Cultura

Publicado: Quarta-feira, 25 de maio de 2011

Adoção: uma gestação de anos

Há nove anos é comemorado em 25/05, o Dia Nacional da Adoção

Adoção: uma gestação de anos
Há nove anos é comemorado oficialmente o Dia Nacional da Adoção, em 25 de maio

Por Marília Monteiro

Há nove anos é comemorado oficialmente o Dia Nacional da Adoção, em 25 de maio. Tudo começou em 1996, quando 14 grupos brasileiros de Apoio à Adoção se reuniram durante o I Encontro Nacional de Associações e Grupos de Apoio à Adoção. Foi então que em 2002, o Congresso Nacional instituiu a data comemorativa.

Adoção é assunto sério. Não é qualquer situação ou vontade que leva a criança para um abrigo. Uma pessoa não consegue viver saudavelmente ficando numa casa onde sofre maus tratos físicos e/ou psicológicos, abuso sexual e se os pais são negligentes. Então a assistente social avalia o caso e o juiz pode encaminhar a criança para um abrigo, que vai ampará-la por até dois anos.

“Enquanto isso, a família vai passando por um trabalho social para tentar reestruturá-la. Depois desse tempo limite, a criança volta para a família extensa, ou é destituída do poder familiar”, afirma Márcia Garrido, assistente social do Poder Judiciário do Fórum da Comarca de Itu. Os tios, padrinhos e avós fazem parte da família extensa citada pela assistente social; caso isso também não seja viável, a criança vai para o abrigo e pode ficar até os 18 anos.

Estavam esgotadas todas as possibilidades de voltar para a família, no caso de Pedro Henrique. Ele não tinha sobrenome. Só tinha dois anos de idade e foi morar no abrigo Lar Vinícuis, em São Paulo. Mal sabia que logo mudaria seu caminho e o de mais algumas pessoas.

“Minha vida é antes e depois do Pedrinho”, define o empresário Murilo dos Santos ao escrever sobre a adoção de seu filho. Carmem Souza, companheira de Santos diz que mãe é uma só: “Pra mim não existe mãe do coração, mãe de barriga. Mãe é quem cria e dá amor. E é isso que acontece aqui em casa, eu sou a mãe do Pedrinho e sempre vou ser”.

Hoje, Pedro Henrique Souza dos Santos é um menininho esperto, sorridente, brincalhão, tem os olhinhos castanhos bem vivinhos e riso frouxo. Vive batucando nas coisas e não perde a oportunidade de fazer uma arte. Mas também é tranquilo e obedece quando os pais falam.

Em 2006 o casal resolveu adotar uma criança. Carmem já fazia a sétima inseminação artificial sem sucesso e a vontade de ser mãe só aumentava. Eles entraram na fila de espera por uma criança de até 10 meses. Segundo Márcia Garrido, quanto menor a idade da criança, mais demora os pais enfrentam nas filas. “Todos querem adotar um bebezinho”, completa a assistente social.

Mas o casal resolveu mudar de rumo: “Quando o Murilo foi ao Fórum trocar a faixa etária que queríamos, para até três anos, a assistente social disse que nosso filho tinha acabado de chegar, com dois anos e dez meses”. Na semana seguinte os dois foram visitar a criança. “Chegando lá o ele estava brincando com um menino mais velho, que disse: oi, vocês são os pais do Pedrinho? – Respondemos um tímido sim, o menino saiu anunciando para todos que tínhamos chegado enquanto ele continuou na dele, quietinho”, diz Souza.

Pedro Henrique estava num abrigo diferente, sob a responsabilidade de um casal, que sede sua casa para abrigar até 12 crianças. Alguns dias depois de conhecê-lo, foram pedir permissão à assistente social para passear com ele. Depois passaram a visitá-lo todos os dias e dentro de um mês lá estava ele morando com seus pais.

A vida do casal mudou completamente. Um pouco antes da guarda provisória sair, começaram correr atrás de escolinha, e de móveis para mobiliar um quarto infantil. “Estou cheio de medos e dúvidas. Vou perder meu escritório que vai virar quarto de criança. Isso não é nada bom. Na verdade, isso não é nada, mas eu pensei sobre isso, vou fazer o quê? Penso bobagens como todo mundo”, escreveu Santos numa de suas crônicas.

Em junho de 2008, ainda no apartamento em São Paulo, a moradia dos empresários recebeu um brilho a mais. “Chegando ao prédio, ele perguntou: é meu? – Tudo ele questionava se era dele. Na hora de dormir, no primeiro dia, o Pedrinho ficou entre o Murilo e eu, e olhava para um lado e para outro, com uma carinha de novidade”, recorda a mãe com um sorriso no rosto.

Hoje, com cinco anos, Pedrinho sabe sua história sem ressentimentos. Carmem e Murilo disseram que contaram ao filho de forma natural, dentro da linguagem e do entendimento de uma criança, que ele morava no abrigo, onde esperava pelos pais, que algumas famílias não podem dar educação e uma vida adequada aos bebês, por isso eles ficam na espera.

“A psicóloga que acompanhou nosso caso disse que não é necessário contar tudo de uma vez, basta responder a pergunta. Se a criança questiona se nasceu da barriga da mãe, diz que não e mais pra frente a curiosidade vai surgindo e ela vai perguntando mais. As perguntas vem de acordo com a necessidade de conhecimento da criança, vamos no tempo dela”, afirma Souza.

Houve um caso curioso: Pedrinho não sabia o que significava a palavra ‘adotado’. Alguém que brincava com ele na rua disse que ele era adotado e então surgiu a dúvida. Santos ri e relembra: “Falamos que ele era adotado e explicamos o que isso significa. Para nossa surpresa ele saiu todo saltitante falando – Eu sou adotado! Eu sou adotado!”.

Ser mãe não é fácil. Carmem afirma que está se adaptando até hoje. Ela sempre viajou muito, trabalhou bastante, mas agora tirou o pé do acelerador para poder cuidar de seu filho. “Eu sinto que realizei meu sonho, queria ser mãe. Às vezes eu esqueço que ele é adotado”, completa.

Tudo por um filho

Antes da chegada de Pedrinho, a consequencia de tantas inseminações artificiais foi um nódulo no seio de Carmem. O tumor era maligno e ela teve que fazer todo o processo de operação, quimioterapia e radioterapia. “Na terceira inseminação nós já entramos na fila de espera para adoção. Fiz mais algumas sem sucesso e nem me toquei que poderia causar algo grave”, relata.

E foi um acontecimento seguido de outro: Carmem fez a última sessão de seu tratamento em fevereiro de 2008, em junho chegou Pedrinho e poucos meses depois Murilo fez uma operação onde sua medula foi retirada, tratada e reimplantada, para controlar uma doença degenerativa que ele tem, que compromete alguns movimentos da perna.

“Com a chegada do Pedrinho, o Murilo se animou a fazer essa operação. Se não tivesse feito, com o tempo outras partes do corpo poderiam ficar afetadas, mas agora não. Foi um processo complicado, ele ficou um mês internado, mas valeu a pena”, lembra Souza.

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