Colunistas

Publicado: Sábado, 10 de setembro de 2016

Dinheiro, seu sumido!

Dinheiro, seu sumido!

Acabou o dinheiro. Talvez uma das frases mais ouvidas no mundo, provavelmente a mais falada por aqui. Só que o assunto agora não é o caraminguá minguado, a escassez do saldo, o orçamento no vermelho. É o fim do papel-moeda mesmo. Não tem mais coisa que você entrega em troca de outra coisa. Aqueles papéis retangulares que o agiota emprestava para quem estava com a corda no pescoço, em maços amarrados com elástico e outrora feitos de átomos, hoje não passam de bytes.

O dinheiro que você tem, se tiver a sorte de ter, é um atestado eletrônico de veracidade validado pelo banco em que você tem conta. As notas mesmo, inexistem. Se você cismar de querer levar o que tem, e se o que você tiver ultrapassar os dois ou três mil reais, precisará avisar com 48 horas de antecedência para que o montante possa ser provisionado.

Vamos rastrear, a esmo, uma sequência qualquer de operações. Dutra & Póvoa Associados Serviços Administrativos S/C Ltda. deposita no dia 30 o salário de Benedito Orestes da Paixão. Benedito Orestes da Paixão deixa em conta o que em poucos dias irá desaparecer a título de débito automático. Da miséria que sobrou ele passa no crédito um maço de almeirão e outro de chicória, solicitados pela patroa no caminho de volta do trabalho. O dono da quitanda repassa o caixa do dia ao fornecedor de pescada, que lhe fiou um caminhão e meio na última Semana Santa. Sete Barbas ME transfere o que nem bem acabou de entrar para BestWall Pedras Decorativas, saldando serviço feito na casa do filho do dono da empresa. E assim se multiplicam as transferências de titularidade. Onde aparece de tudo, menos dinheiro de fato.

O sepultamento definitivo das notas e moedas é previsto por especialistas para 2030, em nível mundial. E não é preciso muita imaginação para adivinhar futuros comportamentos, necessariamente exemplares. Usuários de motel estarão em maus lençóis, pois serão imediatamente identificados, deixando registro do montante gasto, data e hora do bem-bom. O crime organizado estará também com os dias contados, assim como o tráfico de drogas. O "por fora" será necessariamente por dentro, o "sem nota" e o "sem recibo" definitivamente banidos. A Igreja Católica - com todo respeito - terá que substituir a cestinha pela maquininha na hora do Ofertório. As declarações de imposto de renda não farão o menor sentido, pois tudo será necessariamente declarado ao fisco no momento em que ocorrer, e a cobrança dos impostos será instantânea, assim que concluída a transação.

Cientes do que essa revolução pode representar para suas contabilidades oficiais e paralelas, os políticos se movimentam em dois sentidos opostos. De um lado, pela aprovação da lei de extinção do dinheiro, que garantirá um aporte de recursos nunca antes sonhado pela União, pelos Estados e pelos Municípios. De outro, para que o dinheiro em espécie permaneça circulando exclusivamente em Brasília. E, mais especificamente, nas dependências do Congresso, até que os parlamentares cheguem à conclusão de que a medida realmente será benéfica à sociedade.



© Direitos Reservados

Comentários