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Publicado: Terça-feira, 12 de julho de 2005

Pode a Polícia Federal Invadir Escritórios de Advocacia?

Nos últimos dias, todos nós pudemos acompanhar algumas diligências da Polícia Federal, não só em empresas supostamente sonegadoras, mas também em escritórios de advocacia, que culminaram em prisões e apreensões de documentos, gerando muita revolta entre a população e os advogados.

É importante esclarecer, preliminarmente, que esta coluna se aterá, tão somente, a analisar a forma pela qual empreendeu a Polícia Federal contra estes operadores do Direito, deixando de lado, por ora, a questão que envolveu a sorrateira ação contra a cervejaria de Itu, conforme já é notório entre a população de nossa cidade e do Brasil.

Até que ponto o advogado, no exercício regular de sua função, pode ser responsabilizado por atos e decisões administrativas tomadas pelos seus clientes, ainda que tais atos constituam crime?

Preocupados com o rumo dos acontecimentos, um seleto grupo de advogados reuniu-se com o Ministro da Justiça, Dr. Márcio Thomaz Bastos, negociando a regulamentação das diligências da Polícia Federal, em cumprimento a mandados judiciais de busca e apreensão, especificamente em escritórios de advocacia. Desta negociação surgiram as Portarias 1.287 e 1.288, ambas publicadas em 30 de julho de 2005.

A primeira “estabelece instruções sobre a execução de diligências da Polícia Federal para cumprimento de mandados judiciais de busca e apreensão”, desde a solicitação de sua expedição à autoridade judiciária, até efetivo cumprimento.

Já a segunda Portaria, lida exclusivamente do caso ora tratado, estabelecendo “instruções sobre a execução de diligências da Polícia Federal para cumprimento de mandados judiciais de busca e apreensão em escritórios de advocacia.” (destaquei), com a clara preocupação de restringir tais ações, exclusivamente, quando houverem provas ou fortes indícios da EFETIVA participação do advogado em prática criminosa ou guarda de objetos produto de crime; ou, documentos ou dados imprescindíveis ao esclarecimento de prática delituosa.

As invasões em escritórios de advocacia que aconteceram ultimamente, com efetivo e armamentos dignos de filmes de ação, trouxeram insegurança não só a estes profissionais do Direito, mas também aos clientes que os contratam, ainda que não tenham qualquer envolvimento com alguma prática delituosa.

Naquelas ações, pudemos observar a polícia apreendendo todos os microcomputadores dos escritórios, arquivos físicos e agendas, ou seja, documentos, informações pessoais e financeiras de clientes, contratos, cartas, e-mails, aspectos e estratégias processuais, enfim, tudo o que era tratado com absoluto sigilo e discrição pelos advogados, que receberam isso em extremo ato de confiança de seus clientes, passou a ser analisado por peritos, agentes e delegados, podendo até chegar à mídia caso se mostre algo de interesse geral, o que não é muito difícil, convenhamos.

Isso me preocupa muito, como advogado, já que em alguns casos a impressão que fica é que as autoridades, policial e judiciária, simplesmente ignoram o bom senso e, acima de tudo, algumas regras contidas na Lei 8.906/94, o Estatuto do Advogado.

Bom sendo, aliás, foi o termo chave que norteou a redação das Portarias aqui analisadas. Ainda que agindo em cumprimento das formalidades exigidas pela Lei e munidos dos respectivos mandados de busca, apreensão e prisão, os agentes da Polícia Federal se portaram como se estivessem prestes a enfrentar um numeroso grupo de advogados e empresários fortemente armados, treinados em avançadas técnicas de guerrilhas e, lógico, com cobertura televisiva maciça, afinal, quem não gosta de aparecer no “jornal noturno”.

O advogado e seu escritório não podem ser intocáveis quando sob suspeita, concordo, porém, há de se empregar o mínimo do bom senso no cumprimento das diligências policiais, mostrando-se claramente desnecessário o emprego de tão grande e tão fortemente armado efetivo policial, conforme vinha ocorrendo.

Fica a esperança de que as Portarias recém publicadas sejam aplicadas na prática, respeitando, acima de tudo, a pessoa do profissional do Direito e de seus clientes que não tenham qualquer relação com a atividade criminosa que originou a ação policial.

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