Opinião

Publicado: Quinta-feira, 2 de julho de 2015

Filhos em famílias com casal do mesmo sexo

Por Ilan Tabak Aviram.

Filhos em famílias com casal do mesmo sexo
"(...) também entre casais do mesmo sexo, seja de dois homens ou duas mulheres, a criança pode receber o conjunto de componentes parentais que precisa para se desenvolver."

Em todo o mundo, vem crescendo a formação da chamada nova família, composta por casais do mesmo sexo. Quando esses novos casais optam por um filho, surge uma série de dúvidas e de receios. O fato de dois pares serem do mesmo sexo será traduzido em falta para a criança e em um desenvolvimento deficiente? A preferência sexual dos pais influenciará, no futuro, na preferência sexual da criança? Essas são algumas das preocupações.

Quase todo casal homossexual que tenha decidido por filhos lida com esses dilemas antes até de começarem os longos e exaustivos processos para tê-los. Parentes, amigos e pessoas próximas compartilham as mesmas dúvidas. Elas também querem saber como essa célula familiar funcionará e se criará um ambiente propício para a formação de boas crianças.

Há mais de duas décadas, um grande corpo de estudos segue crianças que crescem em famílias homoafetivas. Os estudos mais antigos acompanharam crianças que nasceram em casamentos heterossexuais, mas seguiram a criação em uma nova concepção de família, com o pai divorciado e, então, com relacionamento com alguém do mesmo sexo.

Outros estudos também analisaram crianças que já nasceram dentro de uma relação homoafetiva, inclusive com o acompanhamento de todo o desenvolvimento, até elas se tornarem adultas. Todos os achados são conclusivos e indicam que não há diferenças claras nos indicadores de saúde psicológica, desenvolvimento cognitivo e emocional e desempenho na escola entre crianças que cresceram em famílias homoafetivas e crianças que cresceram em famílias convencionais, com pai e mãe.

As pesquisas mostraram ainda que crianças que cresceram em famílias homoafetivas não tendem a desenvolver uma orientação sexual homossexual em uma proporção diferente da população geral, ao contrário do preconceito que supunha isso.

Independentemente da constituição da família, para que o desenvolvimento da criança aconteça de modo normal, entende-se hoje que a mesma precise receber dos pais coisas maternais e paternais, o que não necessariamente estão ligadas ao sexo dos mesmos.

Um sinal claro dessa afirmação é que mesmo em famílias heterossexuais, pode-se encontrar um pai que é visto por seus filhos como uma figura amorosa, mais gentil e receptora, o que geralmente é identificado com a função maternal, enquanto a mãe é quem impõe limites, empurra para o sucesso e encoraja a curiosidade e a independência, o que comumente é identificado com a função paternal. Por essa razão, também entre casais do mesmo sexo, seja de dois homens ou duas mulheres, a criança pode receber o conjunto de componentes parentais que precisa para se desenvolver.

Além do desenvolvimento da criança não ser em nada prejudicado, a sua identidade sexual também não é, de forma alguma, afetada. O medo de que o crescimento em outro modelo de família influencia na orientação sexual da criança não tem base. Essa identidade não se fundamenta na imitação dos pais, mas em um elemento nato sobre o qual se desenvolve a orientação sexual do adulto.

Mesmo assim, ainda se mantém a pergunta: a falta de uma imagem materna ou paterna influenciará na consolidação da identidade e no desenvolvimento da criança?

Freud descreveu o triângulo edipiano, pelo qual a criança se apaixona pelo progenitor do sexo oposto e quer ficar perto dele, mas no final aceita o relacionamento dos progenitores e se identifica com o progenitor do mesmo sexo. De acordo com o Pai da Psicanálise, esse processo forma a identidade da pessoa e é essencial para um desenvolvimento normal.

Desde então, muita coisa mudou. A forma de ver as coisas se atualizou. Hoje em dia, se enfatiza a necessidade da criança ter dois pais diferentes um do outro, mas não necessariamente no sexo, e sim na personalidade e no tipo de relacionamento criado com ela. Como exemplo, um menino que tenha duas mães pode criar um relacionamento amoroso com a mãe que ficou com ele em casa depois do nascimento e o amamentou, enquanto que a outra mãe é "a pessoa diferente", que desperta a sua curiosidade e talvez também represente o foco de galanteio e interesse. E essa é a essência do triângulo tão necessário para o desenvolvimento emocional e intelectual, bem como para o entendimento de relações no mundo.

A paternidade/maternidade homoafetiva é rica e provê todas as necessidades da criança. Isso é inquestionável. Vale ressaltar, entretanto, que há diferenças biológicas indiscutíveis entre os sexos. A sensação do contato do corpo feminino, por exemplo, é completamente diferente do contato do corpo masculino e dois homens, mesmo se esforçando muito, não poderão fornecer a sensação de envolvimento do abraço feminino, da mesma forma que um casal de mulheres não poderá fornecer a rispidez e a segurança especial do abraço masculino.

É aí que entram em ação as figuras do círculo íntimo de relações, como avô e avó, tia ou tio, e também bom amigo ou amiga. A presença dessas figuras na vida da criança é importante e pode suprir a sensação do contato que falta. No futuro, elas também poderão ser o endereço para conversar sobre assuntos diferentes e íntimos que um adolescente gostará de ter com um adulto do mesmo sexo. Este fato fortifica, é claro, a necessidade do suporte e do envolvimento da família e dos amigos no círculo íntimo no processo de maternidade e paternidade de gays e lésbicas.

Há que se afirmar, por fim, que no relacionamento entre pais e filhos haverá algum tipo de falta e que isso é inerente ao tipo de concepção de família.Mesmo com os melhores pais e mães, sempre haverá elementos faltantes. Como acontece na maternidade e paternidade heterossexual, a homoafetiva não conseguirá apagar completamente da criança a pergunta se ela perdeu algo na célula familiar especial na qual nasceu. Os pais precisam esperar que seus filhos lidem com essa pergunta e não se assustem com essa situação, vendo nela um testemunho de fracasso.

Ao contrário. A capacidade de, no futuro, quando as crianças crescerem, falar sobre o assunto de forma aberta e honesta só torna a ligação mais forte e poderosa. Se uma família tem amor, consciência própria e capacidade de se comunicar e conversar, a normalidade vencerá todas as dificuldades.

A maioria dos pais homoafetivos chegam ao momento da decisão por filhos depois de levantarem todos esses questionamentos e de se prepararem com o máximo de zelo. Somente assim podem se considerar aptos, tanto ou mais que os pais he

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