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Publicado: Sexta-feira, 11 de novembro de 2005

Tirando o véu

O ritual do casamento contém, entre outras coisas, a retirada do véu. O homem tira o véu da mulher e ela pode, através de seu gesto, enxergar a realidade límpida, não mais nublada.
Há momentos em nossa vida que nos pedem a retirada do véu.
Muitas vezes, não é o nosso parceiro que o tira, outras vezes é. Na verdade, o véu que encobre a nossa visão tem a função de nos proteger. Mas se por um lado nos protege, por outro nos impede de ver.
Quem tira o nosso véu ao longo dos anos? O homem? A mulher? A vida? A dor? A necessidade? A maturidade? O vazio? A sabedoria?
Quando uma etapa está em vias de se fechar e um novo ciclo anuncia a sua chegada, o nosso véu cai. Como um passe de mágica, ele simplesmente sai de nossos olhos e passamos a enxergar com clareza. Algo que podia estar embaixo do nosso nariz durante anos e não percebemos, de repente nos salta aos olhos e se mostra com toda a sua força.
Este momento é único. Um caminho sem volta.
Quando a vida nos tira o véu, seja por que caminho for, o sentimento que vem junto é um misto de surpresa, estupefação, desamparo e dor. Uma dor sem lugar para morar, porque não podemos mais nos apoiar nas pernas e crenças de antes. O destino perde a sua morada, nossos braços não sabem mais o que abraçar. Nosso coração não se apóia mais nas crenças que até então sustentavam o nosso jeito de viver. O que fazer?
Ah, o momento de cair o véu! Esse tempo infinito que nunca acaba! Esse presente da vida embrulhado em papel de jornal, com cheiro de cinzas e gosto azedo! Como aceitar uma oferta tão dura? Como abrir uma porta tão nova?
Tirar o véu não é um verbo ativo, embora seja. Quem tira o nosso véu não somos nós, apesar de permitirmos e nos prepararmos para isso, mesmo sem perceber. É esse preparo lento e sorrateiro que nos permite ganhar a visão. Quando o véu cai, só nos resta seguir em frente com coragem, compaixão por nossa incapacidade, amor pela verdade e principalmente, esperança.

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