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Publicado: Segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Os Gêmeos

Com um misto de surpresa e apreensão, Paulo e Lúcia receberam a surpreendente revelação: Não teriam um filho e, sim, dois!
 
Dois meninos!
Passado o primeiro impacto, sua alegria foi redobrada.
 
Prepararam o quartinho lindamente decorado, os dois bercinhos, duas cadeirinhas, o carrinho duplo, brinquedos, roupas, fraldas em profusão e tudo mais que compõe o universo de um bebê (ou dois) esperado (s) com plena satisfação.
 
Chegou o Grande Dia, a ida ao hospital, a ansiedade, a expectativa e, horas depois, a tranqüilidade no aconchego do quarto confortável com os dois bebês acomodados em suas caminhas, lindos, muito louros, absolutamente iguais, para encanto dos pais e de todos que os visitavam.
 
O Papai acorreu pressuroso e colocou, nos bracinhos, as pulseirinhas com os respectivos nomes, Mateus e Tiago, dizendo:
- Eles já têm uma identidade. Não correm o risco de serem confundidos.
 
Tudo parecia perfeito, mas aconteceu uma coisa terrível.
Poucas horas após o nascimento, sem um motivo aparente, um dos bebês, o Mateus, faleceu.
Os médicos diagnosticaram:
Órgãos vitais mal formados... Insuficiência respiratória... Parada cardíaca...
 
Aos pais, profundamente entristecidos, não interessava a causa. Tudo que sabiam é que não levariam para casa os dois filhinhos, que ficaria, para sempre, um berço vazio no quarto das crianças e uma enorme lacuna em seus corações. 
 
Foi então que, uma enfermeira comentou que, na enfermaria, havia nascido um menino que a mãe indigente manifestou o desejo de dar para adoção.
       
- Mas, coitadinho! Dificilmente será adotado. Além de ser negro, o que sempre é um empecilho, é uma criança deficiente, defeituosa.  Acho que irá mesmo para alguma instituição de caridade, continuou tagarelando a mulher.
 
Marido e mulher entreolharam-se. Uma idéia arrojada nasceu simultaneamente em suas mentes e foi em uníssono que indagaram um ao outro:
- Vamos adotá-lo?
 
Foram vê-lo no berçário. Lá estava ele na incubadora. Parecia um bonequinho desengonçado. Olhos fechados, respirando com dificuldade, absolutamente indefeso diante do Mundo hostil que o recebia a contragosto recusando-lhe o direito de um lugar ao sol.
 
Paulo e Lúcia sentiram uma ternura muito grande por ele e não tiveram qualquer dúvida, aquele era o filho que Deus lhes enviava por um estranho caminho.
 
A intenção de adotá-lo firmou-se e eles sentiram que seriam capazes de qualquer coisa para que isso se concretizasse
 
Todos tentaram dissuadi-los da idéia.
 
O médico explicou que aquela criança tinha muito pouca chance de sobreviver e que, se o fizesse, dependeria de muito tratamento posterior, muito trabalho e atenção e que, mesmo assim, seria, provavelmente, sempre, uma pessoa deficiente, incapaz.
 
Os parentes e amigos ponderaram:
“Criar dois filhos ao mesmo tempo já é difícil, se um deles for doente, então, pior ainda!”.
“Um filho adotivo ao lado de um natural, nunca dá certo!”.
“Uma criança negra numa família de brancos é, sempre, problemático!”.
 
Trouxeram até um psicólogo que tentou convencê-los de que estavam agindo movidos pela emoção e que, quando caíssem na realidade, iriam se arrepender.
 
Nada, porém os demoveu de seu intento.
 
O juiz, embora achasse que, dadas às circunstâncias, eles não eram os pais ideais para aquela criança, acabou despachando favoravelmente, ciente de que, muito dificilmente apareceriam pais mais adequados.
 
Paulo e Lúcia começaram a palmilhar o longo e doloroso caminho que os levaria até a realização de seu intento: fazer do Mateus um homem saudável e feliz.
 
Não foi fácil. Houve momentos de cansaço, de desânimo, de angústias, mas, nunca, de arrependimento.
 
Os dois meninos cresceram lado a lado e Mateus, seguia sempre um passo atrás de Tiago.
Tiago já usava a colher e Mateus ainda usava a mamadeira.
Quando Mateus começou a engatinhar, Tiago já corria pela casa. Tiago lia correntemente e Mateus apenas soletrava. Mateus cursava, ainda, o primeiro grau e Tiago já se preparava para o Vestibular. No ano que Tiago se formou, Mateus entrou na Faculdade.
 
Os dois, como todos irmãos que se prezam, tinham suas rusgas, seus ataques de ciúmes, mas, no fundo, se estimavam e se defendiam sempre,
 
Quando algum colega insolente perguntava ao Tiago:
- Quem é esse negrinho que está sempre com você?
Ele, invariavelmente, respondia orgulhoso:
- É meu irmão.
- Seu irmão? Você está brincando!
- Sim! Ele é meu irmão gêmeo.
 
E foi assim que o Amor, a Fé e a Coragem realizaram mais um de seus milagres.
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