, que fez questão de "comprar a ideia". 

Rapidamente o projeto ganhou a cena, conseguiu apoiadores e se estendeu para os anos seguintes. O Inter Itu B.boys, como ficou conhecido, foi responsável por trazer grandes nomes do cenário independente à cidade. O crescimento do festival, no entanto, fez com que a estrutura financeira exigisse cada vez mais. “Passamos por uma fase negativa. A falta de apoio exigiu que déssemos uma pausa na realização do evento em 2009. Infelizmente falta investimento no setor cultural dessa cidade. De qualquer forma, pretendemos voltar com tudo de agora em diante”, explica.

Projeto Fundação Casa

Sobre a experiência que tem vivido na Fundação Casa, Molek Freak conta que tem sido algo compensador. “Os meninos adoram dançar, fazer acrobacias, e têm um grande respeito pelo nosso trabalho. Também vivi nas ruas e sei como o sistema funciona, cara. Uma criança que cresce praticando algum tipo de atividade decente tem bem menos chances de se envolver com o crime. Os seres-humanos têm que absorver cultura, seja qual for, quando ainda são pequenos. Uma pessoa sem cultura é uma pessoa doente! Fico feliz por atuar dessa forma e ajudar na melhoria do nosso país”.

Apesar do otimismo, o B.boy conta sempre com os seus momentos de reflexão e questionamento. “O dinheiro que chega para a cultura no interior do estado parece não funcionar. Existem vários projetos bonitinhos por parte da prefeitura, mas ninguém quer saber de cuidar da nossa periferia, que é onde mais temos que agir”, pondera. “Em breve pretendo ir embora para São Paulo ou até mesmo me mudar do país. Infelizmente aqui somos pouco valorizados”, desabafa.

Rede Globo
Assista a apresentação de Molek Freak no 'Se vira nos 30'

Se vira nos 30

Uma participação no quadro “Se Vira nos 30”, no programa da Rede Globo “Domingão do Faustão”, tornou o agente cultural de Itu ainda mais conhecido. Junto com o parceiro de dança, B.Boy Neguinho, Molek Freak apresentou um dos seus números e fez bonito (confira o vídeo ao lado). A passagem teria sido só mais uma pelo programa, se não fosse a história engraçada que ambos viveram no dia da apresentação.

“Perdemos o primeiro voo que eles mandaram para nos levar até o Rio. Ficamos dançando dentro do aeroporto e nos esquecemos do horário. Quando caiu a ficha ligamos para os caras e contamos sobre o ocorrido. Daí eles ficaram um pouco bravos a princípio, mas deram um jeito da gente embarcar em seguida”. Pasmem! Isso é o que eu chamo de amor à profissão, caros internautas!

Molek Freak! Um grito pela cultura das ruas

Nos tempos da São Bento

Molek Freak participou recentemente da gravação de “Nos tempos da São Bento” – documentário que tem o objetivo de resgatar a memória dos personagens que fizeram história no hip-hop, ocupando por vários anos o espaço do Metrô São Bento, no centro da cidade de São Paulo.

“Minuciosa, a estrutura discursiva do documento nos leva ao conflito com o esquecimento. É justamente este conflito, apresentado através do exercício da narrativa, que se transforma em ação dramática, onde a personagem principal é a memória coletiva”, diz o texto de divulgação do vídeo.

Além do arte-educador ituano, o material conta com entrevistas de figuras renomadas do movimento: Mano Brow do Racionais MC’s (foto); Dj KLJ; Doctor MC’s e Thaide; Alanbeat (Sampa Crew).

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