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Publicado: Terça-feira, 23 de outubro de 2007

Mulheres e Mudanças Climáticas

O presente artigo busca pontuar rapidamente algumas questões de gênero aliada ao desafio climático. Tais questões procuram evidenciar as diferenças entre homens e mulheres construídas culturalmente por nossa sociedade e seus reflexos em alguns aspectos do cotidiano feminino. Vamos começar com a definição de vulnerabilidade. Ela pode ser definida como a característica de uma pessoa ou grupo em termos de sua capacidade de antecipar, lidar com, resistir e recuperar-se dos impactos de um desastre climático. É algo inerente a uma população determinada e variará de acordo com suas possibilidades culturais, sociais e econômicas. Segundo o Painel Inter-governamental em Mudança do Clima - IPCC, aquele(as) que possuem menos recursos serão o(a)s que mais dificilmente se adaptarão e portanto são o(a)s mais vulneráveis. Uma das conseqüências das mudanças no clima será o aumento da a incidência de doenças tais como dengue, malária, hepatite A, cólera, diarréia, leptospirose. A desnutrição também aumentará, como conseqüência da redução da oferta de alimentos. Espera-se também mudança nos padrões de alergia e doenças respiratórias. Haverá cada vez mais refugiados provenientes das áreas afetadas.
 
No processo histórico da nossa civilização, homens e mulheres são atingidos de formas diferentes pelos problemas sócio-ambientais. Os problemas climáticos não são diferentes. No contexto atual, as mulheres possuem menores oportunidades de acessar os recursos materiais e sociais, assim como a tomada de decisões em assuntos que afetam sua vida e ao funcionamento da sociedade. Ainda que os meios de comunicação anunciem aos quatro ventos como a mulher avançou no mercado de trabalho, a maioria absoluta ganha de 10 a 40 % a menos que os homens para ocupar o mesmo cargo, desempenhar a mesma função ou a mesma tarefa. Essa é uma realidade mundial que une países ricos e pobres. As mulheres foram trabalhar fora de casa, construíram suas carreiras, mas sem educar os homens para a compartilhar as responsabilidades em regime de igualdade nas tarefas domésticas. Essa dificuldade é bastante acentuada na América Latina, onde o Brasil está incluído. Assim, mulheres dedicam grande número de horas na execução de tarefas não remuneradas tais como cuidar das crianças (educação, banho, alimentação), enfermos e anciãos, cuidar da saúde dos membros da família, possuem a função biológica de procriação da espécie humana, limpar a casa, lavar a roupa ou cuidar para que casa e roupa sejam limpos. Assim como os chamados serviços ecossistêmicos (serviços prestados pela natureza tais como a polinização das plantas, a produção de oxigênio), o trabalho silencioso da mulher não tem valor na sociedade contemporânea. Por isso é menos apreciado que o dos homens, cujo trabalho visível, pode ser dimensionado, valorado, constar no PIB. Hazel Hendersen, uma rara mulher economista, denomina a esse trabalho desempenhado pelas mulheres de “Economia do Amor”. O ônus de cuidar cai sobre as mulheres, particularmente durante as crises econômicas. Como o clima afeta diretamente a economia, essa é uma das vulnerabilidades específicas das mulheres às mudanças climáticas. Quem irá receber o(as) refugiado(as) do clima?
 
Como lembra Jared Diamond, em seu livro “Colapso”, na raiz de todo problema ambiental existe uma questão política. Raras mulheres possuem preparo para ocuparem o espaço público e, quando ocupam, como várias vezes já falou Marta Suplicy, têm dificuldade de serem ouvidas. Sendo assim, as leis e decisões que afetam o destino de uma nação são em geral feitas sem contemplar a ótica feminina.  Como a questão climática envolve também decisões política de governos, eis aqui mais uma vulnerabilidade. Há uma urgente necessidade de mulheres bem preparadas para ocupar cargos públicos e ajudar aos homens a tomar decisões saudáveis e sensatas em todas as instâncias que envolvem políticas públicas. Há também necessidade das mulheres se politizarem para fazer escolhas conscientes ao longo da vida quer na educação das crianças, na escolha de parceiros, quer na cobrança de desempenho e na escolha de políticos.  A questão da contracepção também é desafiadora. A mulher precisa educar homens para serem responsáveis pelas suas sementes, participando ativamente do planejamento familiar.
 
Outros desafios já fazem e farão parte do universo feminino diante das questões climáticas: as conseqüências da perda e/ou acesso à biodiversidade, reduzindo a disponibilidade das plantas medicinais, a produtividade da agricultura, afetando a segurança alimentar, dentre outros. A capacidade de adaptação de uma população está ligada a sua riqueza, tecnologia, educação, informação, habilidades, infraestrutura, a cesso a recurso e capacidade de gestão. Para suavizar e adaptar às mudanças do clima, torna-se fundamental a informação e a educação das mulheres em todos os níveis e áreas do conhecimento.
 
Este artigo foi publicado parcialmente na Revista Ecologia Integral, Nº 30, ano 7
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