A água e a sobrevivência dos mais aptos
As adaptações dos seres vivos à falta de água são fantásticas: há plantas de deserto, como os cacos, que tem as folhas transformadas em espinhos e a transpiração é quase nula; há plantas com raízes aéreas que conseguem absorver o vapor d’água presente no mínimo de umidade relativa do ar; há ratos do deserto que conseguem viver sem beber água, retirando-a apenas do alimento que consomem; camelos são capazes de beber uma enorme quantidade de água em pouquíssimo tempo e suportar temperaturas ambientais altíssimas.
Plantas do deserto ou do semiárido aproveitam a água com a máxima eficiência: apresentam proteção contra a evaporação, acumulam água em seus tecidos, extraem com rapidez a água do ambiente, realizam reprodução especializada para deixar muitos descendentes. Animais também: conseguem manter o balanço hídrico do corpo maximizando a aquisição de água e diminuindo sua perda. São exemplos a capacidade de diminuir a transpiração e a de aumentar a concentração da urina, diminuindo assim a perda de água pelo organismo. Além das adaptações de forma e funcionamento do corpo, existem ainda as adaptações comportamentais. Animais pequenos se enterram ou procuram buracos onde a temperatura é menor. Aves migram para regiões onde há maior recurso hídrico. Animais se abrigam sob a sombra das plantas, onde a temperatura é menor.
Pela teoria da evolução, as adaptações dos seres vivos são resultado de um longo processo em que o ambiente funciona como fator de pressão. Seres vivos competem por alimento, água, espaço, luz, entre outros. Se um certo recurso se torna escasso, os seres vivos competem ainda mais. Aqueles que possuem características especiais para sobreviver em condições adversas ganham a competição e deixam maior número de descendentes. Ao longo do tempo são favorecidas as espécies que apresentam as tais características especiais ao ambiente adverso e desaparecem aqueles que não apresentam tais características.
O ser humano, evidentemente, não esteve e não está sujeito apenas à evolução biológica. Nossa espécie possui algo singular, a cultura. Se a evolução biológica nos permitiu andar sobre dois pés, pegar objetos com habilidade, desenvolver técnicas para aprimorar o dia a dia, a evolução cultural carrega uma enorme bagagem de aprendizado que nos permite olhar para nossa história e procurar não repetir nossos erros. Será?
Os exemplos e a teoria fazem pensar: que comportamentos são vistos em nosso dia a dia em condições adversas como a escassez de água que assola o estado de São Paulo e, em particular, a cidade de Itu? O recurso encontra-se escasso e a competição aumenta. Será que a cidade busca a preservação das áreas verdes para diminuir o risco de formação de uma ilha de calor? Ou será que constrói mais condomínios, apesar de não contar com adequados mecanismos de captação, reservação e distribuição de água?
Será que a cidade administra bem os recursos hídricos para que alcancem a todos da população e será que as metodologias para isso são bem informadas aos seus moradores? Ou será que seus cidadãos precisam se pendurar ao telefone e passar a semana sem conseguir um atendimento sequer da empresa fornecedora de água ou mesmo um sinal de respeito da administração pública informando a real situação e as medidas a serem implementadas? Será que os moradores já sem nenhuma reserva em suas residências passarão a semana sem receber nem água nem informação?
Será que as pessoas passam aos descendentes a noção de que dar propina aos funcionários do caminhão-pipa é a mesma coisa que a corrupção que reclamam do poder público?
Serão os mais aptos a sobreviver em condições adversas os que defendem valores de cidadania e solidariedade?