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Publicado: Sexta-feira, 21 de setembro de 2007

A Arte Educação e a legítima Arte

Na verdade não existe como ensinar alguém a desenhar; o desenho, assim como a arte em geral, nada mais é do que o registro da percepção. O que temos como fazer é ajudar o aluno a ampliar a sua capacidade de adquirir conhecimentos através dos sentidos, educar o seu olhar, com isso o resultado do desenho será melhor e a capacidade de ver e enxergar o mundo terá maior qualidade.
 
O início do desenvolvimento da percepção visual se dá na idade mais tenra de um indivíduo, entre uma onomatopéia e outra, a criança engatinhando e descobrindo o mundo onde tudo é novidade, encontra no seu caminho, uma coisa ou um objeto novo, que poderá ser um batom, um lápis ou um giz; irá tocar, cheirar ou colocar na boca, até o momento que perceberá que ao raspar esse novo objeto no chão, irá produzir linhas e rabiscos. A criança ficará fascinada com os rabiscos que esse objeto produz. Os pais irão incentivar dando materiais adequados, pois ao contrário, a casa poderia ficar toda rabiscada.
 
A criança, depois destes rabiscos, começará a produzir círculos, no qual serão cada vez mais limpos. Um dia surgirão duas bolinhas no interior do círculo, neste momento a linguagem começará a surgir e a criança irá relacionar o desenho com o papai e a mamãe. A criança irá se ver neste desenho. Começará a tentar representar a família, no qual se a presença do pai ou da mãe for mais intensa, se mostrará no tamanho desses círculos que os representam, mostrando assim uma hierarquia familiar.
 
Os círculos ganham um pauzinho (corpo) e outros pauzinhos (braços e pernas) e assim por diante, cada vez com mais detalhes. Se olharmos para o início, desde os primeiros rabiscos, notaremos uma grande evolução no registro da percepção visual dessa criança que está buscando o desenho realista.


A percepção evolui natural e “sensivelmente”. Uma linguagem visual se constitui de imagens e formas.
 
Porém, chega o momento que a criança, já crescidinha, iniciará na escola. Terá o início de seus problemas. O ritmo do seu corpo não será respeitado o que antes era tudo brincadeirinha, passará a ser um compromisso sério com horários estabelecidos, disciplina, que só irão terminar, no dia em que, já adulta, perceberá o quanto está perdendo por ter que ser o que os outros querem que ela seja e não o que poderia ser de verdade. O que me faz lembrar de Martin Heidegger nos seus pensamentos que tratam do Ser e Tempo, quando fala da Existência Inautêntica.
 
Voltando ao período escolar, a criança aprenderá a escrever, ler, fazer contas e resolverá problemas através de símbolos, sinais e fórmulas, será estimulado o raciocínio lógico, dedutivo, simbólico, temporal, rápido, conhecerá a linguagem verbal onde símbolos ( letras) organizados formarão sílabas, palavras e frases.
 
Notamos aqui, o simples fato de ser alfabetizada, não faz dessa criança ainda um   “poeta”.
 
Na atividade do desenho ela continua procurando enriquecer os seus registros com mais detalhes buscando um resultado realista.
 
Nas escolas o conhecimento sensível quase nunca é trabalhado e a criança tende a abandonar aquela atividade prazerosa e lúdica por não conseguir evoluir mais, pois o raciocínio lógico e simbólico irá dominar. Por críticas dos coleguinhas da escola, dos pais e até mesmo de professores despreparados (O bom professor sabe que a crítica tem um efeito ofensivo e destruidor na autoconfiança do aluno e que o elogio e o incentivo só favorecem sua evolução), a criança se frustra, abandona o desenho e sua percepção fica estagnada.
 
Na fase adulta, se solicitarem para que desenhe algo ficará envergonhada, pois será uma pessoa adulta desenhando algo infantil, o seu desenho mostra o estágio em que sua percepção visual parou de evoluir.
 
As pesquisas mostram que qualquer pessoa, bem orientada, pode aprender a desenhar de modo sensível ganhando mais confiança, senso crítico e estético.
 
Nesse momento, no meu ver, é que aparecem as confusões muito comuns nos dias de hoje. O fato de saber desenhar, ou seja, representar, copiar, imitar a realidade, produzir uma imagem mimética, não faz dessa pessoa ainda um “artista”.O desenho é um dos elementos que precisa para dar forma a um sentimento original e inédito, como também dominar materiais e meios expressivos (técnicas), organizar estímulos nos espaço gráfico, pictórico ou tridimensional (composição), selecionar um repertório de signos visuais somados a uma visão de mundo diferente que irão constituir uma tentativa de linguagem própria.
 
O fazer artístico é muito importante para sua formação, mas não basta, precisa da Cultura da Arte, ou seja, conhecer a História da Arte em toda sua amplitude, como ainda a fruição artística, ter condições de fazer leituras e interpretações e usufruir a Arte.
 
Como o nível da percepção, na maioria das pessoas, está muito aquém do que poderia ser, por falha do nosso sistema de ensino, fica fácil para aquele que julga ser mais sensível, abusar da falta de percepção do povo e se passar por artista, professor, curador, crítico de arte, produtor, promotor, etc.
 
Fica claro também a queda de qualidade dos trabalhos de “Arte” onde poucas pessoas estão habilitadas para apontarem quem é quem.
 
Os eventos artísticos e culturais, onde muitas vezes, os responsáveis não são os mais sensíveis e preparados, mas sim aqueles que se relacionam melhor, gerando assim o declínio da qualidade das atividades culturais.
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